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25 de abril de 2017
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10:00

Um País e um Estado em Chamas… Kiss, kiss

Por
Sul 21
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Foto: ABr

Ednezer R. Flores

Se a frase soa como uma retórica política, me desculpem, pois não pensei em outra expressão para iniciar um simples registro ao ler e analisar a Lei Kiss sancionada pelo governo federal ou em rever a Lei Estadual, que trata sobre o mesmo tema, ou seja, de evitar mortes e mais tragédias provocadas pelo sinistro de um incêndio.

Sem maiores definições técnicas ou legais, mas com o olhar de um simples usuário de nossas edificações, me deparo com fatos estarrecedores das forças que deveriam contribuir pelas melhorias de nossos “habitat’s”, pois ao ver análises e relatos sobre a “Lei Kiss Nacional”, conforme relato da Agência Brasil, esta norma “foi sancionada pelo presidente Michel Temer com 12 vetos. Entre os trechos retirados estão a proibição do uso de comandas em casas noturnas, a responsabilidade das prefeituras pela fiscalização e a previsão de punição a bombeiros, prefeitos e donos dos estabelecimentos. Ao vetar a proibição da comanda, Temer afirmou que “embora louvável”, a lei pode ser mais flexível, “preservando-se também peculiaridades setoriais, mercadológicas e eventuais mudanças tecnológicas”.

Outro ponto vetado por Temer foi a criminalização dos responsáveis quanto à prevenção e ao combate a incêndio e a desastres. O artigo retirado da lei definia que o descumprimento seria considerado crime, sujeito à pena de detenção de seis meses a dois anos e multa. Para o presidente, ao criar um tipo penal, o dispositivo ia “de encontro à necessária observância da racionalidade do Direito Penal”. Além disso, ressaltou que a legislação penal vigente já tipifica as condutas.

A adequação à Lei de Edificações também foi vetada. O texto da Lei Kiss determinava que, pela estrutura física ou pela natureza das atividades desenvolvidas, locais que tenham restrição à existência de mais de uma direção no fluxo de saída de pessoas fossem vistoriados anualmente. Na justificativa do veto, no entanto, Temer argumentou que a “adequação desses estabelecimentos pode onerar custo desnecessário e indevido”, principalmente para empresas de micro e pequeno porte, sem aumentar a segurança de forma relevante. Temer vetou também a obrigatoriedade de vistoria anual pela prefeitura ou bombeiros em locais enquadrados na lei e adequações.”

Torna-se evidente que tais vetos e deformações legais e suas justificativas estapafurdias, permitiram, permitem e permitirão a insegurança de nossas edificações, a isenção de responsabilidades cíveis, penais e técnicas, bem como a desqualificação das profissões de arquitetura e engenharia, partes integrantes da cadeia da construção civil e de infraestrutura de um País.

Não obstante, vendo a atual situação da “Lei Kiss Estadual”, nos deparamos com o abandono por parte dos gestores estaduais, em cumprir seu papel constitucional, de fomentar a regulação desta matéria, objetivando a implementação da infraestrutura necessária ao Corpo de Bombeiros Militar, para que este, como órgão atuante na regulação dos Projetos de Prevenção Contra Incêndio – PPCI, possa atuar de forma ágil, competente, eficaz e eficiente com um corpo técnico qualificado, habilitado nas áreas de arquitetura e engenharia e em quantidade suficiente para atender uma demanda que se apresenta e que só tende a crescer.

Os resultados práticos destas más gestões, e da conduta irresponsável de alguns empreendedores e proprietários de estabelecimentos de uso coletivo são os incêndios nossos de cada dia, ou de tragédias vividas que poderiam ser evitadas se não tivéssemos também, os componentes históricos do descaso, da incompetência, da corrupção e da inabilidade de gestores públicos de todas as esferas de governo e de instituições que deveriam ajudar na aplicação de leis e que teriam o objetivo de precaver, fiscalizar, servir, proteger, preservar e respeitar vidas.

Num regime ditatorial sangrento, quem reclama é condenado à morte, mas num regime estruturado por leis que podem ser interpretadas por quem pode torná-las protetivas, corporativas e exclusivas para algumas castas elitizadas de nossa sociedade, quem reclama pelo direito de justiça à vida de entes perdidos face o descaso, a corrupção e a incompetência, pode ser processado e condenado. E este é um resultado prático pela total falta de seriedade em não termos uma ação objetiva quanto às questões de prevenção e combate a incêndio em nosso Estado “tão politizado”, ou em nosso País, “tão esculhambado” por forças “ocultas” na politica e nas instituições públicas que deveriam se postar de forma correta, honesta e eficiente para com aqueles que pagam a conta financeira e social, ou seja, o povo ou o contribuinte.

Por fim, nos deparamos com ações pontuais ou isoladas e por vezes desconexas de um contexto maior que requer planejamento e organização, assistindo justificativas inócuas e sem maior comprometimento com uma ação que requer o fortalecimento do novo Corpo de Bombeiros do RS, com a efetiva implantação de um orçamento estadual para investimentos no combate e na prevenção de incêndio, no recrutamento de profissionais para as áreas distintas de combate e de prevenção, incluindo a contratação ou remanejo de arquitetos e engenheiros para atuação na área de PPCI, da implementação de sistemas de TI práticos e eficientes, da otimização das interfaces com as administrações municipais que também regulam sobre as edificações em nossas cidades e por fim, de corrigir, pactuar, acertar, disseminar, socializar e esclarecer conceitos e responsabilidades perante aqueles que se dizem julgadores de responsabilidades de todos os atores partícipes de atos sobre esta matéria sobre incêndio ou qualquer outro tipo de sinistro que nossas edificações e cidades estão sujeitas a sofrerem.

Neste contexto o IAB/RS, novamente se põem à disposição da sociedade e de todos os atores institucionais, para debater sobre este tema, buscando verdades, esclarecimentos e soluções democráticas e positivas, bem como se solidarizar com “Associação dos Familiares de Vítimas e Sobreviventes da Tragédia de Santa Maria”, pois sua luta incessante de justiça e verdade, é um paradigma de mobilização, mesmo com dor e lágrimas, que tanto necessitamos e que precisamos evidenciar cada vez mais, na busca de uma sociedade melhor e mais justa.

.oOo.

Ednezer R. Flores é arquiteto e urbanista, Sócio-Diretor Arqhos Arquit.& Consult. Ltda., Vice-Presidente IAB/RS.


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