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18 de julho de 2019
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16:15

Prefeitura de Porto Alegre decide demolir prédio que abrigou a Ocupação Baronesa

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Sul 21
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Além de demolir o prédio, famílias que estavam acampadas na calçada ao lado mesmo, foram removidas. (Foto: Alice de Oliveira Martins)

Marco Weissheimer

A Prefeitura de Porto Alegre decidiu demolir o antigo casarão localizado na esquina das Ruas Baronesa do Gravataí e 17 de junho, que abrigou a Ocupação Baronesa. A demolição do imóvel ocorreu no início da manhã desta quinta-feira (18). Em nota, a Prefeitura afirmou que uma vistoria realizada por técnicos da Secretaria da Infraestrutura e Mobilidade e pela Defesa Civil, no dia 1° de julho, apontou que o teto do prédio e as estruturas internas apresentavam risco de desabamento. “A recomendação dos técnicos do Município foi a demolição dos imóveis, cercamento do terreno e indicação para permuta da área”, diz ainda a nota.

Leia mais: Prefeitura retira moradores que voltaram à ocupação Baronesa. “Voltamos pra cá por causa do frio”

“Vieram fazer a demolição para não permitir mais o nosso acesso à calçada. Disseram que a gente estava obstruindo o passeio público”, disse Alice de Oliveira Martins, que milita na luta por moradia há mais de dez anos. Há pouco mais de uma semana, no dia 10 de julho, integrantes da Ronda Ostensiva Municipal de Porto Alegre (Romu) e do pelotão de choque da Brigada Militar, retiraram um grupo de 14 pessoas que estava abrigado no imóvel. O casarão, que estava abandonado, foi ocupado no dia 28 de março por um grupo de dez famílias, e foi alvo de uma reintegração de posse no início de julho. Os moradores disseram que voltaram ao prédio por causa do frio que se abateu sobre Porto Alegre na última semana. Participavam do grupo duas famílias que foram despejadas do abrigo municipal da prefeitura por falta de pagamento por parte do Executivo. Após serem removidas do prédio, as famílias montaram um pequeno acampamento na calçada ao lado do mesmo, que também foi destruído na manhã desta quinta.

Agora, área vai ficar isolada e as famílias que estavam ali não terão mais acesso à calçada. (Foto: Alice de Oliveira Martins)

“Chegaram aqui no início da manhã com um grupo da Romu e começaram a demolir o prédio. Recolheram nossas coisas e colocaram em um caminhão, menos os itens que, segundo eles, caracterizavam acampamento. Tivemos que negociar para que as pessoas pudessem manter os seus pertences. Agora, a área vai ficar isolada e as famílias que estavam ali não terão mais acesso à calçada”, relatou Alice Martins. A demolição, disse ainda, ocorreu menos de uma semana depois de a Prefeitura informar aos moradores que o Departamento Municipal de Habitação (DEMHAB) havia solicitado a posse do prédio para um projeto habitacional.

“Na sexta-feira da semana passada, às 14 horas, sentamos com a Secretaria de Planejamento e Gestão quando nos foi informado que o DEMHAB havia solicitado a posse do imóvel para habitação. Menos de uma semana depois, eles vieram aqui pra demolir o prédio. É assim que o poder público reage à nossa luta, com violência e truculência. Esse episódio mostra mais uma vez que o genocídio de pessoas pobres, negras e indígenas ocorre de muitas formas, seja pela violência direta, seja pela falta de políticas públicas. Se as pessoas não têm moradia, vão para a rua, adoecem e acabam morrendo. Mas eles se enganam se acham que vamos desistir. A nossa luta não é pelo prédio em si, mas pela terra e a disputa judicial vai continuar”, garantiu Alice.

Na hora da ação de demolição, dez pessoas adultas estavam no acampamento instalado na calçada do prédio, informou. Durante o dia, as crianças vão para a escola e à noite vão para a casa de apoiadores do movimento. “O que deixou a Prefeitura mais irritada é que o movimento agregou as pessoas que o poder público havia expulsado do abrigo. Essas duas famílias tem bebês de cinco meses e foram expulsas do abrigo porque a prefeitura não estava pagando o aluguel ao proprietário do prédio. Ou seja, o mesmo Estado que havia abrigado essas famílias as expulsou do abrigo”, assinalou ainda Alice Martins. Após serem expulsas da calçada, as famílias decidiram permanecer no entorno da área e decidirão ao longo do dia o que farão agora.

Segundo a Prefeitura, técnicos da Fundação de Assistência Social (Fasc) realizaram a “retaguarda, abordagem e acompanhamento” das cinco famílias que estão no local. Ainda segundo a Prefeitura, elas “não fazem parte da Ocupação Baronesa”. “Equipes da Fundação estiveram dias antes e reforçaram a oferta dos serviços como abrigos, albergues, Centros Pop. Para as dez famílias que estavam na Ocupação Baronesa, foram ofertados os serviços da Fasc e auxílio moradia. Três famílias já estão usando o benefício em casa alugada. Uma vai ingressar na moradia no próximo mês, e três delas, a Fundação está aguardando a indicação do endereço do imóvel para o aluguel, que deve ser entregue por parte dos usuários para o pagamento. E três famílias não solicitaram o auxílio”, afirmou o Executivo.

Demolição iniciou às 8 horas da manhã desta quinta. (Foto: Alice de Oliveira Martins)

Sindicato dos Arquitetos repudia demolição

O Sindicato dos Arquitetos no Estado do Rio Grande do Sul (Saergs) divulgou nota repudiando a ação da Prefeitura de Porto Alegre na manhã desta quinta-feira  Segundo a diretora do Saergs, Karla Moroso, “o fato é lamentável visto que o prédio, apesar de não ser inventariado como patrimônio histórico, tem valor arquitetônico pois é um projeto de 1926, executado pela Prefeitura para atender o direito à moradia dos brigadianos, além de fazer parte da memória e da história da capital, em especial daquele território que conta ainda com a presença de quilombos. “O que está em jogo é o direito à moradia para as famílias que habitavam a Baronesa e que agora estão nas ruas, sem lar, destacou.

“Destruir a Baronesa é, acima de tudo, uma inversão de valores”, acrescentou a diretora do sindicato. “É deixar de lado a memória da cidade para violar ainda mais o direito humano à moradia”. A presidente do Saergs, Maria Teresa Peres de Souza, afirmou que o sindicato já havia se manifestado contra o despejo das famílias e, agora, o cenário se agravou de maneira preocupante.


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