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29 de abril de 2019
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12:45

Sinal de alerta 

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Sinal de alerta 
Sinal de alerta 
Ministro da Economia, Paulo Guedes (Foto: Fabio Rodrigues Pozzebom/ Agência Brasil)

Flavio Fligenspan (*)

O ministro da Economia, Paulo Guedes, é um homem do mercado financeiro e um adepto do liberalismo. Sua longa atuação profissional e sua forma de pensar a economia não se prendem a emoções, mas a racionalidades e a ações objetivas. Não tem sucesso no mercado financeiro quem trabalha de forma diferente nem há espaço para preocupações com temas como justiça social. A referência maior para os profissionais desta área é a verificação de que ativos vão se valorizar e em que momento do tempo. Os movimentos políticos e sociais não interessam pelo seu valor intrínseco, mas tão somente pelos sinais que anunciam em relação à valorização ou desvalorização dos ativos, sejam ações, títulos públicos, títulos privados etc.

Neste sentido, os profissionais desta grande área da Economia são treinados na identificação destes sinais. Fazendo uso de métodos estatísticos sofisticados, eles devem entender se os sinais são verdadeiros ou não e se são duradouros ou podem se reverter no curtíssimo prazo. A correta interpretação é que vai indicar as melhores opções e produzir os melhores resultados financeiros, enfim a que vai premiar os bons profissionais, independentemente de paixões políticas ou preocupações com a escolha correta ou equivocada dos projetos da sociedade. Os profissionais desta área atuam como se pairassem acima das grandes questões do dia a dia, apenas aproveitando as oportunidades para “comprar na baixa e vender na alta”.

Se isto é verdade, fico me perguntando como o ministro estará interpretando a conjuntura recente da economia brasileira e os sinais emitidos pelo mercado financeiro. Como avaliar a queda de popularidade do Presidente, a diminuição de confiança dos empresários e da sociedade em geral, a constante revisão para baixo das expectativas de crescimento do PIB, a manutenção de taxas de desemprego muito elevadas e, finalmente, a alta da taxa de câmbio dos últimos dias. Como um profissional respeitado no mercado financeiro, o ministro não pode ignorar estes sinais, inequivocamente a indicar o insucesso destes primeiros meses de governo. E como pensar o futuro imediato?

Olhar o passado e interpretá-lo corretamente é muito importante para fazer as apostas no futuro. Contudo, o mercado financeiro vive de interpretar diferentes indicadores em diversos intervalos de tempo; alguns valem para projetar o imediato porvir, outros, para fazer as opções em prazos mais longos. O que estariam a indicar os sinais para os próximos meses? Como interpretar a elevação rápida da taxa de câmbio, que fez o dólar chegar à marca dos R$ 4 na semana passada? O que este valor tem a ver com as dificuldades claras da reforma da previdência e as trapalhadas políticas do Governo?

Não cabe ao ministro e à direção do Banco Central (BC) mostrarem intranquilidade diante de resultados ruins, o que só pioraria a situação. Esta é uma regra básica que vale para qualquer governo, de direita ou de esquerda, em qualquer lugar do mundo. Quando, por várias vezes, a política da âncora cambial dos primeiros quatro anos e meio do Real (1994-1999) ameaçou ruir, tanto Fernando Henrique como o Presidente do BC se mostravam tranquilos e despreocupados com a fuga em massa dos capitais especulativos estrangeiros que nos financiavam. Não era verdade, eles temiam muito pelo Real, que finalmente ruiu em janeiro de 1999. Desde a metade daquele ano vivemos sob a égide de outra política econômica, a do sistema de metas de inflação. Lula também passou por apertos e declarou em 2008 que “o tsunami no mundo seria apenas uma marolinha no Brasil”. Não era verdade, ele sabia disso e teve medo da situação, mas mostrou-se calmo e seguro para não piorar o clima de desconfiança da sociedade; teve sucesso na empreitada, incentivou as famílias a consumirem e os empresários a investirem. O PIB cresceu 7,5% em 2010 e Lula elegeu a sucessora, escolhida por ele.

Agora o ministro e a direção do BC se mostram tranquilos para a imprensa e para a sociedade, mas tenho certeza que os indicadores corretamente interpretados por um profissional experiente do mercado financeiro não apontam neste sentido. A tensão que apareceu com força na taxa de câmbio nos últimos dias é um sinal a ser respeitado; e se o ministro estivesse hoje fora do Governo, operando na sua atividade de longos anos, certamente estaria se posicionando para aproveitar as oportunidades que este sinal revela, tendo por base a desconfiança do capital financeiro internacional no sucesso do seu projeto. Se o projeto liberal para o Brasil vai vingar ou não é outra questão, o que está em jogo no curto prazo é a clara desconfiança do capital internacional. Este é o sinal de alerta.

(*) Professor do Departamento de Economia e Relações Internacionais, da Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS)

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As opiniões emitidas nos artigos publicados no espaço de opinião expressam a posição de seu autor e não necessariamente representam o pensamento editorial do Sul21.


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