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16 de dezembro de 2015
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16:14

Audiência sobre habitação é interrompida por violência policial e duas detenções

Por
Sul 21
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Audiência sobre habitação é interrompida por violência policial e duas detenções
Audiência sobre habitação é interrompida por violência policial e duas detenções
Foto: Caroline Ferraz/Sul21
Truculência foi iniciada quando três jovens foram abordados pela BM | Foto: Caroline Ferraz/Sul21

Atualizada às 16h38
Débora Fogliatto

A audiência pública na Assembleia Legislativa para tratar das ocupações urbanas e terras indígenas e quilombolas foi interrompida repentinamente pela ação do 9º Batalhão da Brigada Militar, que chegou à Praça da Matriz durante o encontro. Os policiais inicialmente abordaram três jovens que chegavam à audiência, argumentando que teriam recebido denúncias de porte de drogas. Quando deputados e moradores que participavam da reunião foram intervir para evitar a detenção deles, foram vítimas de truculência por parte da BM.

O deputado Júnior Piaia (PCdoB) foi chamado pelos moradores das ocupações para intervir na situação e tentou dialogar com os policiais. “Questionei se havia motivo nesse momento para criar esse tumulto, ele disse que estava cumprindo ordens. Começaram a tentar levar preso outro indivíduo, disseram que ele não quis mostrar documentos”, contou.

| Foto: Caroline Ferraz/Sul21
Um advogado e um menor foram detidos | Foto: Caroline Ferraz/Sul21

Não aceitando as detenções, participantes da audiência, incluindo a vereadora Fernanda Melchionna (PSOL), protestaram contra a ação policial, o que foi respondido com spray de pimenta pela BM. O spray acertou tanto a vereadora quanto advogadas, uma assessora parlamentar e manifestantes presentes. “Quando as pessoas se afastaram um pouco, eu fui falar com o policial responsável e ele disse pra mim: ‘o senhor se afaste que nós vamos baixar o cassetete'”, relatou Piaia. A partir daí, a Brigada começou a investir contra as pessoas presentes, incluindo uma integrante do Movimento de Luta nos Bairros (MLB), que foi agredida por um policial com o mastro da bandeira que carregava.

Duas pessoas foram detidas, sendo um menor de idade e o advogado Antônio Sanzi, que tentou mediar a situação. Após os protestos e a intervenção dos deputados Piaia e Pedro Ruas (PSOL), os brigadianos se retiraram. Os deputados acompanharam os policiais até o 9° Batalhão para relatar o acontecido, o que os brigadianos prometeram apurar. A audiência seguiu enquanto os participantes esperavam o retorno dos advogados, deputados e pessoas detidas.

16/12/2015 - PORTO ALEGRE, RS, BRASIL - Ativistas são presos em frente a ALRS | Foto: Caroline Ferraz/Sul21
Vereadora e deputado tentam dialogar com a BM após truculência | Foto: Caroline Ferraz/Sul21

Tentativa de barrar despejos

Antes da ação da BM, a audiência encaminhou o pedido de suspensão das reintegrações de posse das ocupações de Porto Alegre por um ano, para que se busque alternativas caso a caso, além do fortalecimento do Grupo de Trabalho do governo do Estado que trata de conflitos fundiários e a identificação de prédios e áreas que não cumpram sua função social. A reunião foi realizada a pedido dos deputados Juliano Roso (PcdoB) e Pedro Ruas (PSOL). “Não pode ocorrer despejos em um momento em que não existem políticas concretas para dar condições de habitação à população”, defendeu Roso. “As autoridades acham que quem luta para ter onde morar só incomoda”, completou Ruas.

O Secretário de Obras, Saneamento e Habitação Gerson Burmann disse que o Estado “concorda que habitação é um direito”, mas apontou que o poder público tem tido dificuldades financeiras. Mesmo assim, contou que recentemente foi dada a posse de uma área ocupada para 86 famílias em Araricá e que está havendo negociações de áreas no Morro Santa Tereza. “Esse tema é complexo, é difícil. Não queremos que sejam interrompidos os recursos do Minha Casa, Minha Vida. Aqui em Porto Alegre serão criadas 400 moradias no bairro Tristeza, são ações fundamentais para combatermos o problema da moradia, que consideramos sim um direito”, afirmou. O representante do Departamento Municipal de Habitação (Demhab) seguiu na mesma linha de atribuir a solução ao Minha Casa, Minha Vida.

| Foto: Caroline Ferraz/Sul21
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O programa, porém, não consegue acompanhar a necessidade de habitações existente tanto na cidade quanto no país, conforme destacou a defensora pública Adriana Scheffer Nascimento. “Em 2009, havia pouco mais de 50 mil famílias sem moradia e desde então tivemos 2 mil unidades do MCMV. Mesmo se o número fosse o mesmo, ainda teríamos muitas sem moradia. Mas ainda por cima tivemos um aumento”, contou. Para ela, é importante que seja criada uma alternativa para as famílias, além do congelamento dos despejos. A integrante do Movimento dos Trabalhadores Sem Teto (MTST) Cláudia Favaro concorda: “tivemos o maior programa habitacional da história desse país, mas não atacaram o déficit habitacional. Continuamos sem casa para morar”.

A rapidez com a qual o Judiciário age para pedir reintegrações, mas não para garantir a função social da propriedade, foi criticada por Fernanda Melchionna. “Há imóveis do Estado que estão vazios e que poderiam funcionar para habitação”, sugeriu. O vereador Engenheiro Comassetto (PT) pediu que seja aplicado o Estatuto das Cidades. “Quero propor que a gente faça um conjunto de leis para garantir as terras públicas para moradia, com IPTU progressivo para os vazios urbanos”, acrescentou.

Intimidação na Lanceiros Negros

Antes mesmo de acontecer a agressão ao lado de fora da Assembleia, a coordenadora do MLB Nana Sanches relatou haver intimidação por parte da Brigada Militar na ocupação Lanceiros Negros. “Dia sim, dia não, eles passam com viaturas na frente do prédio, tentando nos coagir, acordando e assustando crianças”, contou, acrescentando que “existem grileiros sim, mas a grande máfia dessa cidade é a especulação imobiliária, que dá dinheiro para campanha de prefeito”.

Ano passado, após longa discussão na Câmara de Vereadores, foi aprovada uma lei que transformava 14 ocupações em áreas especiais de interesse social (AEIS), a qual, enquanto vigorou, impediu três reintegrações. No entanto, a Prefeitura conseguiu liminar na Justiça determinando como inconstitucional, o que foi criticado nesta quarta-feira por Juliano Fripp, do Conselho Regional por Moradia Popular. “Essa lei era importante. Mesmo suspensa, conseguiu impedir a reintegração da São Luís. Mas agora não conseguimos mais usá-la”, lembrou.

| Foto: Caroline Ferraz/Sul21
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Demarcação de terras

Representantes dos povos indígenas também estiveram presentes na audiência e criticaram principalmente o projeto de lei 31/2015, de autoria do deputado Elton Weber (PSB), que determina a garantia de posse de terras para agricultores com até 300 hectares, proibindo a demarcação de áreas indígenas e quilombolas nesses territórios. “As terras de nossos antepassados são nossos direitos. Ali tem ossos de índios, eles morreram por seus direitos e nós queremos de volta”, disse o cacique Valdomiro Vergueiro, do Morro do Osso.

O deputado Jéferson Fernandes (PT) se dirigiu ao presidente da Comissão de Direitos Humanos, Catarina Paladini (PSB), que é do mesmo partido de Weber, que vote contra o PL. “Esse povo está com frequente ameaça à extinção se não tiver o direito ao acesso à terra. Esse PL não é pouca coisa”, afirmou.

Confira mais fotos:

16/12/2015 - PORTO ALEGRE, RS, BRASIL - Audiência Pública discute a situação das ocupações no estado e das políticas por moradia | Foto: Caroline Ferraz/Sul21
16/12/2015 – PORTO ALEGRE, RS, BRASIL – Audiência Pública discute a situação das ocupações no estado e das políticas por moradia | Foto: Caroline Ferraz/Sul21
16/12/2015 - PORTO ALEGRE, RS, BRASIL - Audiência Pública discute a situação das ocupações no estado e das políticas por moradia | Foto: Caroline Ferraz/Sul21
16/12/2015 – PORTO ALEGRE, RS, BRASIL – Audiência Pública discute a situação das ocupações no estado e das políticas por moradia | Foto: Caroline Ferraz/Sul21
16/12/2015 - PORTO ALEGRE, RS, BRASIL - Audiência Pública discute a situação das ocupações no estado e das políticas por moradia | Foto: Caroline Ferraz/Sul21
16/12/2015 – PORTO ALEGRE, RS, BRASIL – Audiência Pública discute a situação das ocupações no estado e das políticas por moradia | Foto: Caroline Ferraz/Sul21
16/12/2015 - PORTO ALEGRE, RS, BRASIL - Ativistas são presos em frente a ALRS | Foto: Caroline Ferraz/Sul21
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16/12/2015 - PORTO ALEGRE, RS, BRASIL - Ativistas são presos em frente a ALRS | Foto: Caroline Ferraz/Sul21
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16/12/2015 - PORTO ALEGRE, RS, BRASIL - Ativistas são presos em frente a ALRS | Foto: Caroline Ferraz/Sul21
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16/12/2015 - PORTO ALEGRE, RS, BRASIL - Ativistas são presos em frente a ALRS | Foto: Caroline Ferraz/Sul21
16/12/2015 – PORTO ALEGRE, RS, BRASIL – Ativistas são presos em frente a ALRS | Foto: Caroline Ferraz/Sul21
16/12/2015 - PORTO ALEGRE, RS, BRASIL - Ativistas são presos em frente a ALRS | Foto: Caroline Ferraz/Sul21
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