Céli Pinto (*)
O programa Roda Viva que entrevistou a pré-candidata à presidência da República pelo PCdoB, Manuela D’Ávila, ontem, dia 25 de julho, foi um jogo de erros, a começar pela falta de respeito à sua candidatura, sempre tratada como falsa.
Há assunto para muitos comentários sobre o programa, inclusive sobre a própria postura de Manuela, mas o que que gostaria de pontuar é a centralidade que os jornalistas deram à figura de Lula. Uma parcela significativa das perguntas feita à pré-candidata foi sobre o ex-presidente, sempre querendo que Manuela se manifestasse sobre a prisão e sobre os seus crimes.
Como o programa tem um posicionamento político-ideológico , deixado claro pela escolha de seus convidados, é de se esperar que um candidato ou candidata de esquerda ou centro-esquerda não tenha vida fácil no Roda Viva. Nenhum problema sobre isto: a FOX, nos Estados Unidos, apoiou Trump e disse que apoiava, assim como a CNN apoiou Hillary Clinton. Às vezes o império tem lições a dar, raras, mas tem.
Mesmo considerando a farsa da objetividade, aludida por grande parte da mídia brasileira, o mínimo a esperar de jornalistas é decoro, o que faltou aos que participaram do programa. Dois deles foram particularmente insistentes quanto o julgamento de prisão de Lula. A representante do jornal Estado de São Paulo perguntou três ou quatro vezes a Manuela se ela não acreditava na culpa de Lula depois de ter sido julgado nas quatro instâncias. A senhora jornalista “fingiu não saber” que Lula não foi julgado em quatro instâncias, mas na primeira e segunda instâncias. O processo não foi julgado na terceira instância, que é o Tribunal Federal da Justiça, nem pelo Supremo Tribunal Federal, que seria o último recurso. A vetusta senhora bradou sem pudor que Lula tinha sido julgado nas quatro instâncias do Judiciário, demonstrando ignorância ou má fé ao confundir os pedidos de habeas corpus com julgamento transitado em julgado. Infelizmente o partido de Manuela não a municiou com pareceres de juristas de alta respeitabilidade (eles existem, e muitos) para que ela pudesse responder a questão a contento.
Interrompendo a pré-candidata (ela foi interrompida desrespeitosamente todo tempo, confirmando estudos que comprovam que homens costumam interromper a fala das mulheres), o apresentador do programa voltou ao caso Lula, afirmando que há provas para que ele esteja preso, “como as visitas ao sítio de Atibaia”. Ora, qualquer leitor de pasquins locais sabe que o processo pelo qual Lula está preso não se refere ao sítio de Atibaia, mas à pretensa propriedade do triplex em Guarujá. Será que o Seu Lessa não sabe disto?
Em síntese, ou foi uma demonstração de ignorância e despreparo dos jornalistas, ou de pura má fé. Manuela saiu viva da roda, mais viva e inteira do que nunca. Brava mulher.
(*) Professora Titular do Departamento de História da UFRGS.
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