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29 de dezembro de 2018
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11:00

Em 2018, governo Sartori aprofundou desmonte do Estado e acabou derrotado nas urnas

Por
Sul 21
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Cartazes do ato do CPERS de despedida do Governo Sartori, em dezembro | Foto: Joana Berwanger/Sul21

Débora Fogliatto

2018 foi ano de eleição, mas, se no segundo semestre as atenções estavam todas voltadas ao pleito de outubro, até agosto não se falava muito no assunto. No Rio Grande do Sul, o ano foi marcado pela continuação do desmonte de aparelhos públicos do Estado pelo governo de José Ivo Sartori (MDB), que acabaria derrotado nas urnas por Eduardo Leite (PSDB) no segundo turno.

O ano já começou com um secretário afirmando que o governo estudava vender terrenos e prédios de escolas estaduais considerados “subutilizados”, com a oposição questionando a ideia do governo de vender o ginásio da Brigada Militar, e Sartori, por sua vez, criticando a oposição por não permitir que nenhum dos projetos de autoria do Executivo fossem apreciados na Assembleia no mês de janeiro.

O Executivo havia convocado quatro sessões extraordinárias para tentar por em pauta quatro projetos, por não ter conseguido colocar em votação ao longo de todo ano de 2017 as PECs que autorizavam as privatizações da Companhia Estadual de Energia Elétrica – CEEE, Companhia Riograndense de Mineração – CRM e Companhia de Gás do Estado do Rio Grande do Sul – Sulgás sem a necessidade de realização de plebiscito.

O governador ainda cogitou protocolar ação direta de inconstitucionalidade (ADI) no Supremo Tribunal Federal (STF) para garantir a venda das estatais. Criticado por Vieira da Cunha (PDT), que chegou a ser seu secretário de Educação na primeira metade do governo e é autor da emenda que determina a necessidade do plebiscito, Sartori acabou terminando o ano de 2018, no qual encerra seu mandato, sem conseguir privatizá-las.

Manifestantes nas galerias comemoraram a derrota do governo | Foto: Guerreiro/ Agência ALRS

Em maio, o vice-governador José Cairoli (PSD) afirmou, em evento de lançamento de uma parceria com o Serviço Brasileiro de Apoio às Micro e Pequenas Empresas (Sebrae), que havia sugerido para Sartori, na época das sessões que votaram a necessidade de plebiscito: “vamos fechar a Assembleia, se organiza tudo e abre de novo”. A assessoria do vice-governador em seguida negou que isso tenha ocorrido e disse que a fala de Cairoli se tratava de uma brincadeira.

Outro objetivo de Sartori ao longo do ano foi aderir ao Regime de Recuperação Fiscal (RRF) proposto pelo governo de Michel Temer (MDB), mas o governador também encerra seu mandato sem conseguir cumpri-lo. O RRF começou a ser votado em fevereiro e chegou a ser aprovado pela Assembleia e sancionado pelo Executivo, mas as negociações com a União acabaram não sendo concluídas.

Sartori ainda inicialmente anunciou que venderia 49% das ações ordinárias do Banrisul, mas em abril anunciou sua desistência da medida. Tida como uma das contrapartidas para que o governo pudesse assinar o Regime de Recuperação Fiscal, a venda das ações chegou a ser autorizada pelo Banco Central, por um decreto assinado por Temer, mas uma semana depois o próprio governo recuou por “condições desfavoráveis de mercado”.

Extinções e parcelamentos

Em março, o governo lançou cronograma em que estabelecia a data de 17 de abril como limite para concluir as extinções de fundações. O governo do Estado já havia extinguido, ainda no ano passado, a Fundação Estadual de Produção e Pesquisa em Saúde (FEPPS), a Fundação Estadual de Pesquisa Agropecuária (Fepagro) e a Fundação Instituto Gaúcho de Tradição e Folclore (FIGTF).

No dia 5 de abril, o governador decretou o encerramento das atividades da da Fundação de Economia e Estatística Emanuel Siegfried Emanuel Heuser (FEE). Segundo o decreto publicado, as atribuições da FEE foram repassadas à Secretaria de Planejamento, Governança e Gestão (SPGG) e os servidores estáveis, legal ou judicialmente, integrantes dos Quadros de Pessoal da Fundação, passaram a compor o quadro da SPGG ou foram relotados para outras secretarias.

Coletiva de imprensa com José Ivo Sartori após apuração de votos do primeiro turno das eleições | Foto: Joana Berwanger/Sul21

No dia 12 de abril, o Tribunal de Contas do Estado determinou a suspensão de todos os atos de extinção das fundações, incluindo demissões e transferências de funcionários e a desmobilização das estruturas administrativa e operacional das entidades. A decisão cautelar dizia respeito à FEE, Fundação Zoobotânica (FZB), Fundação de Ciência e Tecnologia (Cientec), Fundação Piratini, Metroplan e Fundação de Desenvolvimento e Recursos Humanos (FDRH). O embate sobre as extinções ainda se arrastaria até o final do mandato de Sartori.

Após decretar a extinção da FEE, o Estado firmou contrato com a Fundação Instituto de Pesquisas Econômicas (Fipe) para o cálculo do Produto Interno Bruto (PIB), serviço que até então era realizado pela estatal. Em seguida, a Associação de Servidores da Fundação de Economia e Estatística (Asfee) apresentou um estudo apontando uma série de problemas técnicos, financeiros e jurídicos no contrato.

Um mês após a decisão do TCE, o Tribunal de Justiça (TJ) acatou a liminar da Procuradoria Geral do Estado (PGE), passando a permitir as extinções. Uma semana depois, Sartori decretou a extinção da Fundação Piratini e da Cientec. A extinção definitiva, no entanto, ainda dependia da aprovação da Receita Federal para a completa retirada do CNPJ do sistema. Mesmo assim, ‘encerrar as atividades’ foi o método utilizado para que os servidores se dispersassem e as funções fossem finalizadas dentro das fundações.

Festival Salve Salve TVE e FM Cultura, realizado em junho | Foto: Guilherme Santos/Sul21

Em junho, servidores que trabalhavam na FEE e na Fundação Piratini, remanejados para a Secretaria do Planejamento, Governança e Gestão (SPGG) e para a Secretaria de Comunicação (Secom), foram informados que deixariam de receber auxílio alimentação, saúde, creche e demais benefícios presentes nos acordos coletivos das categorias, que venceram em 31 de maio deste ano. Duas semanas depois, o Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul indeferiu agravo de instrumento apresentado pelo governo do Estado e manteve a proibição de extinguir e esvaziar a Fundação Zoobotânica.

Ainda no final de junho, a Justiça Federal determinou em liminar que o Estado não poderia formalizar a extinção da Fundação Piratini, embora na prática a decisão não tenha impedido que o governo continuasse a realizar a transferência de servidores e promover mudanças na estrutura da instituição. Alguns dias depois, servidores, artistas e apoiadores realizaram o ato cultural “Salve Salve TVE e FM Cultura“, no Teatro Renascença para criticar a extinção da fundação. No mês seguinte, o governo anunciou que pretendia realizar a concessão das emissoras a uma empresa privada, que seria escolhida por meio de edital.

Ao mesmo tempo em que realizava os fechamentos das fundações, o governador também continuava sua política de parcelamento de salários. No mês de julho, o 31º em que tiveram seus salários parcelados, entidades de servidores realizaram ato contra esta prática. Além disso, Sartori ainda aprovou ainda a Lei de Diretrizes Orçamentárias (LDO) do Estado para 2019 sem nenhum aumento salarial para o funcionalismo do Executivo, sequer a reposição da inflação, da mesma forma como já havia feito nos três primeiros anos de seu governo.

Festival Salve Salve TVE e FM Cultura, realizado em junho | Foto: Guilherme Santos/Sul21

Campanha eleitoral

Nos primeiros meses do ano, os nomes que concorreriam à eleição de outubro eram apenas especulação. Em março, o governador não confirmou se concorreria à reeleição, colocando em entrevista coletiva na Federasul que “se eu não posso dizer que sim, também não preciso dizer que não”. No dia 18, o PSOL lançou o nome de Roberto Robaina como pré-candidato ao governo.

Em abril, o ex-prefeito de Canoas, Jairo Jorge (PDT), que foi o primeiro a se lançar pré-candidato ao governo, anunciou o  empresário Cláudio Bier como vice na sua chapa. Ao mesmo tempo, Sartori enfrentava mudanças em sua administração, nomeando cinco novos secretários, um novo chefe de gabinete e três presidentes de instituições. As mudanças foram necessárias quando os ocupantes dos postos deixaram o governo para concorrer nas eleições de outubro, além daqueles filiados ao PP e PSDB, que deixaram a base para lançar a candidatura de Eduardo Leite. Em maio, o PTB anunciou aliança com os tucanos e indicaram o nome do delegado Ranolfo Vieira Júnior como vice na chapa de Leite.

A primeira pesquisa eleitoral, divulgada em junho pelo Paraná Pesquisas, trazia Sartori à frente, mas ainda não havia uma definição de quem seriam os adversários na disputa pelo Palácio Piratini. Duas semanas depois foi lançada a primeira Methodus, que mostrava o governador na liderança, mas sendo derrotado no segundo turno em todos os cenários. Na ocasião, Leite, que acabou se elegendo, aparecia em quarto lugar, atrás ainda dos candidatos Jairo Jorge e Miguel Rossetto (PT).

Montagem de fotos dos candidatos ao governo do estado do RS: Mateus Bandeira (Novo), Júlio Flores (PSTU), Eduardo Leite (PSDB), Miguel Rossetto (PT), José Ivo Sartori (MDB), Jairo Jorge (PDT) e Roberto Robaina (PSOL).

Em agosto, as candidaturas começaram a ser oficializadas. Inicialmente, o PCdoB lançou o nome de Abigail Pereira para o governo do Estado, enquanto o PT confirmou o nome de Miguel Rossetto, com Ana Affonso de vice em uma chapa pura. Quando se confirmou a aliança dos dois partidos no âmbito nacional, o diretório estadual seguiu a tendência e lançou Abigail como candidata à senadora na coligação PT-PCdoB, juntamente com Paulo Paim. O PSDB logo formou coligação com PTB, PP, PHS, PPS, Rede e PRB, confirmando o nome de Eduardo Leite como candidato.

O prazo para o registro das candidaturas foi encerrado no dia 15 de agosto, com a formalização de oito chapas concorrendo na disputa pelo Palácio Piratini: Eduardo Leite (PSDB) e Ranolfo Vieira Júnior (PTB); Jairo Jorge (PDT) e Claudio Bier (PV); José Ivo Sartori (MDB) e José Paulo Cairoli (PSD); Julio Flores (PSTU) e Ana Clélia (PSTU); Mateus Bandeira (Novo) e Bruno Miragem (Novo); Miguel Rossetto (PT) e Ana Affonso (PT); Roberto Robaina (PSOL) e Profª Camila (PSOL); Paulo Medeiros (PCO) e Jeferson Mendes (PCO).

Ainda em agosto foram realizados os primeiros debates. A Rádio Gaúcha recebeu sete dos oito candidatos no dia 16, em uma discussão focada nas temáticas da segurança e finanças. Na Federasul, uma semana depois, foram convidados Leite, Jairo Jorge, Sartori, Mateus Bandeira e Rossetto, os quais falaram de empreendedorismo, recuperação fiscal, segurança pública e arrecadação de impostos. O evento foi marcado ainda por trocas de acusações entre Leite e Bandeira, o que voltaria a ocorrer em diversas ocasiões. Os servidores também realizaram um debate com temáticas que os interessavam, no qual estiveram presentes Leite, Jairo,  Julio Flores, Rossetto e Roberto Robaina.

Debate organizado pelo Cpers e servidores públicos com os candidatos ao governo do Estado, na Casa do Gaúcho | Foto: Guilherme Santos/Sul21

Em setembro, Leite começou a crescer nas pesquisas, aparecendo empatado com Sartori, que até então liderava, na Ibope divulgada no dia 21. Seis dias depois, as pesquisas Methodus e Ibope mostraram que o ex-prefeito de Pelotas havia ultrapassado o atual governador e aparecia com maior número de intenção de votos. O último debate foi realizado pela RBS TV dois dias antes do primeiro turno das eleições, no qual os demais candidatos focaram seus ataques em Leite e Sartori. Em vão: o dia 7 confirmou que os dois disputariam o segundo turno pelo governo estadual.

Enquanto na disputa pelo Piratini as eleições confirmaram a tendência apontada pelas pesquisas, os gaúchos foram surpreendidos pelos nomes eleitos para o Senado: Luiz Carlos Heinze (PP), que aparecia em quarto lugar até então, foi o mais votado, seguido por Paulo Paim (PT), que venceu com estreita margem de Beto Albuquerque (PSB). O ex-governador José Fogaça (MDB), que as pesquisas mostravam como segundo ou terceiro com maior intenções de voto, terminou em quarto, atrás ainda de Carmen Flores (PSL).

Na eleição para deputados estaduais, o PSL de Bolsonaro conquistou quatro cadeiras, elegendo os dois parlamentares mais votados: o tenente-coronel Zucco e Ruy Irigaray. O MDB empatou com o PT em número de cadeiras, ambos com oito, enquanto em 2014 os petistas haviam obtido onze assentos. Também sem representação em 2014, os partidos DEM, Solidariedade, Podemos e Novo passam a compor o Parlamento a partir de 2019.

Segundo turno

Um dia após ser anunciado o segundo turno, Sartori declarou apoio a Jair Bolsonaro. Já Leite disse, ainda em coletiva logo após o resultado, que iria “conversar com Bolsonaro“, descartando possibilidade de apoio ao PT. Ao longo das semanas entre o primeiro e o segundo turno, Sartori cada vez mais buscou se aproximar da imagem de Bolsonaro, veiculando em suas propagandas o que chamou de “Sartonaro”, combinação entre os dois nomes.

Debate na Federasul entre Eduardo Leite e José Ivo Sartori | Foto: Joana Berwanger/Sul21

Leite e Sartori participaram de debate na Federasul em seguida, em que foi possível perceber as semelhanças dos dois projetos. A última pesquisa foi realizada no dia 27 de outubro, um dia antes das eleições, já prevendo a vitória de Leite. Ele aparecia com 57% contra 43% do atual governador. No pleito do dia 28, venceu com 53,40% dos votos válidos.

Em pronunciamento após a derrota, Sartori afirmou que deixaria o governo “de cabeça erguida” e disse esperar que o tucano desse continuidade às mudanças iniciadas pelo seu governo. Já Leite, em coletiva após eleito, reiterou que pretendia pagar em dia os salários dos servidores, ao contrário do que foi feito por Sartori.

O pós-eleições

Depois de perder a reeleição, Sartori divulgou no final de outubro que iria iniciar o pagamento da folha daquele mês apenas no dia 12 de novembro, marcando o 34º mês de parcelamento dos salários dos servidores. Em novembro, Leite formalizou o convite para que o MDB participasse do seu governo, e mesmo após Sartori declarar que manteriam uma linha de oposição, o partido acabou decidindo no dia 17 de dezembro que iria compor com o novo governador.

No final de novembro, Leite anunciou o primeiro nome de seu secretariado. No dia 22, Marco Aurelio Santos Cardoso foi oficialmente anunciado para a Secretaria da Fazenda. Também foram anunciados em seguida os nomes de Otomar Vivian para a Casa Civil, Leany Lemos para a área de Planejamento, Tânia Moreira para a Comunicação e Eduardo Cunha da Costa, que será procurador-geral do Estado.

Pelo terceiro ano, os servidores do Executivo precisaram recorrer de empréstimo do Banrisul para receber seu 13º de forma integral, após a Assembleia Legislativa aprovar o projeto de lei do governador Sartori que permite mais um parcelamento. Graças a uma emenda do deputado Pedro Ruas (PSOL), foi determinado que os servidores que possuam ação judicial contra o Banrisul ou cadastro de inadimplência também possam contrair o empréstimo.

Ato do CPERS de despedida do Governo Sartori. Foto: Joana Berwanger/Sul21

Em ato no dia 20 de dezembro, o Cpers denunciou que os servidores em situação de inadimplência haviam tido seus pedidos de empréstimo negados pelo Banrisul. O sindicato entrou com ações na Justiça e conseguiu garantir o cumprimento da emenda elaborada por Ruas. Na manifestação, os professores se “despediram” de Sartori, o qual consideraram o pior governador da história do Rio Grande do Sul.

Na última votação desta legislatura na Assembleia, os deputados aprovaram também a manutenção das alíquotas do ICMS por mais dois anos. Com a aprovação do projeto de lei 190/2018, são mantidas até 2020 as alíquotas definidas no final de 2015, que determinam valores a serem aplicados nas operações internas de cerveja, energia elétrica, gasolina, serviços de comunicação e refrigerantes, além da alíquota básica do imposto.

Na diplomação dos deputados eleitos, realizada no dia 19, deputadas de partidos de esquerda foram vaiadas por partidários e apoiadores do PSL. Luciana Genro (PSOL) teria sido um dos primeiros nomes a ser chamado, indo receber seu diploma com um cartaz pedindo justiça para Marielle Franco, vereadora morta em março de 2018 no Rio de Janeiro. O público vaiou a deputada, mas as manifestações contrárias às eleitas teriam aumentado com a chamada de Fernanda Melchionna (PSOL) e, mais intensamente, de Maria do Rosário (PT). Enquanto isso, deputados homens faziam sinais de armas com as mãos.

Alguns dias antes do feriadão de Natal, o governador eleito anunciou mais nomes para seu secretariado. Dentre os mais comentados estão a escolha da até então senadora Ana Amélia Lemos (PP), que concorreu como vice de Geraldo Alckmin (PSDB) nas eleições presidenciais e havia ficado sem mandato. Ela seguirá em Brasília, de onde cumprirá o papel de secretária de Relações Federativas e Internacionais. Leite também anunciou como chefe da Polícia Civil a delegada Nadine Anflor, que será a primeira mulher em 177 anos de corporação no Estado a ocupar o seu cargo máximo.


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