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12 de novembro de 2018
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10:25

Expectativas, incerteza e o comportamento do mercado financeiro (II)

Por
Sul 21
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(Foto: Fernando Frazão/Agencia Brasil)

Flavio Fligenspan (*)

Na coluna da semana passada eu estava preocupado com os primeiros grandes desencontros internos da equipe do Governo Bolsonaro, tanto na área da política e da política externa, como na da economia. A conclusão era em forma de pergunta: diante de tantas disputas – com inevitáveis expectativas frustradas – e incertezas, de onde saia o entusiasmo demonstrado pelos primeiros resultados do mercado financeiro pós período eleitoral? Estaria baseado apenas na idéia vaga de “reformas”, tendo a reforma da Previdência como ponto de referência?

Pois bem, passada uma semana, a situação não só não melhorou, como piorou. Há vários sinais de novos desacertos internos e, mais preocupante, indicações claras de inexperiência no que se refere à forma de funcionamento do setor público e desconhecimento das relações entre os poderes. Poder-se-ia argumentar que estes sinais são próprios do momento que se vive, de formação das equipes políticas e técnicas que vão compor os futuros ministérios, com as naturais disputas de espaço. Mas o que tem se visto parece ser mais do que isto, parece falta de traquejo associado à soberba.

Um episódio, relatado no site da Revista Forum, ilustra o que foi dito antes. Na terça feira (6/11), o poderoso futuro Ministro da Economia conversava com o Presidente do Senado, Eunício de Oliveira, e este lhe perguntou se poderia ajudar com algum ajuste no orçamento de 2019, ora em tramitação no Congresso. A resposta do futuro Ministro teria sido ríspida, expressa sem nenhuma preocupação com o orçamento – o que, em si, é estranho –, já que, segundo ele, a energia toda deveria estar voltada apenas à reforma da previdência. Mas que reforma? Qual das várias propostas em discussão ou que partes do pouco que se discutiu até aqui, uma vez que não houve o esperado debate eleitoral sobre o tema. O próprio Presidente eleito chegou a manifestar sua vontade de que ainda nesta legislatura o Congresso emitisse algum sinal sobre a previdência, aprovando, por exemplo, um pequeno incremento na idade mínima para aposentadoria. Contudo, não houve nenhuma articulação mínima com o Congresso neste sentido; pelo contrário, Bolsonaro teve que tentar desmanchar um constrangimento criado pelo futuro Ministro, quando este referiu que a sociedade devia “dar uma prensa” no Congresso.

No dia seguinte, o Senado aprovou o reajuste do Judiciário, com grande repercussão financeira para a União e os Estados nos próximos anos. E na quinta feira aprovou, às pressas, o novo programa de incentivos à indústria automobilística brasileira, o Rota 2030, que vinha sendo negociado há meses, mas que representa o oposto da visão liberal do futuro Ministro.

No episódio de terça feira, o Presidente do Senado teria se sentido desrespeitado e teria declarado que “Esse povo que vem aí não é da política, é da rede social”. Três cenários se colocam para 2019: um, o “povo da rede social” se adapta aos ritos e ritmos estabelecidos há muito tempo na negociação entre os poderes; dois, o Legislativo e o Judiciário aceitam um novo modus operandi, muito mais veloz e de imposição de força, próprio do mercado financeiro; ou três, ambos os lados estabelecem uma tensa negociação. Pode-se acrescentar ainda um quarto cenário, o do desacerto, não um desacerto aberto, mas a criação de um ambiente de truncamentos, negação da velocidade de resolução pretendida e provocações.

Concluo aqui com a mesma pergunta que me fazia na semana passada: diante de tamanha incerteza, que gera insegurança quanto a resultados, de onde sai o entusiasmo inicial do sistema financeiro com o futuro Governo?

(*) Professor do Departamento de Economia e Relações Internacionais, da Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS)

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As opiniões emitidas nos artigos publicados no espaço de opinião expressam a posição de seu autor e não necessariamente representam o pensamento editorial do Sul21.


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