Cidades|z_Areazero
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14 de março de 2016
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18:46

Entidades apontam ilegalidades e pedem o rompimento do contrato de revitalização do Cais Mauá

Por
Luís Gomes
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14/03/2016 - PORTO ALEGRE, RS - Grupo realiza coletiva para debater irregularidades do projeto Cais Mauá e chamar para a Audiência Pública, na Assembleia Legislativa. Foto: Guilherme Santos/Sul21
Grupo realiza coletiva para debater irregularidades do projeto de revitalização do Cais Mauá. Em primeiro plano, Rafael Passos, do IAB-RS | Foto: Guilherme Santos/Sul21

Luís Eduardo Gomes

Representantes de entidades contrárias ao atual projeto de revitalização do Cais Mauá, conduzido pelo consórcio Cais Mauá do Brasil S.A., anunciaram nesta segunda-feira (14) que devem entrar em breve com uma ação para pedir o rompimento do contrato em razão de uma série de ilegalidade cometidas pelas empreendedores e por cláusulas contratuais e da licitação que não foram cumpridas. As entidades também pediram apoio a parlamentares estaduais e municipais para conduzir o processo de questionamento do projeto de revitalização.

Primeiro a falar na coletiva, o deputado estadual Tarcisio Zimmerman (PT) afirmou que a revitalização do Cais Mauá representa um desejo legítimo da população porto-alegrense, mas o projeto que está em discussão “corresponde mais aos interesses da especulação imobiliária”. Segundo ele, o projeto “não tem compromisso urbanístico e de integração da cidade com o seu rio”.

Ele salientou que, por iniciativa dos mandatos dos deputados Jefferson Fernandes (PT), Adão Villaverde (PT), Manuela D’Ávila (PCdoB), Pedro Ruas (Psol) e o seu, será realizada na próxima quarta-feira (16), às 18h30, uma audiência no Teatro Dante Barone, da Assembleia, para debater o tema, em que devem participar representantes das entidades que compõem o movimento a Cidade Que Queremos, do governo do Estado, da Prefeitura de Porto Alegre, de órgãos do judiciário e do consórcio responsável pelo projeto.

14/03/2016 - PORTO ALEGRE, RS - Grupo realiza coletiva para debater irregularidades do projeto Cais Mauá e chamar para a Audiência Pública, na Assembleia Legislativa. Foto: Guilherme Santos/Sul21
Deputado diz que projeto “surpreende pela ruindade” |Foto: Guilherme Santos/Sul21

O deputado disse que é “estranho” que o tema não tenha conseguido chamar a atenção da Assembleia Legislativa, uma vez que trata-se de um projeto do governo do Estado que tem questionamentos jurídicos e ambientais “bem consistentes. “Está longe de ser um projeto que representa uma vontade majoritária da população de Porto Alegre”.

Ele admitiu que não tinha grandes conhecimentos sobre o projeto de revitalização e que o andamento do processo, mesmo tendo passado pelos governos de Yeda Crusius (PSDB), Tarso Genro (PT) e Sartori (PMDB), foi praticamente ignorado pela Assembleia Legislativa, salvo raras exceções, como o ex-deputado Raul Pont (PT).

“Surpreende a quantidade de interrogações que pairam sobre o projeto”, afirma o deputado. Segundo sua avaliação, não há nenhuma questão resolvida em termos legais, financeiros, de mobilidade e de integração do bairro e da cidade com a área. “Fiquei surpreso com a ruindade do projeto. Não é razoável que, depois de tanto tempo, permaneçam tantas interrogações”, admitiu o deputado.

A advogada Jaqueline Custódio, representante do Cais Mauá de Todos, explicou que os movimentos contrários a este projeto de revitalização devem entrar em breve, mas ainda sem data definida, com uma nova ação na Justiça para pedir o rompimento do contrato assinado com o consórcio Cais Mauá do Brasil S.A – atualmente já há mais de uma ação em andamento questionando ilegalidades no processo e também do ponto de vista ambiental. Segundo ela, o consórcio e o projeto desrespeitam o que foi assinado em contrato, o que previa o edital de licitação para a obra e a própria lei de licitações.

Ela salienta que uma das barreiras imposta na licitação, que impediu a ampliação do número de interessados na concorrência, era de que o consórcio vencedor precisaria apresentar garantias financeiras na ordem de R$ 400 milhões para tocar a obra, o que ainda não foi apresentado pelo Cais Mauá S.A. Ela também lembrou que o Tribunal de Contas do Estado (TCE) já apurou diversas irregularidades no projeto e no andamento do licenciamento e que o Contadoria e Auditoria Geral do Estado (Cage) já pediu a aplicação de multas ao consórcio por não cumprimento do contrato, que não foram aplicadas.

14/03/2016 - PORTO ALEGRE, RS - Grupo realiza coletiva para debater irregularidades do projeto Cais Mauá e chamar para a Audiência Pública, na Assembleia Legislativa. Foto: Guilherme Santos/Sul21
Jaqueline Custódio diz que há uma série de ilegalidades cometidas no processo|Foto: Guilherme Santos/Sul21

Ela também questiona o fato de a composição societária do consórcio ter mudado diversas vezes desde que o contrato foi assinado, mas que elas não foram comunicadas corretamente à Superintendência de Portos e Hidrovias, gestora da área. Além disso, ela afirma que a empresa NGS, que entrou para o consórcio apenas em 2013 e atualmente é a sua principal integrante, é investigada pela Polícia Federal por fraudes em fundos de pensão.

“A gente está gestando uma nova ação popular que vai falar especificamente sobre o contrato. Pega três pontos, a alteração contratual, que a gente acaba não sabendo quem são as empresas que fazem parte do consórcio hoje; a gente tem a questão dos R$ 400 milhões, que até hoje não foram apresentadas as garantias e outras garantias do seguro, do prédio tombado, que foram apresentadas 400 dias depois do contrato ser iniciado. Essas três são as questões básicas que contrariam o edital de licitação, o próprio contrato, que prevê sanções e multas que não foram aplicadas, a própria lei de licitação 866 que também está sendo frontalmente violada, o que dá ensejo à ruptura do contrato”, afirma Jaqueline.

Rafael Passos, vice-presidente da seccional gaúcha do Instituto de Arquitetos do Brasil (IAB-RS), salientou que a contestação ao atual projeto de revitalização do Cais Mauá vem sendo realizada há anos, de forma voluntária, por entidades como o Cais Mauá de Todos e pelo IAB, mas que também é preciso que agentes públicos, como os deputados estaduais, passem a questionar o contrato. As entidades pedem que a AL instale uma CPI para investigar o processo de licitação, mas, para o deputado Tarcisio, seria difícil conseguir a adesão do número necessário de parlamentares porque não é um “tema que esteja sendo debatido”.

Passos também reclamou de falta de transparência do poder público que não deixa a população acessar informações sobre o andamento. No entanto, ele citou que o próprio secretário Municipal de Urbanismo de Porto Alegre, Valter Nagelstein (PMDB), em entrevista ao Jornal Já, no dia 7 de março, reconheceu que mudanças foram feitas no projeto, como a ampliação da área concedida ao consórcio para além do espaço originalmente licitado.

Ele ainda afirmou que o processo de licenciamento da obra, ainda sem prazo para iniciar, está sendo feito “totalmente na ilegalidade”, uma vez que os índices construtivos aprovados na época da licitação eram válidos apenas até o final de 2012 e que, a partir de 31 de dezembro daquele ano, a prefeitura tinha um prazo de 90 dias para encaminhar uma lei propondo a manutenção, alteração ou revogação dos índices, o que não foi feito até agora.

14/03/2016 - PORTO ALEGRE, RS - Grupo realiza coletiva para debater irregularidades do projeto Cais Mauá e chamar para a Audiência Pública, na Assembleia Legislativa. Foto: Guilherme Santos/Sul21
Vereador Sgarbossa questiona o projeto | Foto: Guilherme Santos/Sul21

O vereador Marcelo Sgarbossa (PT), afirmou que a população “quer sim utilizar o espaço” do Cais Mauá, “mas não da forma que está no projeto”. “Por que um shopping? Por que uma torre? O que se quer é um uso popular”, defendeu.

Paulo Guarnieri, vice-presidente da Associação de Moradores do Centro Histórico, também afirmou que, da forma como o projeto foi apresentado, os moradores do Centro temem que ele poderá trazer uma “concorrência desleal” à economia já existente, uma vez que propõe a instalação de lojas, restaurantes e hotéis, que são as principais atividades desenvolvidas no bairro atualmente. Ele ainda critica o fato de não terem sido apresentadas medidas de mitigação adequadas para contornar o fato de que o shopping e as torres poderiam levar 20 mil novos carros por dia à região.

As entidades querem que seja realizada uma nova licitação para o projeto aberta em que qualquer escritório de arquitetura possa participar, sem a necessidade de estar vinculado a um grupo que apresente garantias financeiras para as obras, e, posteriormente, um novo chamamento público para a realização das obras. “Esses 400 milhões, como todos sabem, foi impeditivo para muita gente”, afirmou.

Recentemente, o consórcio entregou o Estudo de Viabilidade Urbanística (EVU) para o início das obras, que está sendo analisado por diversas secretarias municipais e aguardando liberação para o início das obras. Na avaliação das entidades, este é o último momento para se buscar o rompimento do contrato. “Depois é muito mais difícil”, salientou Jaqueline.

14/01/2016 - PORTO ALEGRE, RS, BRASIL - Matéria sobre exposição de fotografias no barco Cisne Branco. tags: passeio, orla, guaíba, água, armazéns, cais mauá, revitalização, delta do jacuí, rio, lago, turismo, passeio, turistas, capital, guindastes, Foto: Guilherme Santos/Sul21
Foto: Guilherme Santos/Sul21

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