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8 de dezembro de 2017
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11:19

Por menos interferência política na composição de tribunais

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Por menos interferência política na composição de tribunais
Por menos interferência política na composição de tribunais
“O caso mais gritante é o da principal corte do país, o Supremo Tribunal Federal (STF)”. (Foto: José Cruz/Agência Brasil)

 Germano Rigotto (*)

A democracia se estabelece, em grande medida, pela lógica do equilíbrio de forças. A teoria dos freios e contrapesos, de Montesquieu, fundamentou a tripartição de poderes – Executivo, Legislativo e Judiciário –, criando mecanismos de controle recíprocos. Nenhum ente possui prerrogativas absolutistas ou totalizantes, o que garante a perpetuidade do Estado Democrático de Direito.

Essa lógica, no entanto, não serve apenas para a relação dos poderes uns com os outros. Serve também para a composição interna deles próprios. A forma de preencher a representatividade de cada função de Estado diz muito sobre a eficácia do seu resultado e aceitação social.

É por isso que, por exemplo, o Legislativo é composto integralmente pelo voto direto da população. Trata-se de uma casa eminentemente política, que precisa representar a voz das ruas. Também é por isso que, em tese, o Judiciário é composto majoritariamente por quadros técnicos e de carreira. No sistema brasileiro, que adere ao império da lei ao invés dos costumes (como nos Estados Unidos), a interpretação não pode desgarrar para o subjetivismo de cada juiz.

Mas aqui é que reside um problema importante de nossa institucionalidade. Muitos tribunais, especialmente os superiores, têm uma composição excessivamente política. O caso mais gritante é o da principal corte do país, o Supremo Tribunal Federal (STF). No mundo todo, os tribunais constitucionais realmente não costumam ser compostos apenas por quadros de carreira, isto é, concursados. Há, como se disse, um equilíbrio. Aqui no Brasil, entretanto, a totalidade dos integrantes é escolhida pelo presidente da República, sob referendo do Congresso Nacional. Há critérios técnicos que são exigidos, mas inequivocamente impera o componente político do indicado.

Isso, definitivamente, não está correto. O máximo que se poderia aceitar é um sistema misto, juntando nomes das carreiras jurídicas com indicações vindas do Executivo. Mas, mesmo nesse caso, talvez fosse mais adequado existir uma lista tríplice, e não uma simples nomeação a ser referendada. Não é razoável que o presidente da República acumule em torno de si tanto poder: da execução das leis à edição de medidas provisórias e à indicação de ministros para o Supremo. O equilíbrio pretendido por Montesquieu se esvai.

Essa contradição não ocorre apenas na casa mais importante do Judiciário. Ela se repete em órgãos de fiscalização e controle, em tribunais de conta, em agências reguladoras e em diversos outros organismos com papel de decidir sobre a legalidade do trabalho de outros. Não é difícil imaginar que, em virtude de tamanho viés político, muitas cortes estão sob suspeição para a opinião pública. A lógica do apadrinhamento é cada vez mais rejeitada pela população.

Algumas mudanças já começaram a acontecer até mesmo em órgãos ligados de algum modo ao Executivo, especialmente em estatais e fundos de pensão. O caso da Petrobrás é o mais significativo. A escolha de um executivo altamente capacitado – Pedro Parente –, com autonomia para formar sua equipe e realizar um trabalho sério de gestão, conduziu a gigante petrolífera a um novo patamar de resultados. O caminho ainda é longo, mas o mercado já percebe o rumo positivo que a companhia tomou.

A legislação, no entanto, não pode mais deixar esse tipo de escolha apenas condicionada à vontade do governante do momento. É preciso ter parâmetros muito mais rígidos para escolher executivos e dirigentes públicos, mas especialmente para compor órgãos de julgamento, fiscalização e controle. Há casos em que o caráter político deve ser simplesmente zero. Noutros, esse predicado pode conviver com o técnico, mas jamais impor-se sobre ele. Mas, assim como está atualmente, não pode continuar. Chegou a hora de colocar esse assunto na mesa do debate nacional.

(*) Ex-governador do Rio Grande Sul, presidente do Instituto Reformar de Estudos Políticos e Tributários e membro do Conselho de Desenvolvimento Econômico e Social (www.germanorigotto.com.br)


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