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31 de janeiro de 2017
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21:36

Angela Davis, Victor Jara e as sandálias: os símbolos do ato popular de posse de Edegar Pretto

Por
Sul 21
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Em um ato simbólico, Edegar Pretto tirou paletó, gravata e sapatos. Depois, ex-governador Olívio Dutra calçou nele as “sandálias da luta”. (Foto: Guilherme Santos/Sul21)

Marco Weissheimer

“Subo aqui hoje com o coração muito quente e iluminado. Quero repetir o que a militante feminista negra Angela Davis disse há poucos dias, em um ato nos Estados Unidos: neste momento histórico, é preciso lembrar a nós mesmos que somos centenas, milhares e milhões de mulheres, homens, jovens, trabalhadores de todas as sexualidades e de todas as religiões; somos nós que mudaremos a história”. A fala da jornalista e ativista feminista Télia Negrão deu o tom que marcou o ato popular de posse do deputado Edegar Pretto (PT) na presidência da Assembleia Legislativa do Rio Grande do Sul. Realizado no final da tarde desta terça-feira (31), na Praça da Matriz, o ato reuniu militantes e dirigentes do Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra (MST), de outros movimentos sociais, de sindicatos, centrais sindicais e do Partido dos Trabalhadores.

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Em meio a um cenário de derrotas eleitorais e políticas, e de uma ofensiva conservadora no Estado e no País, a posse de Edegar Pretto representou um momento de respiro, de possibilidade de alguns recomeços e da urgência de lutas em defesa de direitos que estão eclodindo no mundo inteiro, em especial após a posse de Donald Trump nos Estados Unidos. As referências citadas na praça evidenciaram esse novo momento: além da militante feminista Angela Davis, o músico chileno Victor Jara, assassinado pela ditadura chilena, também foi lembrado na manifestação.

“Quem está na Praça da Matriz hoje não esquecerá este momento. A fala de Edegar Pretto nos anima e nos revitaliza”, disse Leonardo Melgarejo, presidente da Associação Gaúcha de Proteção ao Ambiente Natural (Agapan) e integrante do Coletivo A Cidade que Queremos. Esse clima dominou a Praça da Matriz desde o início da tarde. No centro da praça, foi improvisado um palco com microfones, caixas de som, faixas e bandeiras de diversos coletivos, movimentos sociais e outras entidades. Na passarela de entrada para o auditório do Teatro Dante Barone, foi instalada uma tenda onde um grupo de gaiteiros e violeiros, os Cantadores do Povo, recebia e animava o público que chegava para a posse, vindo de diversas cidades do interior do Estado.

Ato popular de posse de Edegar Pretto lotou a Praça da Matriz. (Foto: Guilherme Santos/Sul21).

Na porta de entrada do auditório, servidores da Companhia Estadual de Energia Elétrica (CEEE) carregavam cartazes em protesto contra “o governo Sartori, o PMDB e a RBS”. Na entrada da Assembleia, o ambiente era tranquilo, bem diferente daquele que encerrou o ano de 2016, quando o Parlamento foi cercado pela Brigada Militar e a Praça da Matriz palco de enfrentamento entre servidores públicos e o pelotão de choque da BM. Dois telões foram instalados do lado de fora da Assembleia para o publico acompanhar a cerimônia de posse. O Dante Barone, onde também havia um telão instalado, também ficou lotado. A presença da Brigada Militar, desta vez, foi bastante discreta, limitando-se a alguns homens e viaturas estacionadas perto do Palácio Piratini. Mas toda a cerimônia de posse, dentro e fora do Palácio Farroupilha, transcorreu sem incidentes.

Assim que terminou a cerimônia oficial de posse, dentro da Assembleia, algumas centenas de pessoas se concentraram na Praça da Matriz para o ato popular de posse. Participaram do ato, entre outras lideranças do PT, os ex-governadores Olívio Dutra e Tarso Genro e o ex-ministro Miguel Rossetto. No trajeto entre a Assembleia e a praça,  Edegar Pretto foi cercado por jornalistas, amigos e companheiros de militância que queriam cumprimentá-lo e fazer alguma fotografia ou selfie com o novo presidente da Assembleia gaúcha. “Agora não vai mais ter polícia na porta da Assembleia”, disse o trovador Severiano Telles, principal animador dos Cantadores do Povo.

Quando Edegar Pretto chegou à praça, Severiano o convidou para cantar junto a música “O Colono” de Teixeirinha, uma das preferidas de Adão Pretto que, além de militante e parlamentar, também foi um cantador popular. Em seguida, o cantor Antonio Gringo recitou uma poesia do chileno Victor Jara celebrando o trabalho dos lavradores. Após o momento musical, iniciou o ato popular propriamente dito, coordenado por Eliane de Moura Martins, da Coordenação nacional do Movimento de Trabalhadoras e Trabalhadores por Direitos (MTD). O deputado foi convidado a tirar o paletó e a gravata. Em seguida, o ex-governador Olívio Dutra tirou os sapatos e meias de Edegar Pretto e calçou em seus pés um par de sandálias. “Essas são as sandálias da luta”, disse Eliane de Moura.

Assim que terminou a cerimônia oficial de posse, dentro da Assembleia, algumas centenas de pessoas se concentraram na Praça da Matriz para o ato popular de posse. (Foto: Guilherme Santos/Sul21)

O ato prosseguiu com a manifestação de representantes de movimentos sociais. Além de Leonardo Melgarejo, que falou em nome dos lutadores das causas ambientais, e de Télia Negrão, pelos movimentos e coletivos de mulheres, Vera Soares falou pelos movimentos de negros e negras. Vera saudou a posse de Edegar Pretto e lembrou a tentativa de proibir, mediante um projeto de lei, o sacrifício de animais pelas religiões afro-brasileiras. “Esse Estado racista se achou no direito de nos colocar no banco dos réus”, criticou. As falas foram interrompidas por um temporal que atingiu Porto Alegre no final da tarde. Centenas de manifestantes buscaram abrigo no saguão de entrada da Assembleia Legislativa, provocando uma cena irônica. No primeiro dia da gestão de Edegar Pretto, as portas de entrada da Assembleia, tantas vezes fechadas ao público nos últimos dois anos, ficaram tomadas por manifestantes que participaram da posse popular.

Sob forte chuva, o deputado prosseguiu na Praça para o encerramento do ato que acabou abreviado pelo mau tempo. Pretto reafirmou os compromissos que expressou em seu discurso de posse, no sentido de abrir e aproximar a Assembleia da população. E já pode acompanhar, na própria Praça da Matriz, a mobilização de servidores da CEEE, da Companhia Riograndense de Mineração (CRM), de policiais civis e professores, entre outras categorias, que prometem retomar a mobilização já em fevereiro para derrotar a segunda parte do pacote do governo Sartori que pretende aprovar a privatização das empresas do setor elétrico do Estado como contrapartida para o acordo de renegociação da dívida que Sartori está debatendo com o governo Temer.

Galeria de imagens

Foto: Guilherme Santos/Sul21
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Foto: Guilherme Santos/Sul21
Edegar Pretto e Télia Negrão. (Foto: Guilherme Santos/Sul21)

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