Colunas>Adão Villaverde
|
16 de dezembro de 2019
|
16:02

O novo continente de Atlântida

Por
Sul 21
[email protected]
O novo continente de Atlântida
O novo continente de Atlântida
Adão Villaverde. (Foto: Guilherme Santos/Sul21)

Adão Villaverde (*)

Na experiência  pública se aprende que esta depende muito de uma certa síntese, entre, projetos/conteúdos, relações com os atores, fomento/financiamento e a capacidade de gestão e entregas, portanto de resultados para melhorar a vida das pessoas.

Se observa que por razões objetivas de uma crise fiscal no Estado Moderno, que é muitas vezes superlativizada, os tema do financiamento das políticas e programas têm ficado secundarizados. E já existem hoje, muitos economistas que tecem fortes críticas a escolha deste caminho. É evidente que temos que arrumar as contas, mas as boas práticas de gestão recomendam que devemos ter  uma boa mediação entre estes dois extremos, ou seja, equilíbrio fiscal, sim, mas com responsabilidade social.

É um erro estratégico que poderá nos custar caro e levar a mais um ceticismo incontornável, qual seja, de vermos um conjunto de boas iniciativas no campo das políticas públicas não se efetivarem por falta de um elo fundamental na sua cadeia. Qual seja, a ausência de recursos financeiros para lastrear suas efetivas possibilidades de concretização.

E o cenário fica mais patente na época em que estamos vivendo. Já saímos da clássica revolução industrial, o mundo passou pela sociedade da informação e já estamos em uma etapa disruptiva, onde as vezes parecemos ter dificuldades de perceber seu ritmo, ou inconscientemente ainda resistimos a ela, mas a sociedade do conhecimento já é uma realidade. E estes ativos intangíveis que hoje têm o valor que outrora os materiais tinham, são os que mais necessitam serem estimulados, fomentados, apoiados e inclusive financiados.

Este novo tempo enseja uma evolução no mundo da gestão, a adoção de uma nova e atual mentalidade que possa dar cabo as novas respostas que necessitam serem produzidas. Consolidam-se novos paradigmas e diferenças em relação ao modelo clássico que nos trouxe até aqui, mas um questão que perpassa todas estas épocas, não pode ser prescindida, qual seja o financiamento. Muito menos ser tratada de forma ligeira e simplificada. E deduzir aforismos rasos e desprovidos de conteúdo como a narrativa de que “o desequilíbrio fiscal é a raiz do problema econômico e que o excesso dos gastos públicos são suas causas, convenhamos, é a antessala, de navegarmos todos juntos para o mesmo naufrágio. Ou seja, o colapso das funções públicas de Estado e por decorrência, suas políticas.

Este diagnóstico é confirmado por qualquer análise isenta ou desapaixonada da economia brasileira e regional, pois só tem servido para defender uma política de ajuste fiscal ortodoxa, que levou o país e os entes da federação reduzir os investimentos públicos ao seu menor nível nas últimas cinco décadas, sem obter sucesso no controle do déficit.

É por isto que temos que nos debater de forma recorrente e em todos os espaços possíveis, contra os cortes, contingenciamentos ou reduções dos orçamentos públicos e outras formas de desfinanciamento nas áreas de educação, ciência, tecnologia e inovação, informados exclusivamente pela visão linear e limitada de que o equilíbrio das contas se encerra somente na austeridade fiscal. Vale o mesmo também para os cortes saúde e segurança pública, obviamente.

São áreas que levaram décadas e, porque não séculos, sendo fomentadas e recebendo fortes investimentos. Passaram-se governos com as mais variadas matizes, todos eles com a compreensão de que para nos inserirmos de forma autônoma e soberana na era do conhecimento e da inteligência, seria fundamental construirmos uma base sócio-econômica local e independente, com soberania científica. Foram fortes e imprescindíveis recursos na área educacional, tornando nossa ciência uma referência no mundo, como o é reconhecidamente, e, reduzindo o gap tecnológico existente no país. Que nos levou a mergulharmos no mundo compartilhado, cooperativo, colaborativo e interconectado da inteligência, da tecnologia e da inovação, tendo a formação de recursos humanos locais, no centro, formando e retendo nossos talentos aqui.

Se não interditarmos e superarmos isto, uma nova onda de fuga de cérebros, como outrora, tomará conta de nosso país, fazendo com que, infelizmente, naveguemos todos juntos em direção a reproduzirmos tardiamente uma nova Atlântida, o paradoxal continente que foi coberto pelo mar.

E precisamente, as áreas e setores que mais necessitariam serem apoiados, poderão submergir pelo descaso e o obscurantismo, sem deixar sequer vestígios e traços de uma legenda, como sua ancestral marítima.

(*) Professor, engenheiro, ex-Secretário de Estado e ex-presidente da AL/RS.

§§§

As opiniões emitidas nos artigos publicados no espaço de opinião expressam a posição de seu autor e não necessariamente representam o pensamento editorial do Sul21.

 


Leia também
Compartilhe:  
Assine o sul21
Democracia, diversidade e direitos: invista na produção de reportagens especiais, fotos, vídeos e podcast.
Assine agora