Entrevistas|z_Areazero
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22 de agosto de 2018
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10:30

Mateus Bandeira: ‘Vou manter a extinção das fundações e levar adiante um grande programa de privatizações’

Por
Sul 21
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“Decidi dar a minha contribuição”, diz o candidato Mateus Bandeira. Foto: Joana Berwanger/Sul21

Giovana Fleck

“Eu sou o candidato mais bem preparado para governar o Rio Grande do Sul por conhecer as finanças públicas”, aponta Mateus Bandeira (Novo). “Modéstia a parte”, acrescenta. Aos 49 anos, 2018 marca um ponto de virada em sua vida. Bandeira fala sobre sair da zona de conforto, fazer algo que o motive. “A vida não pode ser só resolver problemas”, diz, fazendo referência ao empresário Elon Musk. “Tem que ter algo que motive mais do que ganhar dinheiro. Eu já ganhei dinheiro o suficiente, não me movo por dinheiro.”

Filiado ao Partido Novo desde 2017, esse algo a mais na trajetória de Bandeira virou sua candidatura ao governo do Estado. Ele conta que a ideia veio a partir de conversas com o presidente do partido e candidato à presidência, João Amoêdo. “Eu fui convidado no momento onde eu estava numa transição, pensando sobre o que fazer da vida. Avaliando convites para ir embora, para presidir empresas fora do país. E decidi dar a minha contribuição. Acho que, para quem quer contribuir efetivamente para melhorar o Brasil não há melhor momento do que esse. Precisamos entender que as opções são nossas. Não basta criticar a velha política, é preciso ter alternativas de renovação”, resume o candidato.

Bandeira recebeu o Sul21 no coworking que tem alugado como sede de sua campanha. “Sem usar o fundo partidário”, reitera algumas vezes, ao longo da entrevista. Segundo o Tribunal Superior Eleitoral, R$ 130 mil foram investidos na campanha de Bandeira, dos quais R$ 120 mil foram investidos pelo próprio candidato. Na sala de reuniões, um mapa do Rio Grande do Sul e um quadro branco com a agenda de eventos ocupam a parede. Acima disso, frases de pensadores que inspiram o candidato, como o filósofo Sócrates, o ex-presidente estadunidense Abraham Lincoln e o próprio Amoêdo; todos com as citações dispostas em um quadrado com fundo azul e ícones laranja destacando a logomarca do Novo.

Ele se define como um homem bem sucedido. Natural de Pelotas, começa a contar sobre sua trajetória profissional a partir de seu pai. Bandeira é o filho do meio entre quatro irmãos criados pelo pai – que foi cobrador de ônibus, padeiro e siderúrgico. “O que ele nos deixou foi a sabedoria de que a única coisa que sempre teríamos é a educação.”É pai de gêmeos e casado.

Bandeira se formou em Informática pela UCPel (Universidade Católica de Pelotas). Foi analista de sistemas, e trabalhou com TI antes de ingressar na carreira pública – onde diz ter servido, integralmente, como um técnico.  Ocupou cargos estratégicos como servidor da Secretaria Estadual da Fazenda. Começou como auditor fiscal na gestão de Alceu Collares (PDT, 1991-1994), permanecendo na Secretaria com a posse de Antonio Britto (na época PMDB, 1995-1998) e Yeda Crusius (PSDB, 2007-2010).

Já foi filiado ao Partido dos Trabalhadores (PT), algo que diz ter sido vinculado à sua juventude. Durante o governo de Olívio Dutra (PT, 1999-2002), Bandeira foi transferido para a Companhia Estadual de Energia Elétrica (CEEE). Em 2007,  dirigiu o Tesouro do Estado do RS. Na sequência, liderou a Secretaria Estadual do Planejamento e Gestão até ser convidado, em 2010, para presidir o Banrisul. A partir de 2011, foi CEO na consultoria de gestão Falconi, onde ficou até 2017.

Bandeira aposta nas redes sociais para conquistar o eleitorado frente a seu curto tempo de exposição na propaganda eleitoral no rádio e na televisão. Recentemente, ficou quase 24h ao vivo em transmissão por sua página no Facebook. A iniciativa somou mais de 300 mil visualizações.

O candidato afirma não se sentir amedrontado pela baixa porcentagem de intenção de votos nas pesquisas. “Nós vamos fazer uma campanha diferente de todos os partidos. Não vamos usar marqueteiro, vamos usar a verdade. Não vamos usar fundos públicos, vamos usar doações voluntárias. E a gente vai tocar o dedo na ferida, em todos os problemas que representam os nós que devem ser desatados aqui no Rio Grande do Sul: privatizações, combate a privilégios, reforma da aposentadoria do setor público… Vamos falar dos temas mais difíceis, que são mais custosos politicamente.”

Bandeira recebeu o Sul21 no coworking que tem alugado como sede de sua campanha. “Sem usar fundo partidário”, reitera algumas vezes, ao longo da entrevista. Foto: Joana Berwanger/Sul21

Sul21 – Por que o senhor decidiu ser candidato ao governo do Estado?

Mateus Bandeira: Primeiro porque eu fui convidado. E é algo que eu nunca planejei, nunca passou pela minha cabeça. Nos últimos anos, eu me aproximei do Partido Novo. Conheci o João Amoêdo ainda em 2013, quando o projeto não tinha registro definitivo no TSE. Desde o princípio me tornei entusiasta da ideia de um partido que pudesse trazer renovação na política tradicional. Há muito tempo eu acompanho, até porque eu participei de vários governos ocupando funções de liderança seja como técnico concursado na Secretaria da Fazenda, seja quando eu voltei para o setor privado, onde presidi uma consultoria de gestão que trabalhava com as maiores empresas do Brasil mas que também prestava serviços para governos. Então eu sempre tive envolvimento com os temas que são os principais desafios para o desenvolvimento do país, ou no Governo ou em uma consultoria de gestão.

O Partido Novo é formado por cidadãos de bem, cidadãos comuns que vieram de fora da política e têm algo que é completamente diferente dos demais partidos, em relação aos valores e aos princípios. É contra fundo partidário, ou fundo eleitoral, e não usa um centavo do fundo partidário, ou fundo eleitoral – diferente dos demais partidos.  [O Novo] só aceita ficha limpa. Não aceita fazer coligações espúrias. A gente realmente representa algo novo na política brasileira. Agora, precisamos de candidatos novos. Então, eu avaliei que, com a minha experiência, no setor público e no setor privado – e dado que já, assim, é… Posso dizer que tenho uma carreira bem sucedida no setor público e no setor privado, eu entendi que essa era a melhor contribuição que eu poderia dar.

A gente não quer fazer da política um meio de vida, mas a gente quer dar uma contribuição para dar para os demais brasileiros. Eles também precisam participar ativamente, oferecer seus nomes em algum momento, se não a gente não vai ter renovação se a gente não romper com esse ciclo. Essa é a razão pela qual eu decidi aceitar o desafio. E isso é uma renúncia pessoal muito grande, isso é uma renúncia financeira muito grande. Eu não tenho intenção de fazer da política um meio de vida mesmo. É uma candidatura. Uma contribuição minha, pessoal, e que eu espero que faça sentido.

Sul21 – Qual é a primeira coisa que a população gaúcha poderá cobrar se o senhor for eleito?

Mateus Bandeira: Tudo aquilo que a gente vai apresentar durante a campanha. Nós vamos fazer uma campanha diferente de todos os partidos. Não vamos usar marqueteiro, vamos usar a verdade. Não vamos usar fundos públicos, vamos usar doações voluntárias. E a gente vai tocar o dedo na ferida, em todos os problemas que representam os nós que devem ser desatados aqui no Rio Grande do Sul: privatizações, combate a privilégios, reforma da aposentadoria do setor público… Vamos falar dos temas mais difíceis, que são mais custosos politicamente. Mas vamos nos comprometer a encaminhar reformas nos primeiros três meses de governo. Então, a população pode nos cobrar. Nos primeiros 100 dias de governo, vamos encaminhar todas as reformas para o Parlamento.

“Eu tenho orgulho da minha trajetória e de ter participado do governo dela, que fez um enfrentamento difícil em relação às contas públicas”. Foto: Joana Berwanger/Sul21

Sul21 – O senhor falou brevemente sobre a sua atuação no setor público. Durante o governo Yeda (PSDB), o senhor foi secretário do planejamento e chegou a dirigir o Banrisul. Antes disso, atuou em diversas outras gestões como servidor. E seu partido, por denominação, propõe novidade. De um ponto de vista estrutural, onde está o novo?

Mateus Bandeira: Nós estamos falando de renovação na política. Eu não tive participação política. Eu fui um servidor público concursado da Secretaria da Fazenda que trabalhou em funções importantes no governo do Collares, no governo do Britto, no governo do Olívio – só não tive atuação no governo do Rigotto aqui porque eu me licenciei ao final do governo Olívio, fiquei dois anos no exterior estudando. E, no retorno, fui convidado para atuar no Ministério da Fazenda. Fui cedido para a Secretaria de Política econômica para trabalhar com o Marcos Lisboa, na época, na agenda de reformas que foram encaminhadas e aprovadas naquele período. Voltei a convite da Yeda para integrar o governo dela, primeiro à frente do Tesouro do Estado, depois à frente da secretaria do planejamento. Aliás, os únicos três anos dos últimos 20 anos, duas décadas, em que o governo colocou as contas em ordem.

Eu tenho orgulho da minha trajetória e de ter participado do governo dela, que fez um enfrentamento difícil em relação às contas públicas. Existia uma bagunça naquela época.

Embora a natureza de um cargo de secretário seja uma natureza de agente político, eu era um técnico. Eu era reconhecido no governo como um técnico, tratado pela própria governadora como um técnico. Inclusive, esse foi o motivo pelo qual ela me convidou para presidir o Banrisul. No final de governo, em um ano de eleição, o banco é uma das empresas públicas mais disputadas por todos os partidos políticos. E ela me escolheu como presidente porque eu era o único secretário que tinha competência para assumir o banco e que não representava nenhum partido.

Então, o que a gente fala no Partido Novo de promover renovação, é de trazer pessoas que tenha trajetória na administração público ou privada, que tenham competência, que tenham preparo e que representem renovação política. Renovação, primeiro, através do partido. É isso que faz com que possamos atrair pessoas com uma trajetória admirada para que possam representar uma alternativa de renovação na política, em relação aos políticos profissionais.

Tem candidatos ao governo do Rio Grande do Sul que sequer passaram pelo setor privado. Que não têm um registro na carteira de trabalho, que nunca geraram uma carteira de trabalho.

Sul21 – Durante a sua atuação como presidente do Banrisul, o senhor chegou a falar que o grande desafio de sua gestão seria ampliar a linha de crédito do banco. O que estava em discussão, na época, era a compra do Banrisul pelo Banco do Brasil. O senhor chegou a dizer que para que isso acontecesse, a Constituição do Estado deveria ser alterada, sinalizando certo apoio à decisão do Executivo de se manter como acionista majoritário. Se eleito, o senhor vai manter a mesma postura?

Mateus Bandeira: Eu nunca defendi o Estado Mínimo, mas sim um Estado focado na sua função principal: garantir segurança pública, garantir um bom ambiente de negócios para continuarmos atraindo quem quer investir e empreender e garantir acesso à educação e saúde. Os países que se desenvolveram apostaram nisso e nas liberdades econômicas. Quem cria riqueza não é o Estado. O Estado se financia da riqueza gerada pelo setor produtivo e por quem trabalha.

Eu tenho uma memória muito boa e lembro de todas as entrevistas que eu dei como secretário, diretor do tesouro e presidente do banco. Quando eu falei em ampliar a carteira de crédito, foi justamente quando estávamos falando de capitalização do banco. O banco é um agente intermediário no sistema financeiro por captar recursos e emprestá-los. E, para fazer isso, ele tem um limite do capital que está empregado no banco. E, naquele momento, nós estávamos batendo no limite.

Nosso desafio era ampliar a carteira de crédito para que o banco continuasse produzindo resultados e gerar lucratividade para seus acionistas, inclusive para o Estado. Essa é a função do banco, ou ele cresce ou ele perde sua função e acaba sendo absorvido em outros. O Banrisul, diferente de outras estatais, é a única [empresa] que atua em um mercado extremamente competitivo.

Eu sempre defendi privatizações conceitualmente. Mesmo no período de Antônio Britto, quando a gente iniciou as privatizações de maneira pioneira – antes do Governo Federal – com a CEEE e a CRT. Eu entendo que o Estado não deve ser empresário. O Estado, quando se volta para fazer outras coisas que deveriam ser feitas pelo setor privado, ele deixa de cuidar daquilo que é básico.

Por acaso é papel do Estado ter um Banco? Agora, […] eu tinha o mandato para tornar o banco mais eficiente e conduzi-lo naquele último ano de governo. E foi o que eu fiz. 2010 foi o ano do melhor índice de eficiência do Banrisul e o segundo melhor ano em lucratividade na história do banco, em valores atuais. Eu não podia estar lá para defender a privatização, quem tem que fazer isso é o acionista. Esse comentário meu não tem nada a ver com a defesa ou não do Estado no controle do banco ou das estatais, ou a defesa das privatizações.

Sul21: No ano passado, o Banrisul teve um lucro de R$ 1,05 bilhão, que consistem em 60% a mais do que em 2016 – o maior lucro líquido da história em valores nominais. Argumenta-se que privatizá-lo implicaria em uma perda de receita que, melhor gerida, poderia ser aplicada no que o senhor cita como funções básicas do Estado.

Mateus Bandeira: O lucro do banco ou de qualquer outra empresa não significa que vai todo para as mãos do controlador. A remuneração dos acionistas se dá em forma de dividendos. O Banco, desde 2007, adotou uma política de distribuição de dividendos que significa que 40% das receitas são distribuídas anualmente. O resto, vai para formar reserva e aumentar o capital do banco. O Estado pode usar esses recursos para financiar as despesas de maneira livre. […]

O problema é que, há mais de 40 anos, o Estado gasta mais do que arrecada. Aquilo que ele recebe de dividendos do Banrisul e tudo aquilo que ele arrecada de impostos, não são o suficiente para pagar as suas despesas. Desde 1970, em pouco anos, o Estado gastou menos do que arrecadou.

O fato é que falta recurso para financiar todas as despesas. Ele é maior do que ele poderia, do que ele deveria.

Sul21 – Falando, então, sobre crescimento econômico, qual a sua estratégia para desenvolver a economia do Rio Grande do Sul?

“É por ser tão importante para a economia e para o país, já que é a ferramenta que cada um tem para correr atrás de seu propósito, que o Novo defende que a educação não deve ficar nas mãos do Estado.” Foto: Joana Berwanger/Sul21

Mateus Bandeira: Precisamos compreender que crescimento econômico decorre de investimento. […] E investimento, decorre de confiança.

O principal tributo do Rio Grande do Sul é o ICMS, e ele está intimamente ligado com o crescimento da economia. Nos últimos 20 anos, o Rio Grande do Sul cresce menos do que o Brasil. Por várias razões. Portanto, o ICMS gaúcho cresce menos do que o ICMS nacional. Este, aliás, é um dos fatores determinantes para esta crise. Mas o fator mais importante é que, sabendo disso, os governos gastam mais do que deveriam.

Para que a gente retome a capacidade do Estado de investimento e, portanto, tenham oportunidade de emprego e renda aqui e façamos com que a economia cresça, o primeiro desafio é organizar a bagunça das contas públicas. Ninguém vai tomar uma decisão de longo prazo de investir num Estado que não garante segurança pública nas ruas. O Rio Grande do Sul figura hoje no 15˚ lugar no ranking do IDEB. É uma educação de péssima qualidade, nota 3.3 de 0 a 10. Estamos formando analfabetos funcionais.

É por ser tão importante para a economia e para o país, já que é a ferramenta que cada um tem para correr atrás de seu propósito, que o Novo defende que a educação não deve ficar nas mãos do Estado. O Estado tem que garantir uma única coisa: acesso à educação de qualidade para quem não pode pagar por ela.

Sul21 – Em uma pesquisa da Faculdade Latino-Americana de Ciências Sociais (Flacso) encomendada pelo Banco Interamericano de Desenvolvimento (BID), mais da metade de crianças e adolescente em escolas públicas e privadas afirmam que sofrerem alguma forma de violência dentro das instituições de ensino. Somado à isso, no contexto da escola pública, estão os mais de 30 meses do parcelamento dos salários dos professores, o sucateamento da estrutura física; além dos fechamentos que marcaram o início de 2018. Como melhorar esse cenário?

Mateus Bandeira: Para melhorar qualquer coisa a gente precisa entender a raiz do problema. Quando a gente vai num médico, com febre, ele não trata só da febre. Ele até pode dar um Dipirona para diminuir, mas ele vai tentar fazer um diagnóstico para tentar achar o que está causando aquele problema.

É o que acontece hoje no Rio Grande do Sul. […] Todas essas coisas são sintomas de um modelo de Estado falido, inchado e que gasta mais do que arrecada. Ponto.

Salários atrasados de professores e brigadianos é um drama, falta recurso e ele [o Estado] atrasa salários dos servidores. Aí é uma injustiça. Não que ele não possa atrasar, se ele não tem recursos, ele não paga. A injustiça é que outros recebam em dia enquanto professores e policiais recebem parcelado. As pessoas pagam impostos para financiar o Estado, não para financiar primeiro o Judiciário, depois a Assembleia Legislativa, o Ministério Público e, só então, os professores. Isto é uma injustiça brutal. Todos deveriam receber ao mesmo tempo. Isto é falta de coragem, até para descumprir uma outra medida inconstitucional que é a do repasse do duodécimo para todos os poderes. Isso é um problema.

Por que os professores são remunerados abaixo de outros profissionais? Uma das razões é pelo próprio sistema de aposentadoria de professores, que trabalham 25 anos e se aposentam. Um pouco mais de 90% são mulheres. Trabalha 25 anos, se aposentam e vivem mais do que os homens.

65% das despesas na educação é com aposentados e pensionistas. E crescendo. Houve uma geração que se aposentou com regras muito benevolentes, muito generosas, e que vai onerar uma nova geração. Os mais novos vão ter que pagar cada vez mais impostos para financiar esse tipo de benefício que foi prometido para essa geração no passado. Ou a gente muda isso, ou não sobrarão recursos para financiar a educação. Isso é a dura realidade.

Independente disso, a gente entende que o modelo de educação pública é um modelo falido. […] Estamos produzindo, na nossa rede estadual de ensino no Brasil analfabetos funcionais. E esse é o maior drama na minha opinião, porque os próximos anos serão extraordinários para quem tiver acesso a educação e for bem formado, por conta de toda a revolução digital que está vindo, com cada vez mais a possibilidade de extinção de profissões mais braçais e operacionais. Agora, serão anos assustadores para quem não tiver educação.

Como que a gente pretende resolver o problema da educação? Introduzindo inovação. Introduzindo o que deu certo no resto do mundo. Primeiro, comprando vagas em escolas privadas de boa qualidade, que tenha um Ideb (Índice de Desenvolvimento da Educação Básica) de, no mínimo, 6. Essa é a maneira mais rápida de melhorar a qualidade e diminuir esse abismo. Se a gente continuar o mesmo que tem sido feito nos últimos anos, [voz irônica] temos que valorizar professor, melhorar a escola e não sei o quê.

Assim, o Estado é absolutamente capturado pela corporação sindical, aqui, no nosso caso, pelo CPERS. Logo, esse quadro não vai ser alterado radicalmente. Vamos condenar essa geração que está aqui a esperar outros 20 anos. Se a gente compra vaga, primeiro, nós damos liberdade de escolha para elas. O problema maior é as pessoas não terem liberdade de escolha. Ou os municípios não têm também liberdade e autonomia pedagógica para moldar os interesses da região e moldar pessoas com competências técnicas para atender os setores regionais.

O Brasil já compra vagas com o ProUni. Por que a gente não pode fazer o ProUni do Ensino Básico? Também queremos introduzir um modelo muito bem sucedido lá fora, chamado Charter School, que aqui eu estou chamando de ‘Escolas Comunitárias’. Pega uma escola dentro da comunidade , ou uma rede de escolas, e seleciona, publicamente, uma entidade filantrópica – ou mesmo uma escola privada – para gerir aquela escola. O Estado dá o mesmo recurso que ele aplica hoje e só cobra resultados. Daí essa escola privada, livre das amarras do Estado, pode ter liberdade para selecionar professores, para demitir professores, para estabelecer um sistema de incentivos que premie bons professores, que puna o pior professor… Sem isso, nada muda.

“Claro que queremos investir muito em tecnologia, para que haja ganho de produtividade e poder represar a necessidade daqueles que se aposentam muito cedo.” Foto: Joana Berwanger/Sul21

Sul21 – Ainda assim, se o senhor for eleito terá que lidar com outro impasse antes de realizar essa transição, já que os salários e benefícios dos servidores, dentre eles os professores, estão parcelados e sem reajustes. Como o senhor pretende lidar com o pagamento do salário dos servidores estaduais?

Mateus Bandeira: Eu fui servidor público concursado. Ingressei em 1993, vindo do setor privado. Na época eu fui o mais jovem auditor fiscal na Secretaria da Fazenda. Eu tenho vários amigos servidores públicos super competentes e conheço várias pessoas em outras carreiras igualmente competentes. O problema é que não tem só gente competente. Tem também gente que não é competente e não quer trabalhar e todo mundo é remunerado igual. Mas isso é um quadro que só se altera nacionalmente, por depender de mudanças na Constituição.

A gente quer trabalhar com os melhores, valorizar os servidores. Estamos escrevendo em nosso plano de governo a proposta de reduzir radicalmente a estrutura das secretarias e de cargos de comissão para trabalhar com os servidores concursados, mas em uma ambiente de sistema de incentivos. Para nós, é um compromisso pagar salários para todo mundo igual. Ou seja, quando tivermos recursos para pagar a folha de salário, a gente repassa o duodécimo. Se todo mundo recebe em atraso, todo mundo será sócio do problema e será sócio do ajuste. Todo mundo será parceiro na busca pela solução do equilíbrio fiscal.

Claro que queremos investir muito em tecnologia, para que haja ganho de produtividade e poder represar a necessidade daqueles que se aposentam muito cedo.

Sul21 – Como o senhor irá lidar com o pagamento da dívida com a União e como fará para que essa questão seja equacionada a longo prazo, não apenas em seu mandato?

Mateus Bandeira: A dívida que o Rio Grande do Sul tem com a União, é dívida formada por déficits passados. Ela existe… Ela é uma dívida que é fruto de décadas de irresponsabilidade. E ela precisa ser paga. O caminho de curto e médio prazo único para fazer um processo de ajuste é o chamado Regime de Recuperação Fiscal, aprovado pelo Congresso Nacional, Lei Complementar n˚159.

Ele permite a suspensão do pagamento da dívida por três anos, prorrogáveis por mais três, que é algo equivalente a mais de R$ 3 bilhões por anos. Então é um alívio para que o Estado deixe de pagar tudo isso, tenha tempo para fazer as reformas necessárias, e colha os benefícios dessas reformas.

A despesa é muito rígida. A gente não consegue demitir aposentado. E os servidores na ativa, grande parte atua nas áreas de educação e segurança. Então não há espaço para cortar servidor. Mas há espaço para ter grande produtividade em outras áreas? Sim. Mas isto é gradual, não é substancial. Precisamos trabalhar para que as despesas não cresçam mais enquanto a gente faz todo o necessário para que o investimento volte e a economia e a renda cresçam.

Mas a dívida vai ter que ser paga ao longo do tempo. Como? Com um princípio muito básico de austeridade fiscal. Temos que resgatar este princípio, deixar de gastar mais do que se arrecada, promover as privatizações…. E não tem outra forma de fazer.

Tem gente que defende o calote da dívida. Esquece de dizer que o calote da dívida com a União faz com que todos os brasileiros, inclusive nós, gaúchos, paguemos essa conta. A dívida é um crédito da União com os Estados. O não-pagamento significa que a União vai ter usar mais dinheiro de impostos.

Sul21 – Em 2018, a mortalidade infantil voltou a crescer. Além disso, doenças que eram consideradas erradicadas voltaram aos níveis de alerta do Ministério da Saúde. Em Santa Maria, um surto de toxoplasmose foi considerado o maior já experienciado no Brasil. Ainda assim, o governo Temer aprovou um projeto de contenção de despesas que limita investimentos em saúde. Como o senhor irá lidar com esse cenário na sua gestão?

Mateus Bandeira: Não tem congelamento de gastos, né. Quem disse que tem congelamento de gastos? A PEC do Teto não congela gastos. A PEC do teto fixa, em valores reais, o que significa que eles crescem de acordo com a inflação, todos os gastos públicos. Ela leva para o Parlamento a necessidade de definir prioridades.

O dinheiro não é infinito e não dá em árvores. O dinheiro dos impostos é financiado pelo setor produtivo, pelas pessoas que trabalham. Financiar mais significa mais impostos. Quem quer pagar mais carga tributária? Carga tributária é consequência do tamanho do Estado.

Mesmo a União tem a obrigação de aplicar um percentual da sua receita em Saúde. No caso do Rio Grande do Sul, é 12% de sua receita líquida livre de impostos e transferências. Isso significa algo em torno de R$ 4 bilhões ao ano.

Falta hoje gestão e inteligência. 96% desses R$ 4 bilhões são gastos contratando entidades filantrópicas, hospitais e clínicas de saúde nos municípios onde o Estado precisa dessas prestadoras de serviços. Hoje, paga-se coisas que não estão em contrato, não se avalia a qualidade do serviço, não se mede o impacto do atendimento, se o hospital x entrega mais pelo mesmo valor que o hospital y. Não existe gestão.

Falta, também, inteligência para casar a demanda com a oferta de serviço. Por exemplo, quando o Estado realiza contratos com determinadas entidades, não necessariamente ele contratualiza com hospitais ou clínicas que atendem as especialidades que são as reais demandas daquela região. Um hospital com menos de 30 leitos, por exemplo, não é superavitário. Hospital precisa de escala. Então, temos que concentrar isso em unidades regionais. enfim, tem muito trabalho para ser feito. Os recursos não vão crescer de maneira relevante, dado que isso só irá acontecer com o crescimento da receita.

“Precisamos investir em três pilares da atuação do Estado em segurança: intervenção policial, sistema judicial e o sistema prisional.”  Foto: Joana Berwanger/Sul21

Sul21 – Em termos de segurança, é possível apresentar melhores resultados sem recuperar os quadros das forças de segurança, que estão com seus menores contingentes na história?

Mateus Bandeira: O segundo maior efetivo da Brigada Militar atuou em 2009. Em 2007, quando nós começamos o ajuste fiscal, autorizamos a retomada dos concursos e atingimos mais de 27 mil policiais. Eu estou falando isso para dizer que a segurança tem o mesmo problema da educação, no sentido de que as pessoas se aposentam muito cedo. Precisamos corrigir isso com uma Reforma da Previdência.

Enquanto isso não acontece, já que a segurança não pode esperar, temos que criar incentivos para a permanência no trabalho e incentivos para chamar aqueles que se aposentaram muito cedo. Nossa ideia é montar uma força-tarefa de 600 policiais para substituir os 600 policiais ativos que, hoje, fazem a segurança no Presídio Central e da PEJ. Com isso, colocamos pessoas que já foram para a aposentadoria numa força-tarefa específica para cuidar dos presídios.

Mas mais importante é que, reduzindo o ritmos de aposentadorias, gradualmente, vamos repor mais do que se aposentam. Assim, recompor o efetivo. Essa será uma das nossas primeiras medidas, nos primeiros dias de governo: um decreto com uma programação de recomposição do efetivo em 1.100 por ano. Por quê? Porque essa é a capacidade máxima de treinamento da Academia da Brigada Militar. Quando o governo diz que vai contratar 4 mil [oficiais] em um ano, ele está promovendo uma desorganização total com qualidade discutível.

Mas precisamos investir em três pilares da atuação do Estado em segurança: intervenção policial, sistema judicial – mas isso não está na nossa mão, mas que tem um viés extremamente garantista, então precisamos trabalhar para aprovar medidas que retirem os mecanismos de abrandamento das penas – e o sistema prisional. Há muito, o Rio Grande do Sul abandonou a sua política prisional. Precisamos voltar a construir presídios e termos a capacidade de encarcerar e isolar líderes de facções criminosas. Hoje, o Estado está fazendo um trabalho de recrutamento para as facções.

Sul21 – E como reinserir os presos na sociedade?

Mateus Bandeira: Construindo presídios, separando presos pelo grau de periculosidade, garantindo que os mais perigosos fiquem isolados da sociedade. Quem comete crimes hediondos não tem capacidade de reinserção, desculpa, a gente tem que tratar de maneira muito rigorosa e elevar, de maneira substancial, o custo de cometer um crime. Para garantir o exemplo.

Já os [crimes] pequenos, eles têm que ter… a oportunidade não, mas a obrigação de trabalhar para se sustentar. Se não, a sociedade acaba sendo vítima duas vezes, do crime cometido e por ter que sustentar o preso através de seus impostos.

Primeiro, a gente tem que acessar os recursos disponíveis no Fundo Penitenciário nacional, R$ 4 bilhões que podem servir para a construção de presídios e de um regime disciplinar diferenciado. Um sistema em que o preso vai estudar, trabalhar, sair do sistema com uma poupança e com um ofício.

Sul21 – A agricultura é uma das principais atividades econômicas do Rio Grande. Qual será a sua política para o pequeno agricultor e para o agronegócio?

Mateus Bandeira: O agronegócio ainda é um motor da economia brasileira e gaúcha – no nosso caso, muito diversificada. O que o governo pode fazer a curto prazo é garantir segurança, porque isso é um problema gravíssimo, e tratar o produtor como um grande parceiros, não de maneira hostil; retirando os entraves burocráticos, licenças ambientais… Hoje, um produtor no campo não tem autorização para cortar lenha de uma árvore que foi derrubada por um raio. Ele precisa pedir autorização ambiental. Assim como pode esperar meses pela liberação para cavar um poço artesiano. Precisamos deixar que ele volte a ser dono de sua própria terra para que ele possa trabalhar com paz e segurança. E o Estado invista em estrutura por meio de PPP (Parcerias público-privadas) e concessões.

Esses são os pontos que mais afetam o agronegócio fora, obviamente, a carga tributária que afeta todo mundo e que onde não podemos fazer uma redução seletiva.

“O fim do período de concessão da Concepa na Freeway foi uma representação da incompetência gerencial do Estado brasileiro.” Foto: Joana Berwanger/Sul21

Sul21 – Recentemente, houve a polêmica em torno do fim da concessão da Freeway para a Concepa. Por outro lado, uma das grandes demandas dos gaúchos é a qualificação das estradas. Qual será a sua política para a ampliar e fazer a manutenção preventiva e eficaz das rodovias estaduais? Além disso, qual será sua política em relação aos transportes, de maneira geral?

Mateus Bandeira: O fim do período de concessão da Concepa na Freeway foi uma representação da incompetência gerencial do Estado brasileiro. É inadmissível.

Mas o Rio Grande do Sul tem uma outra jabuticaba que é a EGR, é o único estado que tem uma estatal de pedágios. Por [conta de] uma confusão ideológica. É um dos maiores equívocos que precisa ser consertado com a extinção da empresa e com a retomada de um programa de concessões. Mas, também, temos que retomar um programa de concessões.

Não há outra forma de voltar a investir em infraestrutura. Fora o fato de que dependemos quase exclusivamente do modal rodoviário quando temos 400 km de rios navegáveis no Rio Grande do Sul e não exploramos nada. Essa poderia ser uma alternativa interessante para escoar produção, por exemplo, de grãos ou celulose….

Quer dizer, temos um potencial enorme. Mas que só pode ser viabilizado com a participação do setor privado. O Estado não tem nem capacidade gerencial nem financeira para fazer com que isso aconteça. Mas, para voltarmos a discutir sobre concessões ou PPPs, precisamos colocar as contas em ordem.

Sul21 – O senhor irá manter ou reverter a extinção das fundações?

Mateus Bandeira: Sim. Manter a extinção e levar adiante um grande programa de privatizações.


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