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18 de junho de 2018
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16:24

Câmbio, especulação e juros no final do Governo Temer  

Por
Sul 21
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Câmbio, especulação e juros no final do Governo Temer  
Câmbio, especulação e juros no final do Governo Temer  
Vários ministros do governo Temer vão deixar o comando das pastas na próxima semana para se candidatar nas eleições de outubro. Foto: Valter Campanato/Agência Brasil
Temer: um governo curto e trágico. (Foto: Valter Campanato/Agência Brasil)

Flavio Fligenspan (*)

O Governo Temer foi tão curto quanto trágico. Suas duas medidas de maior impacto, comemoradas por seus apoiadores e pela parcela mais conservadora da sociedade brasileira, incluindo o mercado financeiro, foram a lei do “teto dos gastos” e a reforma trabalhista. Felizmente, não lhe sobrou tempo para fazer mais nada de ruim para o País, como privatizações de porte e a reforma da previdência financiada apenas pelos mais pobres. Sorte de seu sucessor; quanto mais Temer avançasse no receituário liberal, mais o novo presidente teria que juntar forças num Congresso certamente fisiológico para desmanchar o que foi feito, sob pena de não poder governar.

Se o Governo, politicamente, já acabou, a economia precisa ser administrada até a virada do ano. E muito estrago ainda pode acontecer, até mesmo ao ponto de prejudicar os primeiros dois anos do próximo mandatário. Afinal, qual será o legado em termos de variáveis importantes como o câmbio, os juros, a inflação e o PIB? Os acontecimentos de maio deste ano desestabilizaram o pouco de calmaria que havia se conseguido e colocaram em risco o preço do dólar, sua influência sobre a taxa de inflação e os juros, e, na sequência balançaram as projeções de crescimento já suave que se faziam.

A primeira metade de junho trouxe mais incerteza à economia brasileira, em parte pelos efeitos de movimentos da economia internacional – incertezas geopolíticas e aumento dos juros americanos –, em parte pelas questões domésticas. A forte alta do dólar exigiu atitudes do Banco Central (BC), tanto retóricas, quanto práticas, as colocações maciças de swaps cambiais, para segurar a taxa de câmbio e não perder o controle sobre a inflação, a única variável que Temer vai apresentar como conquista econômica.  Ao que tudo indica, trata-se de um movimento especulativo e de quebra de braço entre o mercado financeiro e o BC, que teve de abandonar o discurso frágil de que age apenas para evitar a volatilidade. Nada disso, a situação é de defesa do nível da taxa de câmbio, não só de suas oscilações bruscas.

E a briga está dura e feia. As primeiras armas do BC já foram lançadas em várias oportunidades e com diferentes intensidades nos últimos dias, aumentando o estoque de swaps cambiais rapidamente para mais de R$ 50 bilhões. Lembre-se que o BC de Temer muito se orgulhou de reduzir rapidamente o estoque desses títulos que estava em mais de R$ 120 bilhões quando ele assumiu. De fato, ao longo de menos de dois anos de atuação, com redução de juros – ainda que abaixo do ritmo que a relação inflação-crescimento permitia – e retomada da confiança do mercado financeiro, o estoque de swaps caiu para cerca de R$ 20 bilhões.

Dependendo do que acontecer até o fim deste mês, é possível que o volume de swaps aumente bastante, deixando um custo alto para o próximo governo. Tudo indica que o BC não vai ser comedido no uso deste instrumento, já que considera piores as alternativas, a venda direta de reservas e a elevação dos juros. Sobre esta última opção, há muita especulação, especialmente nesta semana, dada a reunião do Comitê de Política Monetária (COPOM), o órgão que decide o nível da taxa de juros básica da economia, que acontecerá entre terça e quarta feira.

Há quem diga que o COPOM deveria elevar os juros para contrabalançar a elevação dos juros americanos e segurar um movimento de fuga de capitais especulativos que pressiona a taxa de câmbio. Seria um sinal bem ruim, pois na reunião passada o COPOM já surpreendeu o mercado ao interromper um ciclo de baixa de quase dois anos, mantendo a meta da Selic em 6,5% ao ano. Muita gente graúda foi surpreendida e perdeu dinheiro no mercado financeiro; basta ver a rentabilidade negativa de boa parte dos fundos multimercado. A crítica à atuação do BC foi pesada; afinal alguém tinha que ser responsabilizado pelas perdas e os gestores dos fundos não queriam assumir o erro.

Qual o sentido de elevar a Selic agora? Afinal, desde a implantação do sistema de metas em 1999 a Selic é o instrumento de controle da taxa de inflação e, como sabe, a inflação está muito baixa, até pela inanição do nível de atividade. Logo, aumentar os juros para conter a demanda não parece uma medida adequada para este momento. A outra explicação seria aumentar os juros para conter uma fuga de capitais que teria se expressado na elevação da taxa de câmbio nos últimos dias. Mas o movimento recente de entrada e saída de divisas pelo canal financeiro não mostrou tal fuga. Além disso, a posição das contas externas brasileiras é bastante sólida e a entrada de capital produtivo continua, mesmo com as incertezas que o ambiente eleitoral traz. A elevação do preço do dólar seria mais um movimento especulativo, testando a atuação do BC e vendo como e até que ponto ele iria agir. O BC reagiu como manda o manual, aparentando tranquilidade e exibindo força com a emissão de swaps; o custo será da sociedade e do próximo governo. Será que os gestores dos fundos vão errar novamente suas apostas na reunião desta semana, apostando na alta da Selic?

(*) Professor do Departamento de Economia e Relações Internacionais, da Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS)

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As opiniões emitidas nos artigos publicados no espaço de opinião expressam a posição de seu autor e não necessariamente representam o pensamento editorial do Sul21.


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