Cidades
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27 de julho de 2020
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20:19

Suspensão da concessão do Mercado Público ‘ameniza’ preocupação dos permissionários

Por
Sul 21
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Suspensão da concessão do Mercado Público ‘ameniza’ preocupação dos permissionários
Suspensão da concessão do Mercado Público ‘ameniza’ preocupação dos permissionários
Patrimônio de Porto Alegre, proposta de Marchezan prevê a concessão do Mercado Público à gestão privada por 25 anos. Foto: Guilherme Santos/Sul21

Luciano Velleda

Uma semana antes da abertura das propostas de concessão do Mercado Público de Porto Alegre, prevista para esta sexta-feira (31), o conselheiro Cezar Miola, do Tribunal de Contas do Estado (TCE), decidiu suspender o processo. No despacho, Miola justifica a medida cautelar ao decidir haver a necessidade de autorização da Câmara Municipal para a concessão do Mercado à iniciativa privada. Pela proposta do Prefeito Nelson Marchezan Júnior (PSDB), a empresa vencedora irá administrar o Mercado pelos próximos 25 anos.

“Concluo que assiste razão à Supervisão, ao MPC (Ministério Público de Contas) e à ASCOMEPC (Associação do Comércio do Mercado Público Central de Porto Alegre) quando apontam a impossibilidade de se dar sequência à licitação visando à concessão do Mercado Público sem autorização legislativa”, escreveu o conselheiro, em decisão proferida na última sexta-feira (24). Miola determina que os envelopes com as propostas podem ser entregues no prazo estipulado, mas não podem ser abertos e, a partir de então, a concorrência pública deve ficar suspensa “até ulterior pronunciamento deste Tribunal a respeito da matéria”.

Em nota, a Associação do Comércio do Mercado Público Central de Porto Alegre (Ascomepc) destaca que, em sua decisão, o conselheiro do TCE demonstrou preocupação com a destinação do local, mais precisamente quanto à preservação da finalidade e da natureza do Mercado Público, além da prévia autorização legislativa para concessão do patrimônio.

Adriana Kauer, presidente da Associação do Comércio do Mercado Público Central, diz que a decisão do Tribunal ameniza, ainda que temporariamente, a preocupação dos 106 permissionários. “A análise do TCE mostrou antes de mais nada respeito à história do Mercado Público. Foi de grande conhecimento jurídico e da realidade de quem vive o mercado público. Detalhou itens que ficaram rasos no edital ou sequer foram tratados. Salientou a importância dos mercadeiros. Trabalho de quem conhece e gosta do Mercado. Então, após 20 dias do acesso do interior do mercado fechado, a abertura dos envelopes, em meio à pandemia, estava afetando todos que dependem do Mercado para sobreviver. Essa notícia nos dá mais ânimo”, afirma Adriana.

Contradições

A presidente da Ascomepc chama atenção para o item do edital que dispõe sobre as “Diretrizes Gerais de exploração do Mercado Público”. Há vários sub-itens que especificam atividades que não podem ser realizadas no Mercado, de forma a não descaracterizá-lo. Por exemplo, a proibição de estabelecimentos pertencentes a redes comerciais, com exceção àquelas marcas com comprovada origem em mercados públicos. É também vedada a exploração de lojas e bancas cuja atividade econômica principal seja o comércio de produtos eletroeletrônicos, comércio de móveis e utilidades domésticas, artigos de vestuário e calçados, veículos ou relacionados, assim como a comercialização de produtos na modalidade de comércio atacadista. Por fim, o edital também impede a exploração de lojas, bancas, boxes ou espaços para a realização de atividades típicas de supermercados e hipermercados.

Porém, depois de todas essas especificações do que não pode ser comercializado no Mercado Público, o último sub-item abre brecha para mudanças, a pedido da concessionária, a cada cinco anos. Diz o edital: “A concessionária poderá submeter, a cada período de 5 (cinco) anos a partir da publicação do Termo de Entrega de Bem Público, nos termos do Contrato, solicitação de modificação das diretrizes estabelecidas neste item e seus subitens, objetivando acompanhar a evolução na forma e atendimento do mercado de consumo e consumidor local.”

“Isso é gravíssimo”, afirma Adriana. A presidente da Associação do Comércio do Mercado Público Central enfatiza que o edital, de modo vago, diz que a solicitação de modificação das diretrizes estabelecidas será julgada pela “Prefeitura”, sem especificar qual órgão ou em quais condições. Outro ponto destacado por Adriana como preocupante, é a determinação de que, pelos próximos quatro anos, os atuais permissionários terão preferência na renovação dos seus pontos, sem, entretanto, estabelecer um teto nos aluguéis pagos. “Isso é leilão”, define.

Ao contrário da posição da Prefeitura, que aponta haver privilégio dos atuais permissionários, a presidente da Ascomepc explica que o Mercado Público é sustentado com a receita proveniente do Termo de Permissão de Uso (TPU), pago por cada comerciante. “O dinheiro que sustenta o Mercado é gerado pelos próprios permissionários.” Ela ainda critica que, desde dezembro, a Ascomepc não recebe da Prefeitura a prestação de contas do Mercado Público.

“Eles personalizaram, virou uma questão ideológica. ‘Eu quero privatizar porque eu quero’, analisa Adriana. “O Mercado Público é mesmo público, não é só para a classe alta. Não queremos afastar o cliente que gasta pouco. Essa pessoa dá vida ao Mercado. Me sinto dentro da história de Porto Alegre, é nisso que somos privilegiados.”

Líder da bancada do PT na Câmara, o vereador Adeli Sell comemorou a decisão do Tribunal de Contas do Estado (TCE). Adeli diz que o mandato tem atuado no tema desde o ano passado e, no dia 17 de julho, enviou ao TCE uma abaixo-assinado com mais de 20 mil assinaturas da sociedade civil contra o processo de concessão do Mercado Público, além de documentos que apontariam falhas do governo de Marchezan durante o processo.

“Anexo ao abaixo-assinado, entregamos a representação com uma série de argumentos que mostram as ilegalidades cometidas pelo município. Entre elas destaco o Art.84 da Lei Orgânica do Município que veda este tipo de ação por parte do prefeito nos 180 (cento e oitenta) dias que antecedem o término do mandato. Portanto, nada poderia ser feito depois de 1º de julho (período eleitoral). Além deste argumento, elencamos muitos outros que apontam todos os prejuízos ao interesse público de Porto Alegre, demonstrando desta maneira a relevância social que merece a intervenção do Ministério Público e investigação por parte do Tribunal de Contas do Estado”, explica Adeli Sell.

A Prefeitura de Porto Alegre informa já estar trabalhando na defesa que irá apresentar ao TCE nos próximos dias.


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