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7 de fevereiro de 2011
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14:10

Onde Homeopatia e Homofobia se encontram

Por
Sul 21
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Bom, óbvio que em lugar algum, não é mesmo estimados leitores? Se encontrarão nessa coluna, hoje, pelo simples motivo de que vou dividir a mesma em duas partes, cada uma sobre um dos temas do título, por uma simples questão prática.

Parte A: A inutilidade homeopática e a ciência que nos salva

Dias atrás escrevi uma coluna sobre crenças que se mostraram inviáveis, e muitos leitores cobraram uma maior clareza da coluna com relação ao tema. Muito bem, aqui vai: homeopatia é uma tolice, mais uma crença baseada em coisa alguma que valha o tempo meu, seu, do senhor aqui ao lado, de quem quer que seja. Não vou me estender sobre o assunto, mas asseguro aos meus leitores que sou um colunista pós-conceituoso, e li e estudei o tema, como estudei coisas sérias e outras nem tanto. Leiam esse belíssimo texto do médico José Colucci, publicado creio que no Observatório da Imprensa, em 2001, e resistam se forem capazes. Leiam ainda esse belo texto do caçador de deuses, Richard Dawkins. E quem quiser ir além, existe o famoso estudo da revista Lancet, de 2005 que demonstra que homeopatia e placebo dão na mesma coisa.

Eu sinceramente não sinto que seja importante ir tão fundo no tema, estimados sulvinteumenses. Na hora em que alguém vem lhe dizer que espera que você acredite que um pote com água e algumas moléculas de qualquer coisa, ao ser batido contra uma superfície 100 vezes, adquira vida (ou memória), o natural é que, eu, e espero que qualquer leitor lúcido, saia da sala.Você não sabia disso, sabia?

Hoje, em várias cidades do mundo, pessoas tomaram vidros inteiros de homeopatia, e, sabem o que aconteceu? Nada, óbvio. Do nada, não sai nada. Do nada, sai a crença de que hóstia e vinho viram pão e sangue de Jesus, se um padre disser umas palavras nessa hora, o que permite a igrejas viverem muito bem há dois mil anos. Se o amigo leitor está disposto a acreditar em uma coisa, é natural que acredite na outra. Mas crença individual, seja em astrologia, numerologia ou vida dos duendes é uma coisa. Aceitar a legitimação dessas crenças em cursos na universidade, ou deixar o SUS pagar por elas, arriscando seus milhões de usuários com tratamentos inócuos, é errado. O Parlamento inglês já começa a rever a política que permite ao SUS deles pagar por essas terapias, ufa!

Esse colunista, estimados leitores, é um orgulhoso produto do Iluminismo. E, no ano em que esse que vos escreve nasceu, foi lançada a vacina Sabin, contra a paralisia infantil, e minha mãe chorou um dia e uma noite inteiros, sabendo que o filho dela, pela primeira geração na história, ia viver e crescer livre desse mal. Assim, aqui, estimados leitores, crendices e mágica não têm, nunca terão, vez. E não vai ter horóscopo tampouco.

Parte B: O dia em que os homofóbicos tremeram

Nessa semana, nos Estados Unidos, um jovem de 19 anos virou ídolo nacional, ao falar diante da Assembléia do estado de Iowa, onde legisladores pretendiam votar uma lei desfazendo o casamento gay, válido por lá desde 2009. Ele defendeu sua família, formada por um casal de mulheres, ele, e uma irmã com tanta eloquência e honestidade que conseguiu colocar os homofóbicos na defensiva e precisando demonstrar o impossível: que casais gays são incapazes de criarem filhos. Zack Wahls, que vocês podem ver aqui, demonstra a existência daqueles momentos raros em que um indivíduo, na hora certa, do jeito certo, afeta a todo o processo social de uma época.

Nessa mesma semana, a novíssima senadora Marta Suplicy fez jus à sua história e estilo e, no seu primeiro ato, conseguiu as 27 assinaturas que revivem o projeto de lei que torna a homofobia um crime no Brasil. Vocês podem imaginar o que vai ser esse processo, estimados leitores, com todos aqueles evangélicos (e católicos) homofóbicos mostrando a cara. Não vai ser fácil, e espero que todos nós compreendamos a importância do nosso apoio a essa luta.

A Marta afirmou uma posição clara da esquerda: lutar contra as injustiças e a discriminação, e as formas de discriminação aos gays estão entre as mais odiosas que ainda nos restam.

Vem aí a boa luta, e cabe a nós, mostrarmos a que viemos. Aqui, nessa coluna, estimados leitores, a homofobia já é crime e inafiançável, há horas. Falta apenas estendermos esse conceito essencial de igualdade e injustiça para o restante do país e estaremos um pouco melhor, todos nós.

* Marcelo Carneiro da Cunha, jornalista e escritor de Antes que o Mundo Acabe, Insônia, Simples e Depois do Sexo, entre outros. Adaptações para o cinema resultaram no curta O Branco, premiado em Berlim, e Antes que o Mundo Acabe, escolhido pela Associação Paulista de Críticos de Artes, como o melhor filme brasileiro de 2010, entre outras premiações. Foi escritor-residente da Ledig House, em Nova York, e autor convidado da Fundação Japão. Leciona criação ficcional na Academia Internacional de Cinema, de São Paulo. Produziu os livros Um Astronauta no Chipre, de Jorge Furtado, e Na Contra-mão da Pré-História, de Tarso Genro. Colunista do Terra Magazine, e Sul 21, publica pelas editoras Projeto, e Record. Porto-alegrense e torcedor do Grêmio, começa a simpatizar com o Corinthians. Vive em São Paulo.

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no twitter, @marceloccunha


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