Luís Eduardo Gomes
o 4º Distrito é uma área da região central e da zona norte de Porto Alegre que engloba, principalmente, os bairros Floresta, Navegantes, São Geraldo, Humaitá e Farrapos. Antigo polo industrial e comercial da Capital, com o passar do tempo, foi sendo abandonada pela maior parte das indústrias e, consequentemente, pela população. Ao longo das últimas décadas, a Prefeitura já teve inúmeras ideias e desenvolveu diversos projetos para a área, mas poucas melhorias de fato saíram do papel. Enquanto isso, a região continua convivendo com o abandono, marcado especialmente por armazéns vazios. Agora, inspirada em renovações como a que aconteceu na cidade Barcelona, na Espanha, a Prefeitura está apostando que atrair empresas com foco na inovação irá ajudar a recuperar a área.
Em junho, uma comitiva formada por Câmara de Vereadores, secretários municipais e empresários dos setores de tecnologia da informação, saúde, ensino e pesquisa e da construção civil visitaram a cidade espanhola para conhecer o distrito 22@, antiga área industrial da cidade que passou por uma renovação e se tornou um pólo de inovação e empreendedorismo.
Nesta semana, o presidente do Escritório de Crescimento Econômico da prefeitura de Barcelona e responsável por desenvolver o projeto de revitalização do 22@ durante 20 anos, Josep Piqué, visitará Porto Alegre e conversará com os vereadores e com o prefeito de Porto Alegre, José Fortunati, sobre o exemplo de Barcelona e como ele pode inspirar o projeto de revitalização do 4º distrito. Para os membros da comitiva, há, inclusive, semelhanças entre as duas cidades.
“22@ era uma área industrial e, com a crise, vários pavilhões ficaram abandonados”, afirma Mauro Pinheiro (PT), presidente da Câmera de Vereadores de Porto Alegre e integrante da comitiva que visitou Barcelona em junho.
“O momento de Barcelona era muito parecido com o que a gente vive hoje no Brasil. A Espanha estava em crise e Barcelona se salientou na região europeia justamente por esse movimento. Destaca-se de uma situação econômica negativa e passa a ser positiva. E, vendo que tinha uma iniciativa muito pró-ativa, as empresas fazem questão de se instalar lá”, compara a arquiteta Maria Alice Michelucci, assessora técnica da secretaria da Fazenda, que esteve em Barcelona no início de outubro.
O professor Jorge Audy, Pró-Reitor de Pós-Graduação e Pesquisa e presidente da Associação Internacional de Parques Tecnológicos e Áreas de Inovação (Iasp) para a América Latina – entidade da qual Piqué é vice-presidente mundial -, afirma que a revitalização do 22@ em Barcelona passou por um processo em que a cidade espanhola buscou se posicionar como uma chamada “cidade inteligente”, com foco na inovação e no empreendedorismo.
Audy explica que o conceito de cidade inteligente está relacionado ao aproveitamento da tecnologia para melhorar a vida das pessoas. “O conceito está associado à criação de ambientes vivos, à aplicação de inovações cientificas e tecnologias, uso das mais modernas tecnologias para a melhoria da qualidade de vida das pessoas. Isso se reflete no jeito que tu tratas da água, do lixo, da segurança, de todas as dimensões da cidade”, afirma Audy, defendendo que esse modelo seja trazido também para Porto Alegre.
Como aprender com Barcelona?
O 4º Distrito de Porto Alegre abrigava grandes indústrias, que, ao longo das décadas, com a transformação da economia de Porto Alegre, foram saindo da área, deixando galpões e armazéns para trás, abandonados, o que acabou levando à saída de moradores e do comércio. “Por muito tempo, houve grandes empresas ali instaladas, de uma indústria de um porte que hoje não funciona mais”, diz Michelucci. “A economia de Porto Alegre hoje é 85% serviços. O que se observa é que as indústrias, que eram a base da economia da cidade, começam a sair da região para outros municípios. Então, aquele local não comporta a ampliação da sua atividade e a própria indústria se modifica. Esse aspecto é muito parecido com a situação de Barcelona”.
Um desafio histórico enfrentado pelos inúmeros projetos de revitalização para o 4º Distrito foi o de criar condições para transformar a região do ponto de vista econômico. “Não adianta só ter revitalização sem ter desenvolvimento econômico, porque aí morre”, diz o secretário Municipal da Fazenda, Jorge Tonetto. “Projetos urbanísticos nós temos muitos. O que está demonstrado nesse projeto de Barcelona é que não basta um projeto de urbanismo, isso é uma das etapas. Na realidade, é necessário uma plataforma de negócios e por isso que a Prefeitura tem que dar uma infraesteutura, não só urbanística, mas capaz de receber novas tecnologias”, complementa Michelucci.
Por outro lado, o próprio secretário Tonetto salienta que, para um projeto de revitalização dar certo, também é necessário pensar em projetos que levem em conta o viés urbanístico. “Também não adianta o que teve no Porto Digital, em Recife. Teve concentração de empresas, mas sem um padrão urbanístico. As pessoas trabalham e vão embora. Isso mata a cidade. O desafio é ser concomitante”.
O vereador Mauro Pinheiro cita que, para atrair investimentos para a região, a prefeitura de Barcelona tomou uma série de medidas. Uma grande avenida foi aberta na região, órgãos públicos municipais foram levados para a área, bem como universidades, também foram mudados os índices da construção civil para permitir a instalação de prédios mais altos, ao mesmo tempo que se abria espaço no chão para as obras da avenida, mas também para praças, ciclovias, áreas de convivência. As mudanças estruturais incluíram ainda a melhoria de serviços de internet na área.
Ele defende algo semelhante para Porto Alegre e diz que, mesmo sendo de oposição ao atual governo municipal, irá trabalhar para incentivar projetos do tipo na cidade. “Se nós ficarmos em uma disputa ideológica, nós não vamos conseguir recuperar o 4º Distrito. Mas, claro, tem que ver o que não fira a ideologia de ninguém”, salienta.
Para o professor Audy, é essencial que o projeto de revitalização do 4º distrito seja focado em dois eixos: a integração de todos os atores da cidade na construção de uma visão de futuro, onde inovação e o empreendedorismo sejam eixos centrais do crescimento econômico de Porto Alegre, e uma percepção de que esses dois fatores são preponderantes para colocar que a cidade possa “viver na plenitude da sociedade do conhecimento que caracteriza esse início do século 21”. Segundo ele, dentro dessa ideia, a implementação de estruturas físicas seria menos importante do que os conceitos a serem concebidos sobre o destino que a cidade e, no caso mais específico, a região devem ter.
A ideia da Prefeitura de Porto Alegre é justamente atrair empreendimentos para desenvolver a área. Segundo o secretário Tonetto, o plano é focar em dois segmentos pelos quais, em sua avaliação, a cidade é reconhecida hoje: saúde e teconologia da informação. Tonetto explica que a cidade trabalha com o conceito de criar clusters, isto é, concentrações de empresas de um mesmo setor.
“Nós somos o segundo polo de saúde do país. Temos três hospitais universitários. Temos o health cluster, composto por quatro hospitais. 27% do Orçamento da Prefeitura é para a Saúde. Então, saúde é o nosso negócio”, diz.
“Porto Alegre já está entre as três maiores cidades em termos de empresas de TI do país. Temos um diferencial, o TecnoPuC, que já quase não tem espaço para criar. Nossa ideia é junto com TecnoPuc, Ufrgs, Assespro-RS (Associação das Empresas Brasileiras de Tecnologia da Informação), Softul (Associação Sul-Rio-Grandense de Apoio ao Desenvolvimento de Software), montar também um cluster de TI no 4º distrito, principalmente voltadas para smart city, para ter impacto na vida do cidadão”.
Segunto Tonetto, a Prefeitura planeja criar uma lei que conceda incentivos fiscais para as empresas se instalarem ali, renovar a iluminação e criar soluções de mobilidade para a área.
Piqué deve chegar à cidade no dia 13, quando participará de atividades na PUC. No dia 14, a partir das 18h30, ele irá falar da experiência de Barcelona na Câmara de Vereadores, em evento aberto ao público. No dia seguinte, se reunirá com o prefeito José Fortunatti e outras autoridades locais.
