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27 de julho de 2016
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09:59

Mais um ataque na Alemanha: dez mortos

Por
Sul 21
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mundo-tiros-munique-alemanhaPor Flávio Aguiar

No entardecer desta sexta-feira um jovem começou a atirar a esmo numa lanchonete do McDonald’s em Munique, capital da Baviera, no sul do país. A seguir entrou num shopping nas proximidades e continuou a matança. Segundo a polícia, ao fim e ao cabo, se suicidou.

No rastro, deixou nove mortos, dez com ele mesmo, e pelo menos 16 feridos, dois em estado grave. Algumas fontes do governo falam em 27 feridos, mas 16 é o número de pessoas que foram tratadas nos hospitais da cidade. Quase todas as vítimas fatais eram jovens entre 13 e vinte e poucos anos. Há informes de que entre os mortos há uma mulher de 45 anos. Foram três mulheres e seis homens.

Munique entrou em pânico. Pessoas evacuaram o centro da cidade, o sistema de transporte público foi interrompido, centenas de policiais acorreram à área dos acontecimentos, houve pedidos de que casas e estabelecimentos comerciais na cidade oferecessem abrigo para quem estivesse longe de sua casa… Havia suspeitas de que se tratava de vários atiradores… Enfim, um cenário de guerra.

Neste sábado pela manhã, os detalhes começaram a surgir.

Tratava-se de um único atirador, identificado como David S., alemão de ascendência iraniana, de 18 anos. Ele portava uma única arma – uma pistola – mas sabia, pelo visto, o que fazer com ela. Segundo a polícia, agiu sozinho. Esta localizou e entrou em sua casa, mas ainda não há detalhes (sábado, 13 horas, hora local, 08:00 em Brasília).

O caso se assemelha ao ocorrido no começo da semana, também na Baviera, em que um jovem de 17 anos, refugiado vindo do Afeganistão aos 15, atacou turistas chineses  em um trem regional, com uma faca e uma machadinha, ferindo quatro com gravidade e um levemente, sendo morto depois pela polícia.

Mas há diferenças, além das armas. O jovem afegão, segundo testemunhas, gritava “Allahu Akbar” (Alá é grande) e deixou vídeos com declarações político-religiosas. Ainda segundo os policias e outras autoridades governamentais, o caso de David S. vem sendo tratado como uma “síndrome de Amok”. O nome “Amok” deriva da expressão, em língua malaia, “mengamuk”, que quer dizer “atacar com fúria”. Ela designava a atitude de alguém, muitas vezes um guerreiro, que era tomado por um espírito maligno e atacava pessoas indiscriminadamente e depois de suicidava.

Ou seja, este caso vem sendo tratado como um “fato isolado”, sem articulações de fins terroristas. Mas a verdade é que ele caiu como uma bomba em meio ao clima de paranoia e pânico coletivo instalado na Europa, depois dos últimos ataques em Paris, Bruxelas, Nice e outros.

Hoje (23) é dia da parada LGBT aqui em Berlim, e o clima é tenso e carregado de adrenalina saindo por todos os poros.

Vários vídeos estão circulando na mídia e na internet. Alguns mostram pessoas correndo, ouvindo-se tiros ou não. Em um deles, um grupo de pessoas, no alto de uma marquise, filmam alguém (supostamente David S.), no alto de um estacionamento, e trocam gritos e insultos com ele. De repente, alguém, no grupo que está filmando, chama o filmado de “Kanake”, palavra pejorativa para “estrangeiro”, ao que este responde, aos gritos, “eu sou alemão”. Daí um outro do mesmo grupo filmador diz: “ele está armado”, e outro completa: “malditos turcos”, ou algo parecido. E de fato, o filmado, aparentemente, começa a atirar (ouvem-se tiros), terminando a patética filmagem.

A palavra “Kanake” tem uma trajetória curiosa. Originalmente era dita “Kanakermann” e pertencia ao vocabulário dos marinheiros alemães e era um elogio, dirigido a seus colegas do sul do Pacífico, conhecidos por suas habilidades marítimas. Mas a partir do fim da Segunda Guerra começou a ser usada pejorativamente em relação aos imigrantes do sul da Europa e depois em relação aos turcos.

O incidente, além de ser o prelúdio de uma tragédia, caso se confirme a identidade do filmado como David S., ilustra bem o clima complicado em torno do aumento dramático do número de imigrantes graças ao afluxo dos refugiados do Oriente Médio, Afeganistão e norte da África.

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Flávio Aguiar é professor, escritor, correspondente internacional, tradutor, organizador e colaborador de dezenas de livros. Atualmente vive em Berlim, na Alemanha.


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