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21 de fevereiro de 2019
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16:33

‘O transporte, em Porto Alegre, é algo que limita quem quer estudar’: Estudantes protestam contra tarifa de R$ 4,70

Por
Sul 21
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A reunião entre os conselheiros do Comtu aconteceu em paralelo à manifestação organizada pelos estudantes secundaristas e universitários contra o aumento das tarifas. Foto: Guilherme Santos/Sul21

Giovana Fleck

“Não sei quantas vezes já soube de gente que falta as aulas por não ter dinheiro para a passagem.” Jessica Bassoalga é presidente do grêmio estudantil do Instituto Estadual de Educação Paulo Gama. Segundo ela, desde que assumiu a frente da liderança estudantil em seu colégio, não parou de ouvir relatos que relacionam a estrutura do transporte de Porto Alegre e o afastamento de alunos. “Sem transporte de qualidade, sem um preço justo, estudar fica mais difícil do que deveria ser”, afirma.

Na segunda semana de fevereiro, o prefeito Nelson Marchezan Jr. (PSDB) seguiu a política de aumento das passagens pelo terceiro ano consecutivo.  Foram enviadas duas possibilidades de cálculo para deliberação do Comtu (Conselho Municipal de Transportes Urbanos). A primeira é a tarifa ordinária, que resultaria em R$ 4,75. A segunda leva em consideração a projeção do desconto, resultado da publicação da Lei 12.503/19, já na passagem deste ano, que resultaria em um valor de R$ 4,70.

A reunião entre os conselheiros do Comtu aconteceu em paralelo à manifestação organizada pelos estudantes secundaristas e universitários contra o aumento das tarifas. O ato começou em frente à Prefeitura Municipal no início da manhã desta quinta-feira (21). Os manifestantes intercalaram falas e palavras de ordem com músicas que já viraram parte do repertório repetido anualmente: “Eta, eta, eta, eta, se a passagem aumentar a gente pula a roleta”.

“É muito fácil para quem só anda de carrão com seguranças decidir como serão as regras para quem anda de ônibus”, disse, ao microfone, o representante dos estudantes da UFCSPA. Nas falas de outras lideranças estudantis, ficou evidente o descontentamento com a qualidade do serviço e a falta de perspectivas de melhoras com o aumento. “Transporte é um direito. Transporte público garante acesso à educação. Em Porto Alegre, transporte também é algo que limita quem quer estudar”, afirmou a representante do DCE da UFRGS.

Vinian Liz, estudante de graduação na Unirriter, depende de, no mínimo, dois ônibus por dia para chegar à universidade. “Um aumento de R$ 0,40 é inviável pra quem depende de quatro ônibus para ir e voltar da aula”, diz.

Justificativa para o aumento

Os estudantes seguiram em caminhada pela Borges de Medeiros. Foto: Guilherme Santos/Sul21

Segundo a Prefeitura, a ideia por trás do aumento está em manter a mesma lógica aplicada em anos anteriores. Em janeiro, o Sindicato das Empresas de Ônibus de Porto Alegre (Seopa) protocolou um pedido de reajuste da passagem com aumento de 11,16% – acima da inflação, que nos 12 meses anteriores ficou fixada em 3,75%. O Seopa justifica que o pedido está de acordo com o reajuste salarial dos rodoviários.

Estudo realizado pelo Dieese (Departamento Intersindical de Estatística e Estudos Socioeconômicos) apontou que o valor da passagem paga nos ônibus da capital registraram um aumento maior que o dobro da inflação nos últimos 25 anos.  Segundo o estudo, as tarifas cresceram 1170,27% em comparação com a inflação no período: 455,23%, de acordo com o Índice Nacional de Preços ao Consumidor (INPC/IBGE). Entre 1994 e 2019, o salário dos motoristas também não acompanhou o mesmo ritmo das passagens. De acordo com o Dieese, o reajuste acumulado do piso da categoria foi de 516,14%.

O prefeito Nelson Marchezan Jr. chegou a sugerir um aumento ainda maior da tarifa: R$ 5,15. No entanto, foi às redes sociais comemorar a “redução” do valor para R$ 4,70. Ele afirmava que a Prefeitura tomou medidas como “a otimização e racionalização de linhas”, além da redução de isenções para idosos e, assim, conseguiu abater os R$ 0,45 do valor final. A manifestação do prefeito, divulgada no Twitter, gerou revolta entre os usuários que rebateram as constatações do prefeito questionando a lógica do cálculo e a realidade do serviço oferecido pela Prefeitura.

Transporte na vida dos estudantes

“Ô, Marchezan, seu salafrário, tá defendendo os interesses do empresário”, cantavam os manifestantes. Foto: Guilherme Santos/Sul21

Lais Vieira, estudante do 3º ano da Escola Estadual de Ensino Médio Padre Réus afirma que: “Todos os anos a passagem aumenta e a qualidade cai. Como o transporte impacta no estudo? Faz com que a gente se atrase. Faz com que a gente se sinta inseguro. Com certeza não motiva – ainda mais com um preço absurdo.” Segundo ela, a inconstância nos horários das linhas que circulam nas proximidades do colégio faz com que, recorrentemente, mais da metade de uma turma inteira se atrase para as aulas. “É ruim para a escola, para o professor e para o aluno.”

O ato saiu em caminhada da frente da Prefeitura em direção ao Largo Zumbi dos Palmares. “A luta de R$ 0,40 não faz sentido”, disse um dos estudantes que segurava o microfone ligado ao carro de som. “Os ônibus continuam os mesmos, os salários continuam os mesmos”, completou, enquanto os outros manifestantes cantavam: “Ô, Marchezan, seu salafrário, tá defendendo os interesses do empresário.”

Ao chegar ao Largo, algumas lideranças comunicavam que a deliberação do Comtu indicava a aprovação da proposta de fixar a taxa em R$ 4,70. “Transporte público não é mercadoria!”, gritavam. “Não vamos desistir, somos o presente. Marchezan tem que nos ouvir”, disse a estudante Jessica Bassoalgo.

Confira mais fotos: 

Foto: Guilherme Santos/Sul21
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