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22 de abril de 2017
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11:30

Fora dos planos do governo Marchezan, ciclovias andam apenas em função de projetos antigos

Por
Luís Gomes
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Fora dos planos do governo Marchezan, ciclovias andam apenas em função de projetos antigos
Fora dos planos do governo Marchezan, ciclovias andam apenas em função de projetos antigos
|Foto: Guilherme Santos/Sul21

Luís Eduardo Gomes

Na última quarta-feira (19), foi comemorado o Dia Mundial da Bicicleta. A data, no entanto, parece ter passado batida em Porto Alegre, onde, nos primeiros quatro meses da gestão Nelson Marchezan Jr. (PSDB), movimentos de ciclistas percebem uma espécie de silêncio, ou letargia, do governo municipal sobre como irá implementar o Plano Diretor Cicloviário Integrado (PDCI), que prevê uma malha de 495 km de ciclovias na cidade – atualmente com cerca de 45,2 km. Apesar de reconhecer que não há metas definidas pela nova gestão para a área, a Empresa Pública de Transporte e Circulação (EPTC) diz que continua trabalhando na construção de novas faixas exclusivas para bicicletas, com a previsão de entregar ao menos 7 km até o final do ano.

O Plano Diretor Cicloviário de Porto Alegre foi aprovado em 2009 com o objetivo de “incentivar o uso da bicicleta como meio de transporte, dotando a cidade de instrumentos e infraestrutura eficazes para a implantação de uma rede cicloviária que propicie segurança e comodidade para o ciclista”. O PDCI tinha como diretrizes criar condições para dividir o espaço público de uma maneira mais democrática e justa; desenhar e planejar o sistema viário de maneira que seja mais seguro e mais atrativo o uso da bicicleta; tornar a bicicleta elemento de relevância em todos os projetos viários; e implantar redes de ciclovias e suas infra-estruturas auxiliares – bicicletários, sinalização, etc.

Entre os instrumentos previstos para colocar isso em prática estava a Rede Cicloviária Estrutural, que prevê 495 km de ciclovias ou ciclofaixas em todas as regiões da cidade. Além de investimento público, previa para sua viabilização a obrigatoriedade de grandes empreendimentos, como contrapartida, construírem ciclovias proporcionais ao número de vagas de estacionamento para automóveis que criam.

Daniel Silva, integrante do coletivo Mobicidade, questiona justamente a falta, até agora, de um plano de aplicação para o PCDI. Ele também diz que o governo ainda não deu nenhum indício de que “a bicicleta entre em seu programa de governo” e que os movimentos de ciclistas não têm conseguido dialogar com o Executivo sobre o tema, apenas com a EPTC – participam de um grupo de trabalho junto com outras entidades. No entanto, ele afirma que a empresa “segue um pouco a linha do governo anterior, irredutível em relação à aplicação do Plano Diretor, que não acontece”. “Tudo que for para mexer com a ideia do carrocentrismo, eles têm muita resistência em fazer”, avalia.

Silva diz entender que a Prefeitura não tem previsão de investimentos em razão da crise financeira, mas diz que algumas medidas que melhorariam a situação dos ciclistas não necessariamente exigem recursos expressivo, como melhorar a sinalização de vias com fluxo intenso de ciclistas, diminuir a velocidade máxima nas ruas e redirecionar pontos de ciclovias que apresentam problemas de falta de segurança ou trancam o fluxo das bicicletas. “Queremos que a bicicleta seja colocada como integrante da cidade, não como algo que atrapalhe o trânsito. Não precisa muito dinheiro para isso, precisa só de campanhas e sinalização”, pondera.

Vereador Marcelo Sgarbossa comemora derrubada no veto aos bicletários | Foto: Ederson Nunes/CMPA

Principal militante na Câmara em defesa da abertura de mais e melhores espaços para as bicicletas, o vereador Marcelo Sgarbossa (PT) também entende que ainda não “há nada de substantivo anunciado” pela Prefeitura e que é difícil fazer uma avaliação do que esperar do governo Marchezan para a área.”Não se sabe bem qual a política, não anunciou nem que irá parar as ciclovias ou se vai continuar, não anunciou novas estações de bicicletas compartilhadas”, diz.

No entanto, ele argumenta que, na única decisão que tomou até o momento relacionada ao assunto, o prefeito Marchezan vetou um projeto de sua autoria que permitia a instalação de paraciclos e bicicletários sobre vagas destinadas a carros, um projeto defendido inclusive por comerciantes. Apesar de trazer a justificativa de que o projeto de lei contrariava o Plano Diretor de Desenvolvimento Urbano Ambiental (PDDUA), o veto foi derrubado por unanimidade no dia 21 de março.

“Do pouco que se tem, esse veto dele é demonstrativo, apesar de ter usado argumentos formais, porque ninguém fala que é contra bicicleta abertamente, isso seria algo do século passado. O veto foi tão desproporcional, sem razão, que até a própria base do governo votou contra”, diz Sgarbossa.

Questionado sobre seus planos para as bicicletas na coletiva que precedeu sua palestra na Federasul em 22 de março, o prefeito Marchezan disse que a sua gestão irá analisar a expansão da malha cicloviária da Capital de maneira “muito mais técnica” e que fará um planejamento de acordo com a perspectiva de utilidade”, com a avaliação de quais serviços precisam ser disponibilizados junto a essas faixas, mas também de quais estão sendo “realmente utilizadas” hoje. “Para que a gente possa ampliar e investir, mas em algo que efetivamente tenha um retorno no dia a dia da sociedade”. Questionado se hoje os investimentos na construção de novas ciclovias estavam paralisados, respondeu: “Tem muita coisa paralisada e não é de hoje”.

Prefeito Marchezan Junior participa de coletiva na Federasul | Foto: Maia Rubim/Sul21

Na mesma ocasião, Marchezan indicou que a prioridade de sua gestão em termos de mobilidade urbana, ao menos inicialmente, será buscar alternativas financeiras para acabar as chamadas Obras da Copa e o investimento em novas tecnologias a serem instaladas em ônibus, como reconhecimento facial e a possibilidade de pagar as tarifas diretamente com cartão de crédito, sem indicar um plano maior para a área.

O que está em andamento?

A EPTC, porém, nega que a construção de ciclovias esteja parada. A engenheira civil Alessandra Both, gerente da Gerência de Projetos e Estudo de Mobilidade, reconhece que a gestão Marchezan ainda não apresentou metas a serem cumpridas pelo organismo, ao contrário do que acontecia em outros anos. No entanto, afirma que a área técnica “continua trabalhando a todo vapor” em projetos que já existiam e em projetos futuros. Ela diz que, este ano, já foi executado um trecho de 450 m de ciclovia na Av. Nilo Peçanha, como contrapartida paga pela nova sede da Unisinos na cidade.

Segundo Alessandra, há recursos garantidos, que não saem do caixa da Prefeitura, para a construção de 7.190 m de novas ciclovias a serem executadas ainda em 2017. Como contrapartidas de empreendimentos, estão previstos a ampliação das ciclovias na Av. Goethe – 650 m entre as ruas Liberdade e Mostardeiro -, na Av. Joaquim Porto Villanova – 400 m a partir da Av. Ipiranga -, na Av. Aureliano Figueiredo Pinto – 750 m entre as avenidas Getúlio Vargas e Praia de Belas – e na Av. Cel. Gastão Haslocher Mazeron – 250 m entre a Rótula do Papa e Rua Catão Coelho.

| Foto: Guilherme Santos/Arquivo PMPA

Com recursos de um programa de repavimentação de vias na zona norte, oriundos de um financiamento da Corporação Andina de Fomento (CAF), serão feitas ciclovias na Av. Adelino Ferreira Jardim – 760 m entre a Rua Dr. Vargas Neto e Estrada Antônio Severino, já em andamento -, na Rua Dr. Barros Cassal – 590 m entre as ruas Irmão José Otão e Voluntários da Pátria -, na Av. Pernambuco – 1.550 m entre as avenidas São Pedro e Farrapos – e na Av. Nilo Peçanha – 1,2 mil m entre as avenidas Ijuí e Carlos Gomes.

Além disso, como parte da obra de reestruturação da Av. Ernesto Neugebauer, será construída uma ciclovia de 1,8 mil m entre a Rua José Pedro Boéssio e a Av. Amynthas Jacques de Moraes. Segundo Alessandra, esta obra está sendo feita com recursos da Caixa e ocorre porque o PDCI prevê que todas as vias incluídas na Rede Cicloviária Estrutural, ao serem reformadas, já devem ter ciclovias feitas.

Ao todo, a expectativa é que, em 2017, se passe dos atuais 45,2 km de ciclovias para 53,4 km. No entanto, ela diz que há outros projetos já elaborados que podem ser executados caso novos recursos sejam garantidos, como é o caso das obras de contrapartidas. Ela também diz esperar que possa haver investimentos próprios para a área, mas reconhece que esta é uma fonte de recursos que já vinha escasseando nos últimos anos.

Foto: Guilherme Santos/Sul21
|Foto: Guilherme Santos/Sul21

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