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21 de janeiro de 2020
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17:19

Porto Alegre 2020 e seus enigmas

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Sul 21
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Porto Alegre 2020 e seus enigmas
Porto Alegre 2020 e seus enigmas
Prefeitura de Porto Alegre. Foto: Luiza Castro/Sul21

Antonio Escosteguy Castro (*)

Se não é plenamente real que as eleições municipais são um plebiscito sobre o Governo Federal no poder, eis que as questões locais ( e às vezes até regionais) pesam bastante na decisão de voto do eleitor , não restem dúvidas que o pleito deste ano será estratégico para o futuro da nação, concedendo , ou não, fôlego político para o caótico Governo Bolsonaro. Assim, as eleições municipais de 2020, particularmente nas capitais, assumem considerável importância.

Em Porto Alegre , o Governo Marchezan , plenamente alinhado com o programa de Bolsonaro , enfrenta enormes dificuldades. Pesquisa do Instituto Methodus , de fins do ano passado, aponta que é reprovado por 77,7% do eleitorado e que o Prefeito tem uma rejeição pessoal de 42,9% , mais do que o dobro de Manuela ( 20,8%) e mais do que 5 vezes a de Sebastião Mello ( 8,1%) , seus principais adversários. O rompimento com o PP do vice-prefeito Gustavo Paim, essencial na vitória de 2016 , fragiliza ainda mais a posição eleitoral da situação. O recente aumento do IPTU lhe dá algum fôlego financeiro no último ano de mandato, mas pode afastar setores de classe média que tiveram o imposto fortemente elevado.

O PP, aliás, é um dos enigmas desta eleição. A forma do rompimento impossibilita que retorne ao leito do PSDB. Herdeiro da velha ARENA, tem inegável força na capital, mas dificilmente consegue vencer a eleição sozinho. Na pesquisa supra citada, Paim tem 3,7% das intenções de voto no melhor cenário. Com quem vai compor o PP? Sem dúvida , agrega peso eleitoral em qualquer chapa de que participar. Terá candidato?

Enigmático, também, está o MDB. Tem um candidato natural fortíssimo: Sebastião Melo. Ex-vice prefeito, derrotado por Marchezan em 2016 , tem um recall eleitoral consolidado e há até um certo sentimento de que foi uma injustiça trocá-lo por um prefeito tão ruim. Mas o MDB reluta em lançá-lo. No MDB da capital Mello está isolado e  os recentes movimentos do MDB regional se aproximando e negociando  com o Governador Eduardo Leite , através da pauta do pacotaço previdenciário  , são incompatíveis com lançar um  candidato forte em Porto Alegre contra o prefeito do PSDB.

Se o MDB compuser com Marchezan , este retorna ao jogo , mas Mello não se prestará à vice nesta hipótese. Mantendo o PTB na coligação , a nova chapa tem força eleitoral. O PTB provavelmente ficará com Marchezan de qualquer maneira.

Um elemento importante a ser considerado é que nestas eleições não haverá coligação nas chapa proporcional , o que costumava facilitar as composições. Os partidos deverão avaliar muito bem a hipótese de não ter candidato a prefeito, verificando se isto não enfraquece muito sua chapa de vereadores.

É com este raciocínio em mente que o PDT terá candidato próprio, quase certamente a Deputada Juliana Brizola , num esforço em fazer bancada de vereadores. Atualmente, o PDT tem 3 vereadores , uma de suas menores bancadas na história da capital. Há quem diga que Romildo Bolzan,  de olho no governo do Estado em 2022 , apadrinha a aproximação com o PP, mas a neta de Brizola tem afirmado que num eventual segundo turno estará com a esquerda, o que inviabiliza este movimento.

A nova direita (PSL, NOVO) ainda não tem grande peso na capital , já anunciou que não terá candidato e deverá acompanhar Marchezan. A REDE local também. Os partidos religiosos , que elegem vereadores por disciplina, não necessitando de candidatura majoritária, acompanharão Marchezan. O DEM ,mais tradicional, tenderá a acompanhar o que o PP fizer. O PPS vai aguardar até o último minuto para decidir.

O PSB, em Porto Alegre, no grande cenário  é irrelevante,  embora tenha 2 vereadores. Buscará uma composição que não ofusque seus edis e no limite poderá ter candidato para assegurar sua pequena mas imprescindível bancada.

O  maior dos enigmas na eleição da capital, neste momento, entretanto, é a atitude que tomará a esquerda. Uma vitória da esquerda este ano é uma possibilidade real. Haddad fez mais de 43% dos votos no segundo turno em 2018 em Porto Alegre (36% no RS). De lá para cá, o Governo Bolsonaro desgastou-se e o Governo Marchezan, como visto, é um fracasso. Também vimos que provavelmente o MDB não apresentará Sebastião Mello como candidato e a eleição tenderá a se polarizar entre Marchezan e a esquerda. Manuela, a mais provável candidata , lidera todas as pesquisas, tem um índice de rejeição que não impede a vitória num segundo  turno e desfruta  o recall recente de uma participação vibrante na eleição presidencial.

Vencer estas eleições, porém, será parada duríssima e se impõe para tanto a unidade entre os três principais partidos da esquerda na capital, PT, PSOL e PC do B. São enormes as dificuldades para que tal se realize. Mesmo com a quase unânime percepção de que Manuela deva ser a candidata a Prefeita, o PSOL gaúcho, que se caracteriza por um forte antipetismo , resiste a compor uma chapa que tenha ainda que seja um vice do PT. Por seu lado, a vocação hegemonista do PT resiste a que faça qualquer  outra concessão, considerando que abrir mão da cabeça de chapa para Manuela já é sacrifício suficiente. As reações à recente indicação de Miguel Rossetto para a vice candidatura demonstram o tamanho dos obstáculos para a efetivação da tão sonhada unidade.

Estamos ainda em janeiro. Evidentemente não é o momento de fechar a  nominata de uma chapa. Necessário que se faça um esforço no sentido de construir um programa comum, debatido com os mais amplos setores sociais e que encante a cidade , tão maltratada por seus últimos governos. A definição da chapa haverá de ser um momento posterior à construção do programa , quando o movimento social, se devidamente mobilizado , encaminhará a solução da unidade.

Ainda que obtida a unidade da esquerda e construída a polarização Manuela/Marchezan, vencer a eleição não será nada fácil. A RBS/Globo já definiu claramente seu apoio à reeleição do Prefeito, que aplica o receituário de austeridade fiscal tão ao gosto da Zero Hora e garante uma liberalidade na área da construção civil que responde aos interesses econômicos diretos deste grupo de mídia. O Correio do Povo/Record ainda não se definiu com  clareza , mas o bolsonarismo que representa cedo ou tarde ( mais cedo do que tarde) aderirá completamente a Marchezan e então entrará na campanha. Com a unificação das grandes empresas de mídia local  se dão pelo menos duas consequências importantíssimas na eleição. Primeiro,   catalisa  a unificação do empresariado local e fará jorrar dinheiro na campanha de Marchezan. Segundo, assegura as condições para a campanha de fake news e agressões nas redes sociais. A omissão da grande imprensa em investigar e mesmo noticiar o ataque sujo nas redes sociais em 2018 , base fundamental da campanha eleitoral da direita, certamente se repetirá em 2020.

O cenário eleitoral, portanto, ainda está muito indefinido. Há muitas variáveis e incertezas. Mas a eleição de Porto Alegre em 2020 será  certamente uma das mais importantes do país.

(*) Antonio Escosteguy Castro é advogado.

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As opiniões emitidas nos artigos publicados no espaço de opinião expressam a posição de seu autor e não necessariamente representam o pensamento editorial do Sul21.


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