Cidades|z_Areazero
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12 de junho de 2016
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12:23

Grupo distribui comida quente e agasalhos a pessoas em situação de rua

Por
Sul 21
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Na noite da última quarta-feira, grupo distribuiu carreteiro aos moradores de rua do viaduto da Borges de Medeiros| Foto: Guilherme Santos/Sul21
Na noite da última quarta-feira, grupo distribuiu carreteiro aos moradores de rua do viaduto da Borges de Medeiros| Foto: Guilherme Santos/Sul21

Jaqueline Silveira*

O inverno gaúcho não chegou oficialmente pelo calendário, mas o frio se adiantou e vem sendo constante no Rio Grande do Sul já há alguns dias. Em certos cantos do Estado, inclusive, os termômetros já registraram índices negativos. Na Capital, o inverno castiga principalmente a população em situação de rua que dorme ao relento e conta, muitas vezes, só com jornais e papelões para amenizar o frio. Mas, pelo menos uma vez por semana, um prato de comida quente e agasalhos distribuídos por um grupo de pessoas amenizam o sofrimento na região central.

A última quarta-feira (8) foi um desses dias de distribuição de alimentos a moradores que se abrigam debaixo do viaduto da Avenida Borges de Medeiros e também na Praça da Matriz, no centro de Porto Alegre, lugar de concentração de muitas pessoas que dormem ao relento. A entrega é feita com o suporte de três a quatro carros e o grupo, de 15 a 20 pessoas, divide-se para passar pelos locais e fazer a distribuição da comida e dos agasalhos.

Assim que os veículos identificados com adesivos do projeto estacionaram, rapidamente uma fila se formou para receber a alimentação. Na ocasião, o cardápio era um carreteiro quente. “Isso significa um monte”, resumiu Marcelo Silva, sobre o prato de comida que segurava nas mãos. O vício em cocaína o afastou dos familiares e levou às ruas. Há um ano, Marcelo diz que deixou as drogas e trabalha num depósito de reciclagem, mas o dinheiro que ganha não é suficiente para se manter. Às vezes, conta ele, dorme no albergue municipal, porém, quando chega e o abrigo já está lotado, passa a noite em uma pensão.

Alguns que recebem a comida até têm trabalho, mas o que ganham não é suficiente ou estão desempregagos| Foto: Guilherme Santos/Sul21
Alguns que recebem a comida até têm trabalho, mas o que ganham não é suficiente ou estão desempregados| Foto: Guilherme Santos/Sul21

A exemplo de Marcelo, há outros com emprego, inclusive na Prefeitura, como os trabalhadores que fazem a coleta do lixo da cidade, que vão pegar a comida doada, em virtude de o salário não ser suficiente para todas as refeições. Desempregada, Indianara Soares mora com o marido e três cachorros em uma barraca, no Parque da Harmonia, e também entrou na fila para pegar o carreteiro. “Acho legal”, comenta ela, sobre a solidariedade do grupo que oferece a alimentação.

Tanto Indianara quanto Marcelo entraram também na fila para receber agasalhos. Moletons, meias, calças foram algumas das peças distribuídas para amenizar o frio daqueles que passam a noite sob viadutos ou em condições de moradia não muito superiores. Um deles chegou atrasado e já não havia mais agasalho para ser doado. “A hora que tiver, guarda um tenizinho para eu trabalhar”, pediu ao grupo.

“É muito satisfatório ver o sorriso no rosto deles ao receberem um blusão quente, um cobertor”, afirma Silvani Tarasconi, uma das voluntárias que participou da distribuição da comida e de agasalhos na noite de quarta, lembrando de um dia em que um “senhor de bermuda” chegou com frio para pegar o agasalho.

Além do carreteiro, os moradores de rua receberam agasalhos para amenizar o frio dos últimos dias| Foto: Guilherme Santos/Sul21
Além do carreteiro, os moradores de rua receberam agasalhos para amenizar o frio dos últimos dias| Foto: Guilherme Santos/Sul21

Para manter o projeto social, enfatiza a jornalista Juliana Campani, uma das idealizadoras da iniciativa, conta com doações de alimentos não perecíveis e também há uma conta para o depósito de dinheiro, que é usado para comprar o gás, a carne e as embalagens para servir a alimentação. Em média, são oferecidas 200 refeições por semana com gasto de cerca de R$ 150. No início, segundo ela, era servida só a sopa, depois, o grupo passou a fazer “comida de mais sustância”, como carreteiro, feijão e massa.

Ajuda das redes sociais

O projeto tem uma página no Facebook com as informações de como fazer as doações e também se juntar ao coletivo. Foi, inclusive, pelas redes sociais que a iniciativa ganhou novos voluntários. “Na verdade, juntei amigos no meu Facebook e, depois, criei uma página e perguntei quem estava a fim de fazer (o sopão), as pessoas foram demonstrando interesse, o grupo foi aumentando. Somos um coletivo”, relembra Juliana sobre a adesão ao projeto, a partir da divulgação nas redes sociais. “O nosso grupo está crescendo muito”, completa Silvani.

Grupo precisa de doações de alimentos não perecíveis para fazer a alimentação distribuída uma vez por semana| Foto: Guilherme Santos/Sul21
Grupo precisa de doações de alimentos não perecíveis para fazer a alimentação distribuída uma vez por semana| Foto: Guilherme Santos/Sul21

A alimentação que chega aos moradores de rua concentrados no Centro é distribuída entre 20h30 e 21h, mas começa a ser preparada pelo grupo bem antes, por volta das 17h30. Uma empresa cedeu o espaço, no Bairro Floresta, para eles cozinharem. Normalmente, a distribuição da comida e de agasalhos é registrada e divulgada na rede social numa espécie de prestação de contas para quem ajuda com doações e, ao mesmo tempo, uma forma de atrair novos ativistas. “Eles são extremamente gratos e educados, é bem legal fazer essa troca, ajuda a quebrar esses paradigmas e esses preconceitos que a gente carrega. Eles são invisíveis”, avalia Juliana, sobre o contato com a população em situação de de rua.

Manifestação em cartazes

Numa das ações mais recentes, o grupo fez uma atividade diferente com os moradores da rua: levaram cartazes e pediram que eles escrevessem frases sobre assuntos que gostariam que a sociedade tomasse conhecimento. A ideia, explica a jornalista, além de ajudá-los com agasalhos e alimentos, é fazer “uma mediação”, incentivando-os a falarem. As manifestações expressas nos cartazes revelaram desde sentimentos, como saudade de familiares, a angústia e as dificuldades de viver na rua, passando pelo envolvimento com as drogas, até opiniões políticas. “A rua é horrível”, “Eu não quero a volta da ditadura, eu quero uma democracia forte”, “Pessoal! Menos preconceito, mais humanidade” e “Todos nós somos escravos das drogas, desculpe sociedade” foram algumas das frases escritas pela população em situação de rua. “Eles sentem falta desse contato”, comenta Juliana.

Em uma das dsitribuições de comida, grupo levou cartazes e pediu que moradores escrevessem frases para a sociedade|Foto: Reprodução/Projeto Sopão
Em uma das distribuições de comida, grupo levou cartazes e pediu que moradores escrevessem frases para a sociedade|Foto: Reprodução/Projeto Sopão

O projeto social do sopão completa um ano neste mês e a data será comemorada no dia 15 em ritmo de festa junina com o “arraial solidário”, em um espaço cedido por uma cervejaria. Quem doar dois quilos de alimentos não perecíveis ganha um chope artesanal e os recursos arrecadados com a venda das comidas serão revertidas para o projeto. Mas, independentemente da festa, as doações de agasalhos e de alimentos podem ser feitas a qualquer momento, até porque o inverno só começa oficialmente no dia 21 de junho e promete muito frio pela frente. Mais informações na página do sopão ou pelo e-mail [email protected].

Prefeitura amplia vagas em albergues

Na tarde de sexta-feira (10), a prefeitura da Capital anunciou a ampliação das vagas nos abrigos municipais para a população em situação de rua devido às baixas temperaturas dos últimos dias. A Fundação de Assistência Social e Cidadania (Fasc) aumentou, até 30 de setembro, em 90 vagas nos três abrigos do município, dois deles mantidos por meio de convênio.

Os albergues funcionam de segunda a domingo, inclusive feriados, das 19h às 7h, e oferecem dormitórios, cuidados de higiene e alimentação e encaminhamentos à rede de saúde.


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