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17 de maio de 2010
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14:39

A queda da economia globalizada

Por
Sul 21
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Por Eneas de Souza

O caso da Europa tem o seu tempo de humor e de melodrama. Faltou sem dúvida um sal de grandeza. O humor veio da forma como, ao longo de cinco meses, as nações européias trabalharam. Primeiro, foi o tombo da Grécia com um buraco enorme nas contas públicas e um possível calote nos bancos locais e estrangeiros. Segundo, a Europa levou tanto tempo para ajudar, a Alemanha queria tantas exigências, que, de repente, a primavera chegando, trouxe um vasto temporal. Depois, de tantas negociações, todos perceberam que o próprio continente – todos os países da Comunidade Européia – estava como alguns pugilistas que enfrentavam Cassius Clay: à beira do nocaute. E resolveram montar um pacote de ajuda.

E aí, é como a história do cara que cai na calçada escorregando numa casca de banana. Pode ser um acidente grave, mas todo mundo não pára de rir. E a reunião que decidiu o salvamento da Grécia, dos bancos e das nações européias foi se acumulando, de sexta até domingo à noite. A toda hora mudando os valores do pacote. Começaram em 100, passaram para 200 – e depois da exigência de Obama que terminassem as reuniões antes da abertura das bolsas asiáticas – acabaram em 750 bilhões de euros, quase um trilhão de dólares de garantia. Neste filme, os ministros estavam exaustos e a Europa salva. Mas, tudo foi feito, na verdade, em ritmo de comédia. A gente olhava as fotos e todos tinham a cara do Buster Keaton. Até a Christiane Lagarde, a ministra das Finanças francesas, uma senhora de perfil aristocrático, cabelos brancos e geralmente de sorriso afável.

O que ficou claro nesta película? Antes de mais nada, que o euro não é uma moeda. Ele tem uma máscara de moeda. Porque? Porque uma moeda contemporânea, que é uma moeda financeira, para exercer a sua função de reserva de valor tem que ter Banco Central e Tesouro. Banco Central para fixar a valorização, que é dada pela taxa de juros. E Tesouro para materializar o valor, através dos títulos públicos emitidos por este mesmo Tesouro. E a Europa não tem Tesouro. A moeda fica de calça curta. Ou, se os leitores quiserem outra metáfora, mais cafona ainda, ficou caolha. Agora me lembro da namorada de Brás Cubas, do romance de Machado de Assis, que capengava de uma perna, a Vênus Manca. Pois, a moeda européia ficou como a Vênus Manca. Sedutora pela idéia, mas o amante querendo se livrar pela aparência.

E o que se pode ver neste episódio? Ele tem aparências de comédia, mas o autor está querendo fazer uma obra trágica. Só que até agora o que temos é um melodrama: “A Queda da Economia Globalizada em Dois Atos”. Primeiro, foi os Estados Unidos, onde o sistema financeiro desabou, mas não cedeu nada até agora, pegou a grana do Estado e se enfureceu com a idéia de reformas. Só que foi apanhado em flagrante delito: a jóia das instituições financeiras, a Goldman Sachs, organizou a fraude da Grécia e foi denunciada pela SEC, a Comissão de Valores, por fraude anterior na crise de 2007. O segundo, falamos da Europa. Só que tem um personagem comum que atiça o drama: as finanças. Esta figura econômica trabalha com uma fome de dinheiro desgraçada, vai como os gafanhotos devorando tudo. Botou a economia americana em recessão. E agora, como diz meu amigo André Scherer, caminha para o suicídio, botando e querendo botar fogo em Atenas, Lisboa, Berlim, etc.. Será que vai se ouvir algum executivo financeiro perguntando se “Paris está em chamas”?


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