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28 de março de 2016
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10:52

A crise se aprofunda

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Sul 21
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A crise se aprofunda
A crise se aprofunda

economiaemquedagraficosPor Cecília Hoff

A queda de 3,8% do PIB brasileiro no ano passado e a expectativa de uma nova redução, em magnitude similar, em 2016, confirmam que vivenciamos atualmente a pior recessão que já se teve notícia na economia brasileira. O cenário é dramático e resulta de uma conjunção de elementos de caráter estrutural e decorrentes de equívocos na condução da política econômica, somados ao agravante da crise política. Os estados mais industrializados tem sido os mais afetados. Porém, ao contrário do que se verificava até 2014, quando as regiões Norte e Nordeste do país ainda se expandiam, no embalo da manutenção do emprego, dos programas de distribuição de renda e dos investimentos em infraestrutura, no ano passado as quedas foram generalizadas.

A reversão cíclica tem raízes estruturais, que, cedo ou tarde, implicariam na desaceleração do ritmo de crescimento do país. Nesse aspecto, cabe destacar, no cenário mundial que emergiu nos últimos anos, o fim do ciclo de elevação dos preços das commodities e o rebalanceamento da economia chinesa. No plano interno, a perda da âncora cambial como instrumento de compensação das pressões inflacionárias oriundas do aquecimento do setor de serviços e da expansão dos salários, e a excessiva alavancagem das famílias e das empresas, que limitam o potencial de crescimento puxado pela expansão do crédito. Tais elementos, em sua face positiva, impulsionaram o ciclo de crescimento verificado durante o Governo Lula, mas foram se esgotando ao longo do Governo Dilma.

A avaliação predominante, então, era de que os condicionantes de um novo ciclo de crescimento seriam a expansão da produtividade e da competitividade. Coerente com esse diagnóstico, o Governo lançou mão, a partir de 2011, de uma série de medidas voltadas a ampliação dos investimentos, como as desonerações fiscais, os estímulos setoriais e a redução de custos (energia e juros para investimentos, por exemplo). Ao mesmo tempo, buscou sustentar a demanda interna através da manutenção de estímulos ao consumo de bens duráveis e da expansão do crédito. Essa estratégia, porém, não surtiu os efeitos esperados em termos de crescimento, além de induzir a geração de uma série de desequilíbrios: a expansão da demanda continuou “vazando” para as importações, o que ampliou o déficit externo; as renúncias fiscais, sem o correspondente crescimento das receitas, somados aos subsídios aos investimentos e ao setor energético, ampliaram o déficit público e colocaram a dívida em trajetória ascendente; as pressões inflacionárias, decorrentes do aquecimento do setor de serviços e do aumento contínuo dos salários, ampliaram a inflação e a indexação, a despeito do represamento paliativo dos preços administrados (energia elétrica e combustíveis).

Quando a crise se agravou, ao final de 2014 e em 2015, em vista da perspectiva de elevação da taxa de juros nos EUA e de perda do grau de investimento no país, os desequilíbrios tinham sido levados ao limite e não havia mais espaço fiscal e monetário para a adoção de medidas contracíclicas. Os ajustes precisavam ser feitos, mas o Governo, após uma reeleição disputadíssima e iniciando um novo ciclo em 2015, acabou apostando em uma estratégia arriscada, que partia da hipótese de que um aperto simultâneo nas politicas fiscal e monetária (redução dos gastos públicos, aumento dos impostos, aperto nas condições de crédito e elevação dos juros), ao lado de uma recomposição rápida dos preços administrados, levaria à reversão das expectativas de inflação e à retomada do crescimento, já na segunda metade do ano. Em que pese a melhora das contas externas, essa estratégia aprofundou a recessão e deu início a um ciclo de aumento do desemprego, sem gerar os resultados esperados na inflação e no equilíbrio das contas públicas. Completando o enredo, as investigações da Lava-Jato, ao atingirem a Petrobras e as construtoras, adicionaram travas aos investimentos, enquanto o mal-estar econômico e a sensação de estelionato eleitoral caíram como luva ao aprofundamento da crise política, que levou a sociedade brasileira a uma polarização fratricida, tudo paralisando.

Enquanto isso, a crise se aprofunda. No ano passado, a produção da indústria geral (que inclui as indústrias de transformação e a extrativa mineral) reduziu-se em 8,7%. Os estados mais industrializados foram, naturalmente, os mais afetados pela crise. A produção do Amazonas literalmente despencou (-17,6%), devido à queda da demanda por bens duráveis produzidos na Zona Franca. No Sudeste, onde se concentra a maior parcela da indústria brasileira, a produção encolheu à taxas de dois dígitos em Minas, Rio e São Paulo. As demais regiões do país não ficaram imunes, à medida em que a crise foi se alastrando para a construção civil, os serviços e o emprego. Tal movimento pode ser verificado inclusive no Centro-Oeste, onde o agronegócio ainda sustenta algum crescimento do produto industrial. No Rio Grande do Sul, a despeito da redução de 11,9% da produção da indústria de transformação, as estatísticas do PIB, a serem divulgadas pela FEE em abril, devem mostrar uma retração entre 2,0% e 3,0% – menor do que a registrada no País, devido, apenas, à boa safra agrícola. Os dados mais recentes revelam, de todo modo, um recuperação das exportações de manufaturados e, aqui no estado, também do emprego industrial. São bons sinais, mas ainda parecem insuficientes para induzir a retomada da economia.

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Cecília Hoff é doutora em economia pela UFRJ, economista da Fundação de Economia e Estatística (FEE) e professora da FACE/PUCRS.


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