Cidades|z_Areazero
|
9 de janeiro de 2019
|
16:15

8º Conferência Municipal de Saúde debate democracia e pendências na área da saúde mental

Por
Sul 21
[email protected]
Centro de Saúde Posto Modelo | Foto: Guilherme Santos/Sul21

Débora Fogliatto

Em abril de 2019, acontece a 8ª Conferência Municipal de Saúde de Porto Alegre, com o tema “Democracia e Saúde: Saúde como Direito e Consolidação e Financiamento do SUS”. O evento, que ocorre a cada quatro anos, é organizado pelo Conselho Municipal de Saúde (CMS) e pela Secretaria de Saúde do município. Na 7ª edição, realizada em 2015, foi determinado que as políticas a serem priorizadas seriam as relacionadas à saúde mental. Agora, a poucos meses da próxima conferência, o Conselho avalia que isso não foi sempre feito pela gestão municipal.

No primeiro ano do governo de Nelson Marchezan Jr. (PSDB) e do secretário Erno Harzheim como responsável pela Saúde, 2017, a gestão foi reprovada pelo CMS. Isso significa que as ações feitas pela Prefeitura, as quais constam no relatório que descreve as políticas públicas da cidade para a área naquele período, foram reprovadas no parecer conclusivo da avaliação feita pelo Conselho.

A presidente do CMS, Maria Letícia de Oliveira Garcia, explica que uma das atribuições do Conselho é justamente avaliar a saúde na cidade. “Ao longo dos anos, temos feito avaliação da gestão através dos relatórios de gestão que são apresentados ao Conselho. Devemos deliberar sobre a avaliação anual, ter um parecer conclusivo, o qual podemos aprovar ou reprovar”, relata.

Dentre os motivos para a reprovação do parecer de 2017, ela destaca as falhas nas redes de saúde mental, atenção primária e questões relacionadas a doenças infecciosas como HIV/Aids e tuberculose, as quais afirma que “ainda apresentam uma incidência muito grande na cidade e consideramos que as ações são um pouco tímidas da Secretaria para o seu enfrentamento”.

Prefeito Nelson Marchezan abraça ex-secretário Erno Harzheim | Foto: Joel Vargas/PMPA

Ainda em 2017, foi apresentado para o CMS o Plano Municipal de Saúde, o qual foi aprovado com ressalvas justamente nas questões de saúde mental e atenção primária. “As duas políticas precisavam ser apresentadas ao CMS e não foram. A política da saúde mental foi a priorizada na última Conferência de Saúde, foi a proposta mais votada pela população de Porto Alegre. Mas isso não refletiu na política pública. E as outras demandas aprovadas que dizem respeito à atenção primária também”, explica Maria Letícia.

No Relatório Anual de Gestão, consta que “as políticas de saúde mental, priorizada na conferência municipal de saúde de 2015, embora tenha sido ressalvada no plano municipal de saúde até o momento não foi apresentada para deliberação do CMS. Do mesmo modo, a política de atenção primária à saúde também não foi apresentada ao CMS”.

Metas não atingidas

O relatório conclui que a meta que pretende laborar o Plano da Vigilância em Saúde Mental não foi atingida, além de ratificar a necessidade de que sejam apresentados dados de internações separados por faixa etária na Rede de Atendimento Psicossocial. “Podemos observar que também referente às ações de matriciamento realizadas nas Equipes de Saúde Mental Adulto (ESMA’s) e Núcleos de Atenção da Saúde da Criança e Adolescente (EESCA’s), verifica-se que algumas equipes aparecem zeradas e nas demais uma discrepância entre equipes do mesmo tipo sem nenhuma justificativa”, aponta o relatório.

Em termos de atenção primária, os conselheiros destacam que a cidade conta com 140 unidades de saúde (US), das quais 28 sem equipes de estratégia de saúde da família (ESF). Mas o relatório ainda questiona esse percentual, na medida em que 23 US contam com ESF vinculadas (modelo misto) sem ampliação de equipe e não cumprindo na maioria das vezes os parâmetros pactuados pelo próprio Conselho. Sendo assim, não caracterizariam expansão da Saúde da família, mas apenas um incremento de equipes consistidas.

Postão do IAPI | Foto: Ricardo Giusti / PMPA

Houve ainda o fechamento de duas equipes de Núcleo Ampliado de Saúde da Família (NASF), nas regiões Lomba do Pinheiro e Sul/ Centro-Sul, com a saída de trabalhadores sem a garantia da reposição nem das aposentadorias. Isso ocorreu em dois dos três NASFs administrados pelo município – dos sete existentes na cidade, os outros quatro são de responsabilidade do Grupo Hospitalar Conceição (GHC).

“A notícia veio de forma não oficial para o conselho de que dois seriam destituídos, então o único que vai ser mantido dos municipais vai ser o do Centro, porque está com equipe completa. Na região Leste, na Glória e Cruzeiro que são regiões bem vulneráveis, onde deveria ter esse serviço, vai ser destituído”, lamenta Maria Letícia.

Falta de pessoal

O relatório aponta também que houve um decréscimo da cobertura de atenção primária de 2016 para 2017, apresentando uma “cobertura ínfima” de 27% do total das equipes de saúde da família. Ressalta, ainda, que os Agentes Comunitários de Saúde muitas vezes precisam executar atividades administrativas nas Unidades de Saúde, por falta de assistentes administrativos.

Conselheiros tomam posse do lado de fora no início de 2018 | Foto: CUT-RS

Em 2018, o próprio Conselho sofreu com falta de pessoal. No parecer técnico divulgado pelo órgão, os conselheiros apontam que “pela primeira vez em onze anos a discussão da programação não teve o apoio técnico, visto que o CMS não conta com assessoria técnica desde janeiro de 2018”. Os conselheiros, inclusive, não conseguiram fazer as análises quadrimestrais, as quais são tradicionalmente realizadas pelo órgão, porque houve uma “intervenção” feita pelo então secretário de Saúde, Erno Harzheim.

“Ele fez uma intervenção que depois foi considerada ilegal, mas sofremos as consequências especialmente nos aspectos administrativos. Tivemos que tomar posse do lado de fora da Secretaria até que a situação se resolvesse legalmente, ficamos sem acesso [à sala do Conselho] por um período. Quando conseguimos ingressar, estávamos sem assessoria técnica, sem funcionários, e precisamos de uma estrutura mínima para tocar o processo do conselho”, relata Maria Letícia.

No parecer técnico, o CMS aponta que a intervenção feita pelo secretário explicitou “uma postura antidemocrática e de abuso de poder que retirou as condições materiais e logísticas para o pleno exercício do controle social em todas as suas instâncias”, além de ter prejudicado a discussão da Programação Anual de Saúde (PAS) de 2018, a qual “constitui importante instrumento de planejamento do SUS e que deve primar pela participação da comunidade”.

Troca de secretário

O secretário Erno foi anunciado, ao final do ano, como novo secretário executivo adjunto do Ministério da Saúde no governo de Jair Bolsonaro (PSL). Sendo assim, Pablo Stürmer, que era secretário-adjunto até então, assumiu nesta segunda-feira (7) o comando da pasta no Município. Na posse, Stürmer anunciou a abertura de 36 vagas em residenciais terapêuticos, um aumento significativo diante das 14 oferecidas atualmente pela Prefeitura.

Para Maria Letícia, o nome do novo secretário não empolga o Conselho. “Acredito que a linha vai ser a mesma, porque ele era adjunto do Erno. Me parece que o caminho traçado é o mesmo, até porque o plano de saúde já está aprovado, e essa é a nossa grande disputa, de que justamente muitas vezes esse plano não é seguido”, menciona.


Leia também
Compartilhe:  
Assine o sul21
Democracia, diversidade e direitos: invista na produção de reportagens especiais, fotos, vídeos e podcast.
Assine agora