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25 de novembro de 2016
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21:06

Mulheres ocupam prédio no centro de Porto Alegre por mais vagas em abrigo e assistência

Por
Sul 21
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25/11/2016 - PORTO ALEGRE, RS - Ocupação Mulheres Mirabal. Foto: Guilherme Santos/Sul21
Géssica Sá Oliveira (à direita) é uma das 100 mulheres ocupantes na Mirabal | Foto: Guilherme Santos/Sul21

Fernanda Canofre

Era por volta das 3h da manhã desta sexta-feira (25) quando um grupo de 100 mulheres chegou ao prédio nº 380, da Rua Duque de Caxias, no Centro de Porto Alegre. Nas primeiras horas da data que marca o dia internacional de combate à violência contra a mulher, elas abriram as portas do edifício para criar a Ocupação Mulheres Mirabal.

Assim como a data celebrada em Caribe e América Latina, a Ocupação comandada pelo Movimento de Mulheres Olga Benário, também é homenagem às três irmãs Mirabal – Patria, Minerva e María Teresa – assassinadas pela ditadura de Rafael Truijillo, na República Dominicana, em 1960. Os corpos das três irmãs – que já haviam sido presas e torturadas pelo governo – foram atirados em um penhasco, dentro de um carro, para simular um acidente.

Nas janelas do prédio onde funcionou por mais de 20 anos o Lar Dom Bosco, um orfanato coordenado pela Congregação Salesiana, as mulheres da Mirabal colocaram flores para marcar sua presença. Ali, elas já são mais de 100. Mulheres de todas as áreas, com e sem formação acadêmica, estudantes e trabalhadoras, de todas as idades. O orfanato teria encerrado atividades há pouco mais de um ano devido à falta de verbas para se manter.

A ocupação foi inspirada em uma ação também comandada pelo Olga Benário, de Minas Gerais. No dia 08 de março, Dia da Mulher, mulheres do movimento iniciaram uma ocupação batizada de Tina Martins, reivindicando um Centro de Referência para Belo Horizonte. No final, o Estado foi obrigado a ceder um espaço físico para mulheres vítimas de violência.

“Essa ocupação é uma ocupação que vem nesse sentido, de reivindicar um espaço nessa cidade que seja um Centro de Referência à mulheres vítimas de violência. A gente tem na cidade pouquíssimas estruturas para atender essa demanda. A gente tem um centro de referência e uma casa de abrigo que conseguem atender 48 vagas, sendo que a gente tem na cidade cerca de 50 denúncias por dia”, explica Géssica Sá Oliveira, estudante de Farmácia e uma das ocupantes da Mirabal.

As mulheres do movimento também querem levantar com a ocupação a questão das dificuldades encontradas por vítimas de violência doméstica nas redes de apoio do Estado.

“A própria denúncia é complicado porque existe uma falta de preparo dos profissionais para receber as mulheres nessa situação. As mulheres não saem de casa porque não querem: elas não saem porque não tem condições econômicas de pagar aluguel, porque tem filhos e não tem onde deixá-los”, diz Géssica.

Ela conta ainda que, durante a manhã, mulheres em situação de rua já estiveram no local em busca de vagas e relatando dificuldades em encontrar abrigo em Porto Alegre. Uma delas precisava de atendimento médico, a outra queria apenas um prato de comida, segundo Géssica.

25/11/2016 - PORTO ALEGRE, RS - Ocupação Mulheres Mirabal. Foto: Guilherme Santos/Sul21
Ocupação Mulheres Mirabal. Foto: Guilherme Santos/Sul21

Resisitir nas primeiras 24 horas

A conversa com as mulheres de dentro da ocupação acontece pelas janelas. Debruçadas no parapeito, elas explicam que pelo menos durante as primeiras 24 horas não podem deixar ninguém entrar ou sair, para evitar qualquer tipo de reintegração forçada de posse.

A Brigada Militar esteve no prédio pela parte da manhã para registrar boletim de ocorrência e nomes das ocupantes. O advogado que representa a Congregação dos Irmão Salesianos – proprietários do prédio – também esteve no local para conversar com o movimento. “A princípio prometeram de que tentariam dialogar sem envolver Brigada Militar ou Judiciário”, relata Géssica.

Nem a prefeitura, nem o governo do Estado mandaram representantes ao local ainda.

Uma reunião entre a congregação e as mulheres da ocupação deve ser marcada na semana que vem para definir o que pode ser feito.

Enquanto isso, a ideia da ocupação é colocar o prédio à disposição de mulheres que precisam dele o quanto antes. As mulheres pretende colocar em funcionamento no local assistência jurídica gratuita, assistência psicológica, espaço para dormir, tomar banho e alimentação.

As ocupantes da Mirabal passaram toda a sexta-feira tratando da limpeza do local para garantir a abertura das portas em breve. O espaço poderia receber cerca de 60 mulheres imediatamente, segundo elas.

“A gente sabe que se não tiver essa ocupação aqui, não vai ter negociação. É um espaço que não está cumprindo sua função social, que poderia abrigar aqui mais de 60 mulheres. Isso é urgente, isso é para hoje, não podemos mais esperar”, afirma Géssica. “Estamos abertas para o diálogo. Não especificamente com a Igreja, porque a gente sabe que não é a Igreja quem deveria tomar as demandas da cidade, mas com o Estado, com o município, para mostrar que as mulheres não estão contentes e precisamos fazer alguma coisa a respeito”.

25/11/2016 - PORTO ALEGRE, RS - Ocupação Mulheres Mirabal. Foto: Guilherme Santos/Sul21
Foto: Guilherme Santos/Sul21

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