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25 de maio de 2021
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10:37

Uma visita ao Museu das memórias (in)possíveis

Por
Sul 21
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Uma visita ao Museu das memórias (in)possíveis
Uma visita ao Museu das memórias (in)possíveis
“Ao navegar pelas galerias, já abertas ao público, somos convidados a ocupar nosso lugar de ouvinte-leitor-testemunha do deslocamento forçado em Belo Monte”. (Museu das memórias (in)possíveis)

Marcia H de M Ribeiro (*)

“(… ) só os vestígios fazem sonhar.”
René Char

No último final de semana acompanhei o lançamento do Museu das memórias (in)possíveis  organizado pelo Instituto APPOA – clínica, intervenção e pesquisa em psicanálise. Como esclarece o argumento de concepção desse museu virtual, a criação do significante (in)possível amálgama o inominável, o inconsciente e o possível, uma aposta em nossa capacidade de construir caminhos a partir dos impasses em nossos laços com os outros.

Ali os objetos musealizados valem por sua riqueza imaterial. Carregam os vestígios de histórias de diferentes modos de exílio do laço social, não contadas antes porque também estiveram ausentes as condições para recepção desses testemunhos. “Não restou ninguém para ouvir”, tal qual revela o sonho da sala vazia de Primo Levi após ser libertado de um campo de concentração nazista.

Ao navegar pelas galerias, já abertas ao público, somos convidados a ocupar nosso lugar de ouvinte-leitor-testemunha do deslocamento forçado em Belo Monte: violência e etnocídio; ou do encontro através do trabalho de permanente dobradura de papéis dando sentido à existência em (In)finitas repetições.

Em futuras galerias, anunciadas no evento de lançamento, conheceremos também as experiências dos afetados pelos anos de chumbo: uma capa de chuva verde oliva, esquecida na sala de aula, estraçalhada por um colega de classe, revelando a família barbarizada por militares, em mais uma ditadura, no tempo do exílio no Chile.

Neste museu-ato, as histórias que ganham voz e texto são então contadas como experiências da e na coletividade. Trabalhos  em permanente construção que aguardam, também, os efeitos sobre outros visitantes-testemunha dispostos a participar dessa rede de memória e a ampliar a transmissão de parcelas de verdade antes destinadas ao não-lugar na história.

Um museu que deseja incluir no coletivo aqueles que insistentemente são empurrados para fora pelos processos de segregação cada vez mais extensos e duros no mundo contemporâneo. Um museu das pessoas, e dos nossos atos de resistência à barbárie e ao extermínio simbólico.

(*) Psicanalista, membro da APPOA e do Instituto APPOA – clínica, intervenção e pesquisa em psicanálise.

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As opiniões emitidas nos artigos publicados no espaço de opinião expressam a posição de seu autor e não necessariamente representam o pensamento editorial do Sul21.


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