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30 de dezembro de 2015
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19:48

Em nome de todos, mas no interesse de poucos

Por
Sul 21
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Em nome de todos, mas no interesse de poucos
Em nome de todos, mas no interesse de poucos

Por Tiago Holzmann da Silva 

O desmonte do planejamento urbano é a estratégia adotada pelos grupos econômicos que têm interesse em especular e lucrar com a cidade. O planejamento, que deveria organizar a cidade e definir suas diretrizes de crescimento em benefício de toda a população, não interessa a estes grupos porque impõe limites para suas ações e empreendimentos. Os gestores públicos, que deveriam agir em nome de toda a população defendendo o interesse coletivo, seduzidos pelo poder econômico, assumem o papel de defensores dos seus financiadores de campanha, tornando-se coniventes com a apropriação privada da cidade. Esta lógica de desmonte do planejamento associada à parcialidade dos gestores públicos tem um resultado desastroso nos processos de participação da sociedade nas decisões sobre o urbanismo e o futuro das cidades.

No caso de Porto Alegre, é notável também o desprezo da administração municipal pelo debate público, aberto e democrático. A divergência de opiniões e interesses, naturais em nossa sociedade complexa, é tratada como oposição cega, deliberadamente enquadrada em “os do contra” e “os a favor” sem dar chances para um debate mais inteligente e uma construção coletiva das soluções, mediadas pelo poder público. As equipes técnicas do Município foram desmontadas, tendo seu conhecimento disperso e sua interlocução com os órgãos de representação usurpada por agentes políticos. Não há quem formule políticas nem uma visão urbanística de longo prazo do Município de Porto Alegre, que tateia aleatoriamente para atender demandas setoriais. Não há espaços de discussão qualificados sobre o futuro da cidade, sobre o projeto de cidade, sobre como será Porto Alegre daqui há 20 anos. Nada.

O Conselho de Desenvolvimento Urbano e Ambiental de Porto Alegre (CMDUA) deveria ser um destes espaços de discussão, mas encontra-se refém de interesses corporativistas ligados ao comércio de imóveis e aos grandes empreendimentos comerciais. A atual composição do CMDUA é um simulacro de representação que garante apenas a obediência a um pacto de poder político e econômico. Aos representantes técnicos do Município, sem mandato e submetidos aos seus superiores, não são dadas as condições de manifestar seu conhecimento técnico que não seja para referendar os interesses políticos da administração municipal. As representações das Regiões de Planejamento, supostamente oriundas da eleição popular, passam por um sistema de sufrágio obscuro, que é contínuo objeto de litígio e torna-se cada vez mais desacreditada pela baixa representatividade e pelo aparelhamento partidário.

As representações das entidades de classe, entre as quais o Instituto de Arquitetos do Brasil, Departamento Rio Grande do Sul (IAB-RS) estaria colocado, submetem-se a um processo de escolha absurdo através de um sistema eleitoral ardiloso, concebido de forma a eliminar as posições divergentes e a proporcionalidade democrática. A constatação de que um pequeno grupo de pessoas ou agentes operadores vem se revezando por mais de uma década no CMDUA, representando entidades diferentes, é um indício cabal da tomada do Conselho e do Sistema de Gestão e Planejamento de Porto Alegre por um interesse alheio à maioria da população, com desastroso resultado para a cidade. E, claro está, o compromisso de diversos gestores com os grupos que distorcem as decisões sobre a cidade em seu benefício. Ou seja, são graves as distorções que assolam o Sistema de Planejamento de nossa Capital, contrariando a configuração ditada pela Lei do Plano Diretor, que previa a participação da sociedade como instrumento de controle dos atos e decisões do Poder Público e suas equipes técnicas, as quais deveriam atuar integradas a instâncias de participação como forma de legitimar seu trabalho.

Dados estes fatos, o Instituto de Arquitetos do Brasil, Departamento Rio Grande do Sul (IAB RS), decidiu não se apresentar como candidato para compor o próximo plenário do Conselho de Desenvolvimento Urbano e Ambiental de Porto Alegre (CMDUA) como entidade representativa da Sociedade Civil. O CMDUA perdeu sua representatividade como espaço democrático e necessita de urgente reforma estrutural e de seus processos de funcionamento. Entretanto, o IAB RS reafirma sua crença na participação da sociedade como forma de garantir a legitimidade das decisões públicas do desenvolvimento urbano. O Planejamento Urbano é matéria de alta complexidade, que impacta profundamente a vida de todos e por isso propugnamos que as políticas urbanas, elaboradas e pensadas por técnicos da área, sejam discutidas publicamente por representantes legítimos de toda a sociedade.

O IAB RS chama por uma tomada de consciência da população, que deve acordar para o que está sendo decidido em nome de todos mas no interesse de poucos.

Tiago Holzmann da Silva é Presidente do IAB RS


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