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19 de setembro de 2017
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15:15

Eles deveriam nos defender e não fazem. E agora?

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Sul 21
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Eles deveriam nos defender e não fazem. E agora?
Eles deveriam nos defender e não fazem. E agora?
O que mais chamou a atenção, entretanto, foi a postura do gestor da Coordenadoria da Diversidade Sexual da Prefeitura de Porto Alegre, Dani Boeira, que em áudios divulgados pelo Whatsapp se manifestou dando razão aos ataques conservadores e insinuando que a polêmica era uma vergonha para o movimento LGBT de Porto Alegre. Foto: Guilherme Santos/Sul21

Gabriel Galli

Na semana passada, o Brasil lidou com um dos mais escandalosos episódios de censura às artes dos últimos tempos. Depois da pressão de grupos conservadores, o Santander Cultural resolveu encerrar uma exposição de arte com temática LGBT que reunia mais de 200 obras de artistas renomados como Lígia Clark, Volpi e Portinari. Não tardou para que autoridades como o prefeito de Porto Alegre Nelson Marchezan Jr., o secretário de serviços públicos Ramiro Rosário e o deputado estadual Marcel Van Hattem se manifestassem publicamente dizendo que a exposição continha imagens de pedofilia e zoofilia, comentários que não conseguem absorver a complexidade do conteúdo artístico apresentado.

O que mais chamou a atenção, entretanto, foi a postura do gestor da Coordenadoria da Diversidade Sexual da Prefeitura de Porto Alegre, Dani Boeira, que em áudios divulgados pelo Whatsapp se manifestou dando razão aos ataques conservadores e insinuando que a polêmica era uma vergonha para o movimento LGBT de Porto Alegre. Os grupos Nuances e SOMOS pediram a retratação pública de Boeira pelas declarações e um posicionamento oficial da Secretária do Desenvolvimento Social Maria de Fátima Záchia Paludo, superior direta do coordenador.

Como se já não bastasse termos de lidar repetidamente com os ataques de deputados conservadores que não admitem o direito das mulheres de decidirem pelos seus próprios corpos, a necessidade de proteção da população LGBT contra discriminações e a importância das pessoas trans terem suas identidades de gênero respeitadas, começamos a semana com uma nova bomba. Um juíz do Distrito Federal acatou o pedido de um grupo de psicólogos que quer aplicar terapias de reversão sexual em pessoas LGBTs, nos fazendo voltar a um cenário de temor e instabilidade na saúde de milhares de pessoas.

Quando o Judiciário, o Legislativo, o Executivo e até mesmo o setor privado lavam as mãos por nossos direitos e nos atacam diretamente, o que sobra?

E quando aqueles que ostentam com orgulho uma bandeira LGBT enquanto dançam Despacito nos traem e usam nosso sofrimento como forma de acumular capital político, o que resta? Suspeito que a resposta esteja entre a revolta e a união.

Sem nos revoltarmos por esses absurdos e expomos publicamente que não somos massa de manobra, que exigimos políticas públicas sérias e planejadas e que não aceitaremos meias respostas aos nossos problemas, acumularemos dia após dia uma lista de retrocessos. E se apenas a revolta não adianta, expressá-la em grupo é mais do que necessário: é vital. Não apenas pelo fato de que mais vozes serão mais ouvidas, mas porque se não olharmos nos olhos de quem está nessa luta conosco e sentirmos a força

Felizmente, não é só de desgraças que as últimas semanas foram feitas. Como resposta à onda conservadora, vimos centenas de pessoas se reunirem em frente ao Santander Cultural questionando a decisão da direção da casa. Recebemos mais de 50 pessoas para discutir cinema e representação LGBT na arte na Área 51, em uma mostra de curtas do festival For Rainbow organizado pelos grupos Freeda e Homens Trans em Ação. Acompanhamos com admiração o posicionamento da SAP, uma empresa multinacional de tecnologia, cancelar o patrocínio de um programa da Rádio Gaúcha por comentários racistas e homofóbicos do apresentador Pedro Ernesto Denardin. Fora as centenas de matérias, debates e rodas de conversa sobre liberdade de expressão que movimentaram o país.

Esses são exemplos de que ainda dá tempo de se organizar e não deixar com que anos de conquistas em direitos humanos sejam jogados fora. O cenário é feio e assustador, mas a batalha não está perdida. Não pode estar perdida.

***

Gabriel Galli é jornalista, mestrando em Comunicação Social, coordenador geral do SOMOS – Comunicação, Saúde e Sexualidade; e membro do grupo Freeda – Espaços de Diversidade. 

 


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