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16 de setembro de 2019
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13:40

Até quando o Posto Ipiranga vai oferecer combustível?

Por
Sul 21
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Até quando o Posto Ipiranga vai oferecer combustível?
Até quando o Posto Ipiranga vai oferecer combustível?
Bolsonaro e Paulo Guedes. Foto: Isac Nóbrega/PR

Flavio Fligenspan (*)

A análise de conjuntura se defronta, de tempos em tempos, com uma situação de mudança de um período de crescimento para um de queda da atividade e vice-versa. Nestes momentos, os indicadores típicos da análise de curto prazo costumam mostrar resultados contraditórios, não apontando todos no mesmo sentido justamente pelas características do período. Incerteza e insegurança são marcas nestes casos, em que há constantes “trocas de sinais”, de positivo para negativo ou o contrário.

Estes episódios não têm duração definida, podendo ser de apenas alguns meses, até, às vezes, mais de um ano. No Brasil, estamos vivendo uma situação como esta, mas com uma excepcionalidade, o fato de que ela já dura quase três anos e a economia não sai do lugar, algo bastante incomum. E para piorar, não há nenhum indicador de modificação deste quadro rapidamente.

Talvez haja um vínculo do tema da estagnação com o fato relevante da semana passada, a demissão do Secretário da Receita, Marcos Cintra, que suscita mais de uma interpretação. Além da óbvia – sua insistência com a implantação de um imposto sobre operações financeiras nos moldes da antiga CPMF, que teria desagradado o Presidente –, há quem entenda que esta é apenas uma justificativa para encobrir uma questão pessoal, o fato de que o Secretário não teria controlado uma investigação da Receita contra um dos filhos do Presidente. É a posição do jornalista Reinaldo Azevedo, por exemplo.

Independentemente da interpretação correta, ocorre que o Ministro Paulo Guedes também é (ou era) um entusiasta da proposta da CPMF e parece que ainda não desistiu completamente da idéia que encontra vários opositores no Congresso, no meio empresarial e no próprio poder Executivo. A pergunta que ficou no ar é se o Presidente não estaria mandando um recado direto ao Ministro, antes depositário da plena confiança presidencial, de que há insatisfação com os resultados da economia que não decola nem promete decolar e que tal insatisfação toma corpo na explicação da queda da avaliação do Governo.

O Ministro prometeu que depois da Reforma da Previdência o País começaria a crescer, mas sempre se soube que esta era uma promessa sem sustentação. Agora que se aproxima o final da tramitação da Reforma no Congresso e as projeções do mercado são unânimes em negar a palavra do Ministro, novas explicações e anúncios de adiamento do início do ciclo de alta prometido começam a surgir de dentro do Governo. A população, por seu turno, sem entender como funciona a Economia, simplesmente enxerga o ambiente de estagnação e desesperança, sem crescimento do emprego e sem ganho de renda. O tempo está passando e o crédito natural de todo novo governo começa a se esgotar.

O Presidente já demonstrou que ouve muito a opinião de “conselheiros”. Fico pensando o que estariam a lhe dizer diante da falta de perspectiva de crescimento da economia brasileira e seus impactos na política. Até onde pode ir a confiança irrestrita no Ministro Paulo Guedes, se ele não entrega o que prometeu? É claro que ele representa mais que isso; ele representa um ponto de apoio importante às reformas liberais e ao mega projeto de privatizações, o que não é pouco. Contudo, o apoio popular exige respostas mais rápidas e objetivas.

O Secretário demitido era uma escolha pessoal e de primeira hora do Ministro, com o qual comungava muitas idéias e uma forma particular de ver a economia brasileira e seus problemas. Mais que isso, compartilhavam propostas que pensavam ser a solução das dificuldades. Diante disso, valeria acrescentar mais uma explicação, não excludente das demais, para a demissão do Secretário: estaria o Presidente mandando um recado para o Ministro, de que ninguém no Governo é imprescindível, especialmente se não dançar no seu ritmo? E o ritmo de 1% ao ano de crescimento do PIB não combina com o apoio popular necessário para o projeto político da família presidencial.

(*) Professor do Departamento de Economia e Relações Internacionais, da Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS)

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As opiniões emitidas nos artigos publicados no espaço de opinião expressam a posição de seu autor e não necessariamente representam o pensamento editorial do Sul21.

 


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