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10 de novembro de 2017
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03:46

Pesquisa da UFRGS indica que 20% dos estudantes deixariam de usar ônibus sem a meia passagem

Por
Sul 21
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Pesquisa da UFRGS indica que 20% dos estudantes deixariam de usar ônibus sem a meia passagem
Pesquisa da UFRGS indica que 20% dos estudantes deixariam de usar ônibus sem a meia passagem
(Foto: Guilherme Santos/Sul21)

Fernanda Canofre

Dos 119,6 mil estudantes de Porto Alegre que, todos os dias, usam o transporte público para estudar, cerca de 23 mil não pegariam mais ônibus caso o direito à meia passagem seja retirado. Medida de um dos projetos propostos pelo prefeito Nelson Marchezan Júnior (PSDB), dentro do pacote que propõe mexer em gratuidades e isenções para resolver a crise do transporte público. Esse público corresponde a quase 20% dos estudantes de ensino médio e ensino superior de Porto Alegre que dependem de ônibus para ter acesso à instituições de ensino. Quem deixaria de usá-los o faria por não ter como pagar o valor integral de R$ 4,05.

Esse foi um dos dados apresentados, nesta quinta-feira (09), por estudantes de Economia da Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS) que realizaram o estudo de “Impacto Econômico do Fim do Meio Passe”. Eles integram a empresa júnior Equilíbrio Assessoria Econômica. A análise do impacto para estudantes, famílias e cidade foi a segunda parte do estudo. Entre os impactos listados por eles estão: a evasão escolar e a queda de consumo, que pode refletir como crise no comércio local. A pesquisa foi encomendada pelo Diretório Central dos Estudantes da UFRGS.

“A retirada desse direito não é só para nós, estudantes, mas também para as famílias que vão perder poder de consumo, para os comércios que deixam de vender. Tudo isso acontece, enquanto cresce a receita das empresas”, diz Filipe Eich, representante da UEE Livre Dr. Juca, também estudante de Economia na UFRGS.

O cartão TRI Escolar é utilizado por 66% da população de estudantes de ensino médio e ensino superior, em Porto Alegre. O direito é reconhecido pelo governo municipal há 62 anos. A pesquisa mostra que shoppings, bares e festas estão entre os locais mais frequentados por jovens na faixa etária pesquisada. Caso a meia passagem termine, 79% dos estudantes de ensino superior responderam que teriam de parar de gastar nestes locais, para ter como pagar a passagem.

O estudo mostra ainda que, embora a mudança aponte para uma possível queda de R$ 0,04 no preço total da passagem, não há provas de efeitos práticos. Os números apontam ainda que as famílias mais pobres seguem sendo as que mais sofreriam com a mudança. Para famílias que recebem entre 3 e 5 salários mínimos, o gasto mensal com as passagens passaria de 11,36% para 22,76%. Famílias que recebem entre 5 e 7 salários, passaria de 9,17% para 13,15%. Enquanto famílias que recebem de 7 a 9 salários viriam o gasto aumentar de 3,79% para 7,59%.

Para se aproximarem ao máximo da realidade, os pesquisadores ouviram 384 estudantes de ensino superior (de um universo de 92.308) e 383 de ensino médio (de 47.786). Além disso, tentaram manter parâmetros respeitando traços sociais. No caso da população de ensino superior, por exemplo, fizeram com que os alunos da UFRGS representassem 30% dos entrevistados, uma vez que correspondem a 30% da parcela desta população. Já no caso dos alunos de ensino médio, sem nenhuma instituição que se destacasse em números, usaram o Orçamento Participativo para dividir Porto Alegre em zonas e fazer a análise através delas.

O aumento de 1% na tarifa, diminuiria 0,19% no número da população que usa o TRI. E a tendência, pelos números, é de que, quanto mais baixa a renda, mais as pessoas utilizem o transporte público. A pesquisa foi conduzida através de entrevistas presenciais e virtuais. Os entrevistados tinham de responder a 12 questões, abordando, entre outras coisas, a renda, média de passagens usadas em um mês e renda familiar.

“Pais que pudessem pagar por transporte privado, já teriam feito isso. Só pega ônibus em Porto Alegre quem não tem outra alternativa e vai precisa pagar”, disse a estudante Vitória.

O governo Marchezan também não teria deixado claro quais foram os critérios usados por ele para estabelecer, como ponto de corte para acesso ao meio passe, o limite de renda em três salários mínimos. O vereador André Carús (PMDB), presidente da Frente Parlamentar em Defesa do Meio Passe, diz que perguntou ao presidente da EPTC (Empresa Pública de Transporte e Circulação), durante uma entrevista ao vivo, em uma rádio. A resposta foi que a pesquisa se baseou em números do IBGE.

“[Essa proposta] não resolve o problema da tarifa, apenas aprofunda”, afirma Fellipe Belasquen, presidente do Diretório Central de Estudantes (DCE) da UFRGS. Ele explica que uma pesquisa recente, feita através da universidade, aponta quatro fatores que fariam com que as pessoas optassem por usar mais ônibus em Porto Alegre. O primeiro é a questão do preço: redução da tarifa, poderia atrair mais usuários. Segundo, a cobertura das linhas, que não chegam a muitos locais. Em terceiro, a segurança, tanto dentro dos veículos, quanto nas paradas. E, por fim, o conforto. “Todo pacote do Marchezan, inclusive a questão da meia passagem, vai na contramão de resolver a questão do transporte público”, avalia ele.

Outro estudante aponta que, além do aumento de R$0,20 na tarifa, ocorrido este ano, quem depende de ônibus em Porto Alegre precisa suportar longos tempos de espera nas paradas, riscos de assaltos, problemas de goteiras em dias de chuva, falta de assento e condições de segurança no transporte.

O vereador Carús lembra que o pacote que altera isenções e gratuidade no transporte veio sem nenhuma garantia de redução no valor da tarifa, por parte da Prefeitura, nem nada que aponte para uma melhoria significativa do serviço. Enquanto isso, por parte dos estudantes, os riscos já estão colocados.

“A pesquisa demonstra que haverá um risco principal, com a retirada do meio passe: a evasão dos estudantes tanto das universidades, como das escolas. O estudante que evade é o mesmo que continuará sem emprego, sem oportunidades, que ficará em situação de vulnerabilidade social, pode ingressar na criminalidade. Queremos continuar lutando pela manutenção do direito ao meio passe. Não é um benefício puro e simples, mas a garantia de que eles continuem frequentando as instituições de ensino”, afirma o vereador.


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