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27 de dezembro de 2017
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16:14

Como (re)ativar a confiança

Por
Sul 21
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Como (re)ativar a confiança
Como (re)ativar a confiança
“Quem nunca passou por uma crisezinha, não é mesmo?” (Foto: Guilherme Santos/Sul21)

 Clarissa Ferreira (*)

Acordei de susto como quem se dá conta do tempo. Passaram-se anos! Desperto procurando motivos para seguir acreditando. Eu acho que ainda posso – ou melhor, devemos. Foram tantas ao longo do ano (quase que atenho aqui ao uso de reticências). Não tem no mundo quem não tenha passado por umas ruins, do micro ao macro. Em retrospectiva nas retrôs expectativas alguns checks e muitos mates.

Importante lembrar as dores inúteis, onde dominou a preocupação apressada e ansiosa, quase irracional – sofrimento em vão. A vida como gincana, muitas coisas para fazer em pouco tempo. Precisamos parar com essa idiossincrasia de uma idiorritmia pessoal e respeitar o nosso próprio pulsar. A gente se atropela muito. Mas viver assusta mesmo. Talvez porque a vida é muito boa para desperdiçar, ter que escolher entre algo, perder e ganhar. É pegado viver em meio a tantas possibilidades – mundo de opções, mundo de frustrações (opções limitadas dentro da bolha que lhe cabe, claro).

Devemos ficar atentos ao que tira a fé e não nos deixa seguir. Para virar a chave quando o desespero bater é preciso disso lembrar e aproveitar os agoras, cada um em seu momento – é-só-o-que-temos. Ter confiança nos olhos essenciais de vida (precisamos relembrar as pessoas sobre o brincar e parar de endeusar a arte). Fatos como abrir mão do sagrado tempo em fins banais de capital pesam e cegam de uma visão holística das coisas, assim como desentendimentos causados por mudanças hormonais, falta de sol, de água ou de respirar só.

Relativizando as dificuldades numa virada otimista: quem nunca passou por uma crisezinha, não é mesmo? – É só uma crise básica nas formações do inconsciente, boba! Crises míticas e estéticas, vida artificial, era de pós-verdades, que fogem até das explicações tradicionais sociológicas, marxistas, etc.. Ciclinho bem de boas que começou em 1974 segundo Guattari (tipo ontem) – “crises cíclicas do capitalismo” ou “guerra social mundial”. Só isso, suave, quem nunca, né? Como disse uma amiga, teve em 1929, 1971, 1973, 1979, 1980 e lá vai 2017 também #tátendo. “Mas não é participar de um otimismo deslumbrado, o fato de acreditar que reviravoltas históricas consideráveis estão com encontro marcado para os próximos anos” disse também o Guattari.

Assim, lembrando um tutorial de “como ativar a confiança”, com ares de auto ajuda, e consequências de frases de efeito, escrevo como quem fala consigo (ou quem dá conselhos de como conseguir tocar essa marimba nos anos seguintes): Lembrar de olhar para trás e ver coisas que não conseguíamos fazer e hoje fazemos, que não conseguíamos aceitar e hoje aceitamos, que não absorvíamos e hoje absorvemos; Não esquecer que a gente é mais feliz do que pensa, mas aprendeu a ver que não (precisamos pensar sobre a educação que ensina o medo); Botar fé nas nossas ideias; Recordar que a nossa tendência é ter sempre pressa, sempre querer chegar, ter muitos véus nos olhos e ruídos incessantes nos ouvidos; Pensar em como as coisas não são só lineares-cartesianas-sincrônicas-etnocentradas, presenciamos um novo paradigma ético e estético; E lembrar de se olhar no espelho com a humildade de quem se aceita, também é bonito reconhecer sua força, (se) amar ainda é legalizado.

(*) Clarissa Ferreira é violinista, doutoranda em Etnomusicologia pela Universidade Federal do Estado do Rio de Janeiro, professora substituta do curso de Música Popular da UFRGS e autora do blog Gauchismo Líquido. Treina poesia em prosa (êta loca brincando com as palavras), faz uso de referências vastas, de Guattari à Jout Jout, e aprende muito enquanto escreve.


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