Fernanda Canofre
Da porta da sua lanchonete no Mercado Público, com saída para a rua do terminal de ônibus Parobé, no Centro de Porto Alegre, o comerciante Giovani Duarte de Souza diz que testemunha de cinco a sete assaltos por dia. A maioria deles em horário comercial. Um trecho dos terminais até recebeu apelido de “Faixa de Gaza”, dado por comerciantes e usuários do transporte público. Trabalhando no mesmo local há 32 anos, Souza diz que essa é a pior fase que já viu o Mercado passar.
“Já fizemos reunião com poder público, com Coronel e tudo, mas é só promessa de melhora e até agora nada. Só promessa para reforçar [a segurança] e ninguém veio. [A Operação Centro] durou dois dias só”, diz ele.
Giovani foi um dos permissionários ouvidos por vereadores que fizeram uma visita ao Mercado Público, na manhã desta sexta-feira (16). A visita é parte da iniciativa “Câmara na Rua”, do atual presidente Valter Nagelstein (MDB) para ouvir de perto problemas da Capital. Participaram ainda os vereadores Sofia Cavedon, Aldacir Oliboni e Adeli Sell (PT), André Carús e Mendes Ribeiro Filho (MDB).
Além da falta de segurança no entorno do Mercado, outros problemas apontados por quem trabalha nele foram o comércio irregular do entorno e as obras pendentes desde o incêndio de 2013, entre elas o Plano de Prevenção Contra Incêndio.
Com a prefeitura alegando não ter caixa para pagar o que falta, em maio do ano passado, os próprios permissionários encaminharam ao Ministério Público pedido para que possam assumir o PPCI. Segundo a Associação dos Permissionários do Mercado Público Municipal, ele custaria em torno de R$ 1,5 milhão e seria pago pelos próprios comerciantes, através de empréstimos pessoais. O Plano é único entrave para que o segundo piso possa ser reaberto. A prefeitura, porém, ainda não autorizou o acordo.
“O Mercado Público estar fechado há 5 anos é o atestado máximo da nossa incompetência. Quando digo nossa é dos políticos em geral. Não dá mais para continuar passando esse recibo, tem que ter uma solução. Até junho, esse segundo piso tem que estar reaberto. A gente precisa vir aqui para cobrar isso? Acho que não. O Poder Executivo foi eleito para isso, para ter atitude, para ter iniciativa”, afirma Nagelstein.
Segundo Adriana Kauer, membro da diretoria da Associação, a previsão é de que a prefeitura assine o acordo sobre o PPCI no próximo dia 05 de março. Esse, porém, não é o único problema em pauta. Desde que a administração do Mercado Público saiu das mãos dos permissionários passando para a prefeitura, há problemas.
O Mercado é gerido pela lei do Fundo do Mercado Público Municipal, o FunMercado. Segundo ela, o que é recolhido pelo aluguel dos pontos, deve voltar em investimentos para o próprio Mercado, em manutenção, limpeza e segurança. Desde que a prefeitura municipal assumiu a gestão, tirando das mãos dos próprios permissionários, o dinheiro é encaminhado diretamente para o Executivo, que é quem deveria contratar as empresas para prestar estes serviços. Enquanto o poder público diz não ter dinheiro para pagar os serviços no Mercado, são os comerciantes que cobrem as despesas.
“Hoje, a Associação gasta em torno de R$ 60 mil por mês com a manutenção do Mercado, fora a permissão de uso que recolhemos todos os meses. Só o que arrecadamos mensalmente já deveria estar contemplado isso, porque o Mercado é superavitário e sobra dinheiro para [manutenção]. O dinheiro que deveria voltar para cá está sendo jogado dentro do Caixa Único [da prefeitura]”, diz Adriana.
Além da equipe de segurança privada e de limpeza, eles ainda pagam uma empresa terceirizada para fazer a limpeza do sistema de esgoto todos os meses. Antes do incêndio, o serviço era realizado pelo Departamento Municipal de Limpeza Urbana (DMLU).
Há ainda problemas da reforma pós-incêndio, que também está travada. Um comerciante, que preferiu não se identificar, conta que gasta em média R$ 1,5 mil por mês apenas pelo aluguel do ponto, fora despesas de água, luz e manutenção que são cobrados à parte. Em dias de chuva, a banca dele é uma das que ficam alagadas porque faltam telhas no telhado. “Sempre que tem reunião a desculpa é que não tem verba e que dá prejuízo. Querem transformar isso num shopping”, diz ele.
Outro comerciante cedeu o vídeo abaixo ao Sul21 para mostrar a situação do temporal da semana passada.
Plano do governo, permissionários temem a privatização
A afirmação de que o Mercado daria “prejuízo” ao poder público, vem acompanhada de um plano assumido pela gestão de Nelson Marchezan Jr. (PSDB). O governo pretende incluir o Mercado Público como uma das parcerias público-privadas que a prefeitura pretende firmar.
Adriana, porém, diz que os permissionários temem a privatização. “Hoje nós sabemos que gerimos o Mercado e sobra dinheiro com o que é feito. Uma terceira pessoa gerindo isso, com moldes de shopping, sabemos que teremos de pagar os custos desse administrador e não sabemos qual será”, questiona ela.
A vereadora Sofia Cavedon (PT), que também participou da visita, encaminhou pedido de informações a prefeitura, no ano passado, pedindo comprovação de que o Mercado seria deficitário. Segundo ela, em documentos assinados pelo próprio Marchezan, ficou comprovado que ele tinha dinheiro suficiente para cobrir segurança, limpeza e manutenção com o que era recolhido pelos permissionários todos os meses.
“Fica muito claro a falta de vontade política e o descaso da gestão Marchezan com as soluções para o Mercado Público. Ele não tem como argumentar que é um problema de dinheiro, que é falta de recursos”, afirma ela.
Sofia também criticou a decisão de colocar o Mercado sob administração do Executivo e diz que pretende questionar o atual modelo. “Essa foi uma alteração que ficou claro que foi prejudicial ao Mercado. Quem melhor cuida é quem está interessado, quem está aqui no cotidiano”.
Confira mais fotos da visita: