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13 de fevereiro de 2019
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10:10

Governo Leite já teria votos para retirar exigência de plebiscito para privatizações

Por
Luís Gomes
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Governador Eduardo Leite defendeu a retirada da obrigatoriedade do plebiscito em sessão da Assembleia no dia 5 de fevereiro | Foto: Joana Berwanger/Sul21

Luís Eduardo Gomes

Em 5 de junho de 2018, o governo de José Ivo Sartori (MDB) sofreu a sua maior derrota na Assembleia Legislativa ao perder, por 29 a 23, a votação do projeto que autorizaria a realização do plebiscito sobre a venda das estatais CEEE, Sulgás e CRM concomitantemente às eleições gerais de outubro passado. Na última quarta-feira (6), o governador Eduardo Leite (PSDB) retomou o processo de privatização ao reencaminhar à Casa um projeto solicitando a extinção da obrigatoriedade da realização de plebiscito para a venda das estatais, a PEC (Proposta de Emenda Constitucional) 272.

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Apesar de ser o desejo inicial do governo Sartori, a extinção do plebiscito sequer conseguiu ser votada na legislatura passada, pois o governo Sartori nunca conseguiu contar com os pelo menos 33 votos necessários para aprovação da matéria. Com a renovação de mais da metade do parlamento gaúcho, a situação parece ter mudado de figura.

O PSDB conta apenas com quatro deputados, quatro a menos do que os oito MDB durante o governo Sartori, mas, se forem somados todos os votos de partidos que compõe a base aliada do governador Leite (além do PSDB, PTB, PP, PSB, PR, PRB, SD, DEM, PSL, PPS, PODEMOS e PSD) e o independente Novo — entusiasta de privatizações –, o governo poderia chegar a até 42 votos favoráveis.

Nos bastidores, o PSDB contabiliza pelo menos 36 votos favoráveis, mas o líder do governo na Assembleia, o deputado Frederico Antunes (PP) diz que não é possível cantar vitória antes da hora e usa uma analogia futebolística para explicar a abordagem para a questão. “Está jogando um time grande, com uma grande formação, atletas renomados, entra em campo com uma grande vantagem para poder colocar um placar farto, e perde. Aí depois, no vestiário, alguém começa a imaginar porque perdeu. ‘Não devíamos ter feito isso e aquilo’. Nós estamos fazendo contrário, tentando fazer tudo que seja necessário e suficiente para esclarecimentos e para darmos certeza na hora da deliberação dos parlamentares”, diz Antunes.

Líder do governo na AL, Frederico Antunes (PP) adota precaução ao falar sobre aprovação da PEC 272 | Foto: Joana Berwanger/Sul21

Ele afirma que a estratégia do governo para garantir a aprovação da PEC é dialogar com os deputados e com a sociedade, destacando que acredita em resultado positivo porque o governador Leite, durante a campanha, assumiu o compromisso de reverter as dificuldades estruturais do RS e, portanto, contaria com a chancela das urnas. “A sociedade aprovou. Quem não votou nele votou no Sartori, que também iria dar continuidade ao que tentou fazer”, diz.

O artigo da Constituição que exige a obrigatoriedade da realização de plebiscito para venda das estatais foi aprovado pela AL-RS em 2002, no governo de Olívio Dutra (PT). Na ocasião, o próprio Antunes, então em seu primeiro mandato, votou a favor da exigência, aprovada por unanimidade. Ele justifica a mudança de posição com o argumento de que todos podem mudar de ideia ao longo da vida. “A CEEE deixou de estar como era antes, porque diminuiu a qualidade do serviço, não está pagando o que deveria pagar e os investimentos não estão sendo feitos. Então, ela pode sim estar à disposição para outra mão administrá-la. É essa que convicção que eu tenho hoje e não tinha na época. Não tem outro caminho, temos que entregar alguns aneis”, afirma.

O líder do governo salienta que a PEC 272 não trata ainda da privatização destas empresas e que, se aprovada a retirada da obrigatoriedade do plebiscito, aí sim o governo deve encaminhar um projeto nesse sentido para ser discutido na Casa.

Apresentada na quarta-passada, a PEC 272 deve cumprir um prazo de 15 dias após sua publicação no Diário Oficial antes de ser encaminhada para análise da Comissão de Constituição e Justiça da Assembleia, que terá então 45 dias para votar sua admissibilidade. Em caso de aprovação, terá 10 dias para ser analisada por comissões de mérito. Passado esse período, está apta para entrar na Ordem do Dia de votações na Assembleia, quando precisará ser aprovada em dois turnos, separados por três sessões, com pelo menos 33 votos em cada um deles.

Oposição reduzida

Ao contrário da legislatura passada, quando a oposição chegou a alcançar até 22 votos somando as bancadas de PT, PDT, PCdoB e PSOL, atualmente não há mais do que 13 opositores em potencial na Assembleia Legislativa com a convicção de voto contrário ao governo. As bancadas de PT e PDT caíram, respectivamente, de 11 para 8 cadeiras e de 7 (chegou a ser 8) para 4, enquanto o PCdoB perdeu suas duas cadeiras e o PSOL apenas substituiu Pedro Ruas por Luciana Genro. Dos 13 remanescentes, a tendência é que 12 sejam contrários à PEC 272, com o novato pedetista Luiz Marenco ainda indefinido sobre a questão.

Luiz Fernando Mainardi (PT) acredita na possibilidade da PEC ser rejeitada pela Assembleia | Foto: Joana Berwanger/Sul21

No entanto, o líder da bancada do PT, a maior da oposição com oito parlamentares, Luiz Fernando Mainardi avalia que o governo não deve contar com uma vitória folgada na votação da PEC 272, mesmo tendo uma robusta maioria na Casa. “Eu acho que os parlamentares tem a autonomia, a liberdade e a independência necessária para terem uma opinião que não seja obrigatoriamente a opinião que advém do Poder Executivo, até porque o governador está sendo contraditório com aquilo que falou. Em nenhum momento na campanha ele sustentou a subtração do direito da população decidir sobre isso. Ele foi contrário à inclusão do plebiscito junto com o processo eleitoral, porque, segundo ele, contaminaria, mas nunca disse que era contra o plebiscito”.

Mainardi diz que o PT conta com pesquisas que apontam que a maioria da população gaúcha seria contrária à privatização das estatais. “Eu acredito que essa mudança de postura do governador tem a ver com o medo de perder o plebiscito. Então, estou confiante de que ele não terá os 33 votos aqui na Assembleia para subtrair esse direito da população”, diz.

Líder do PDT, segunda maior bancada de oposição com quatro parlamentares, Juliana Brizola diz que esperava que o governador Leite apostasse na realização de um diálogo maior com a sociedade gaúcha sobre a questão. “Esse debate poderia ser ampliado de verdade se a gente respeitasse a Constituição. Ele se colocou na campanha como um representante da nova política, eu acho que escutar a população é uma das grandes características dessa nova fase que o país enfrenta, de dar mais voz à população”.

Luiz Marenco é um nome do PDT que pode acompanhar o governo | Foto: Joana Berwanger/Sul21

Juliana destaca que a bancada do PDT não discutiu o assunto ainda, mas aponta que os três deputados remanescente da legislatura anterior — ela, Eduardo Loureiro e Gérson Burmann — já haviam se posicionado contra a retirada do plebiscito. “Temos um deputado novo, Luiz Marenco. Não sei exatamente como ele pensa, mas sei que quer dialogar com o assunto, quer ter mais informações”, diz. Em conversa com a reportagem do Sul21 nesta terça, o novato Luiz Marenco disse que está conversando com os representantes dos trabalhadores das estatais para discutir a questão. “O que eu quero ver é quanto valem as empresas e por quanto querem vender”, disse.

Juliana defende que é necessário que o assunto seja amplamente debatido porque, uma vez privatizadas as empresas, não se poderá voltar atrás. “A conversa de que a CEEE precisa de investimentos e Estado não tem dinheiro para colocar, não temos a garantia de que o privado vai investir. A gente viu o que aconteceu agora com a Vale em Brumadinho. Na verdade, faltou investimento, no mínimo. Eu acho que, antes de se tirar o plebiscito, tudo isso deveria muito bem conversado e esclarecido, por isso a campanha durante um plebiscito seria importante para que a população pudesse ter a informação dos dois lados, de verdade”, diz.

Como votam os demais

Nesta terça, a reportagem do Sul21 conversou com pelo menos um representante dos 17 partidos representados na Assembleia Legislativa. Confira como as demais legendas se posicionaram.

Sebastião Melo (MDB) disse que ainda não definiu seu posicionamento | Foto: Joana Berwanger/Sul21

MDB – sem posicionamento no momento
Apesar de o partido ser o principal defensor da privatização durante o governo Sartori, o MDB ainda não fechou questão oficialmente sobre a PEC 272. Segundo o líder da bancada de oito parlamentares, Fábio Branco, o MDB ainda não se reuniu para tratar do assunto. Único novato da bancada, Sebastião Melo disse à reportagem que ainda não se decidiu.

PP – manifestou tendência de 7 votos favoráveis
Antigo integrante da base aliada do governo Sartori, o PP se manifestou sempre a favor da privatização das estatais. Também membro do governo Leite, o partido deve entregar sete votos favoráveis à PEC 272. “Sem dúvida alguma (votar a favor). Vamos manter a coerência”, disse o líder da bancada, Sérgio Turra.

PTB – manifestou tendência de cinco votos favoráveis
Com seis deputados na legislatura passada, o PTB deu quatro votos contrários e dois favoráveis ao projeto do governo Sartori que autorizava a realização do plebiscito sobre a venda das estatais junto com a eleição geral do ano passada. A bancada do partido perdeu uma cadeira desde aquela votação e renovou três nomes, mas, por ser o partido do vice-governador Ranolfo Vieira Júnior, deve agora entregar todos os seus votos ao governo. “Se somos governo, temos que votar a favor”, resumiu o deputado Dirceu Franciscon, que é o secretário estadual do Desenvolvimento Econômico e Turismo, mas exonerou-se temporariamente para atuar na largada da nova legislatura.

PSL – manifestou tendência de quatro votos favoráveis
O partido que mais traz caras novas para essa legislatura é o PSL, que não possuía bancada e na esteira da eleição presidencial de Jair Bolsonaro conquistou quatro cadeiras. Deputado mais votado da atual legislatura, Luciano Zucco diz que o PSL deve dar quatro votos favoráveis à retirada do plebiscito, pois o partido segue a linha do “liberalismo e do estado mínimo”. “Hoje, seria muito precoce a gente adiantar qualquer posicionamento final, mas provavelmente a gente vai seguir a linha do governo de privatização. Temos o entendimento de que é importante sabe as especificidades de cada estatal, mas, seguindo uma linha do governo federal, a privatização é um caminho devido”, diz, acrescentando ainda que a intenção é que a bancada se posicione de forma conjunta.

PSB – sem posicionamento no momento
Líder da bancada, o deputado Elton Weber diz que o partido ainda não começou a discutir a questão. Ele pondera que partido irá primeiro buscar entender qual será o destino dos recursos das eventuais privatizações. Na votação de junho de 2018, o partido entregou dois votos favoráveis ao governo Sartori e uma abstenção, mas apenas Weber é remanescente da legislatura passada.

DEM – manifestou tendência de dois votos favoráveis
O DEM é outro partido com dois estreantes na Assembleia Legislativa. Ex-vereador de Uruguaiana, Eric Lins disse à reportagem que deve votar a favor da PEC. O ex-vereador de Porto Alegre Thiago Duarte indicou que deve seguir a mesma linha ao afirmar que “os deputados não podem se esconder atrás do plebiscito”. Ele, no entanto, separa a votação da PEC da eventual votação posterior para autorização das privatizações de fato. Duarte diz que o seu voto nessa segunda etapa deveria passar por uma avaliação melhor. Ele se declara contrário a privatizações de empresas que prestem serviços essenciais à população, como se opunha à privatização do Departamento Municipal de Água e Esgoto (DMAE) de Porto Alegre, e que sejam lucrativas.

Fran Somensi (PRB) diz que espera saber destinação dos recursos de futura privatização para definir seu voto | Foto: Joana Berwanger/Sul21

PRB – manifestou tendência de dois voto favoráveis
Sérgio Peres, deputado remanescente da legislatura passada, indicou à reportagem que é favorável à retirada da obrigatoriedade do plebiscito. Já a novata Fran Somensi diz que ainda prefere aguardar esclarecimentos sobre o que será feito com os recursos eventualmente angariados nas privatizações. Ela diz que é contra a privatização para bancar o custeio da administração pública, mas favorável caso os recursos sejam destinados para investimentos, como na área de infra-estrutura.

PR – sem posicionamento no momento
Apesar de ter sido representado com até três nomes no final da legislatura passada, o PR conta com uma bancada de novatos: Paparico Bacchi e Airton Lima. Bacchi diz que o partido ainda está estudando o posicionamento sobre a questão. A tendência é que os parlamentares apresentem uma emenda à PEC 272. O PR também compõe a base aliada de Leite.

Novo – manifestou tendência de dois votos favoráveis
Apesar de não fazer parte da base aliada, talvez seja o partido com o apoio mais sólido a projetos de privatização, uma vez que suas principais bandeiras são a defesa do liberalismo econômico e do estado mínimo. Questionado sobre o posicionamento da bancada, o deputado Fábio Ostermann confirmou ao Sul21 que ele e Giuseppe Riesgo votarão a favor da PEC 272.

PPS – manifestou tendência de voto favorável
Única deputado do PPS, Any Ortiz declarou apoio na legislatura passada ao governo Sartori em suas tentativas mal sucedidas de retirar a obrigatoriedade do plebiscito e de realizar a consulta popular. Também aliada ao governo, manifestou que votará a favor da PEC.

Rodrigo Maroni (PODE) é um dos deputados da base que pode não votar com o governo | Foto: Joana Berwanger/Sul21

Podemos – manifestou possível voto contrário
Único deputado da bancada e mais um estreante na Casa, Rodrigo Maroni disse à reportagem que é a favor da realização do plebiscito, portanto, contra a PEC 272. O Podemos, contudo, é um partido que integra a base aliada do governo Leite.

Solidariedade – manifestou tendência de voto favorável
Mais um estreante, Neri, o Carteiro, diz que está estudando ainda o projeto, mas que a tendência de momento é votar a favor da PEC 272. O Solidariedade também integra a base aliada.

PSD – sem posicionamento no momento
Mais um novato na Casa, o deputado Juliano Franczak, o Gaúcho da Geral, diz que irá procurar ouvir todas as partes envolvidas na questão, mas indicou que, a princípio, é contra a retirada do plebiscito. O seu partido era base de Sartori e sempre votou com o governo na legislatura passada. Oficialmente, também compõe a base do governo Leite.


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