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3 de setembro de 2016
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12:00

Usuários denunciam diminuição de atendimento em serviço para população de rua

Por
Sul 21
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Pessoas "acampam"em frente ao Centro Pop em dia sem atendimento | Foto: Guilherme Santos/Sul21
Pessoas “acampam”em frente ao Centro Pop em dia sem atendimento | Foto: Guilherme Santos/Sul21

Débora Fogliatto

O Centro de Referência Especializado para a População em Situação de Rua, conhecido como Centro Pop 1, na divisa dos bairros Cidade Baixa e Menino Deus, estava de portas fechadas na tarde desta quinta-feira (1°). No portão de entrada, uma placa impressa em uma folha avisava: “hoje não haverá atendimento”, enquanto, na frente do local, seis pessoas em situação de rua descansavam e conversavam. Uma delas pede para que um amigo pegue água no Centro Pop, e ele leva a garrafinha até o portão e entrega para o guarda de segurança terceirizado, que enche e devolve, não permitindo sua entrada.

Inaugurado em 2011, o Centro Pop é um dos pilares do atendimento à população adulta em situação de rua em Porto Alegre. No local, há acompanhamento especializado, atendimento com psicólogas e assistentes sociais, além de ser realizado um plano de acolhida, com articulação em rede com outras secretarias.Além disso, lá são realizadas oficinas e grupos operativos, e os usuários têm acesso à higiene e alimentação, com banho e lanche. Doações de roupas e cobertas também são organizadas pelo Centro, que as recebe da população. O que as pessoas em situação de rua que vivem no entorno do local relatam, porém, é que o serviço está reduzido e precarizado.

Segundo os usuários, há cerca de um mês os atendimentos foram restringidos no Centro Pop 1. Em alguns dias, nem abre, em outros, abre apenas em um turno e, quando há serviço, apenas cinco pessoas são atendidas — ao invés das 30 que o local tem capacidade para receber por turno. Nesta terça-feira (30), quando o serviço estava funcionando, usuários que saíam do local afirmaram que foram apenas cinco atendidos. “Esse é o único lugar de atendimento da Farrapos para cá, se não tiver isso aqui, não temos nada. É uma precariedade, qualquer um dessa área tem o que falar desse lugar, que tá mal atendido mesmo”, afirmou Anderson, que foi uma das cinco pessoas atendidas naquele dia.

A Fundação de Assistência Social e Cidadania (Fasc) admite que houve uma redução temporária no mês de agosto por falta de pessoal, mas garante que estão sendo realizados 20 atendimentos. “Houve diminuição por questões de exoneração, licenças, transferência por readaptação funcional dos servidores, que por vezes não têm perfil, além do falecimento de um servidor. Há sim um déficit de recursos humanos, isso tudo acarretou que a proteção especial solicitasse à gestão para diminuir para 20 atendimentos pela manhã e 20 pela tarde, ao invés de 30”, afirmou o presidente Marcelo Soares.

Foto: Guilherme Santos/Sul21
Após cinco pessoas entrarem, outros na fila foram barrados nesta sexta-feira | Foto: Guilherme Santos/Sul21

Não é o que se observa ao ir até o local. Das três vezes em que a reportagem do Sul21 esteve lá, em uma delas os usuários relataram que apenas cinco estavam sendo atendidos; na segunda, estava fechado; e, na terceira, na manhã desta sexta-feira (2), foi possível presenciar a entrada de apenas cinco pessoas. Havia uma pequena fila na frente do Centro Pop, enquanto alguns aguardavam do outro lado da rua, quando o portão se abriu, por volta das 8h40. Uma mulher com uma criança e um homem cego foram os primeiros a entrar, por terem atendimento preferencial, e apenas outras três pessoas foram recebidas depois deles.

Uma usuária que frequentava o local diz que, desde que houve a redução, não conseguiu mais ir. Ela, que está com um pé quebrado após ser atropelada, relatou não ter tido preferência na fila desse e de outros serviços de assistência mesmo quando estava em cadeira de rodas e com pinos no pé. “Eles não deixam entrar mais do que cinco mesmo, não estou conseguindo ir. Teria que chegar de madrugada e ficar na fila, eu não vou mais lá”, relatou.

Para Alessandra, uma das que “acampava” em frente ao Centro Pop, o atendimento está “péssimo”. Ela relata que foi “banida” do Centro Pop por ter criticado o serviço prestado no local. “Tem poucos funcionários e parece que pra eles [Fasc] tanto faz se abrir ou não”, disse ela. Aos 28 anos, ela não sabe dizer há quanto tempo mora na rua, mas acredita que há três ou quatro anos tenha passado a viver na região do Menino Deus. “Eu comecei a morar na rua por causa de problemas em casa, antes eu nem usava pedra, eu trabalhava”, recorda.

Foto: Guilherme Santos/Sul21
Na quinta-feira, plaquinha informava que local estava fechado | Foto: Guilherme Santos/Sul21

Ela diz ter dificuldades para conseguir atendimento por parte da rede de assistência, mas que conta com o benefício do Bolsa Família para se sustentar. “Para arrumar alguma coisa aqui no Centro Pop é um parto, nem roupa eles não estão mais dando”, reclama Alessandra. Ela ainda afirma que, quando chovia, era possível entrar com seus pertences, o que não está mais sendo possível desde as últimas restrições. A dificuldade para conseguir doações de roupas foi constatada também por outras usuárias que estavam no entorno do local.

Marcos Vinícius Braunstein Pias, que há alguns meses não mora mais na rua, mas que antes frequentava o Centro Pop, conta que passa na frente do local para levar seu filho para a escola e observa que, nos últimos dias, se depara frequentemente com a placa informando que não haverá atendimento. “Morar na rua já era ruim, mas pelo jeito agora está ainda pior”, constata. Beneficiário do aluguel social, ele conta que os R$ 300 que recebe mensalmente atrasaram, mas que conseguiu permanecer na casa que aluga. Ele ainda precisa pagar mais R$ 100 mensais para quitar o valor, o que consegue trabalhando como guardador de carros, mas afirma que está em busca de um emprego fixo.

Embora não admita tão poucos – ou nenhum – atendimentos, a Fasc garante que o problema é temporário e que já está em processo para chamamento de novos servidores. Três novos educadores sociais já foram nomeados e outros 32 serão até o fim do ano, conforme o presidente da Fundação. “Tem toda uma cronologia para isso, vamos terminar com contratos terceirizados e nomear de provimento efetivo”, garantiu Marcelo. Ele afirma ainda que seria necessária a criação de mais um Centro Pop — o primeiro foi inaugurado em 2011 e o segundo, em 2013 –, mas que isso não é possível com o orçamento atual. 

Confira mais fotos:

Centro de referência especializado para população em situação de rua, o CENTRO POP 1, é criticado por moradores de rua. Local recebeu apenas 5 pessoas nesta sexta-feira. Foto: Guilherme Santos/Sul21
Centro de referência especializado para população em situação de rua recebeu apenas 5 pessoas nesta sexta-feira | Foto: Guilherme Santos/Sul21
Pessoas "acampam"em frente ao Centro Pop em dia sem atendimento | Foto: Guilherme Santos/Sul21
Alessandra é uma das pessoas que denunciam a redução dos atendimentos | Foto: Guilherme Santos/Sul21
Anderson afirma que serviço está precário. Ele foi uma das cinco pessoas a entrar na terça-feira | Foto: Guilherme Santos/Sul21
Anderson (D) afirma que serviço está precário. Ele foi uma das cinco pessoas a entrar na terça-feira | Foto: Guilherme Santos/Sul21
 Foto: Guilherme Santos/Sul21
Usuário questiona função do Centro Pop I em dias de atendimento reduzido | Foto: Guilherme Santos/Sul21
29/08/2016 - PORTO ALEGRE, RS - Centro de Referencia Especializado para População em Situação de Rua (CENTRO POP 1) é criticado por moradores de rua. Local permaneceu fechado na última semana e atende apenas 5 pessoas por dia. Foto: Guilherme Santos/Sul21
De pé quebrado, mulher em situação de rua afirma que não frequenta mais o local | Foto: Guilherme Santos/Sul21
01/09/2016 - PORTO ALEGRE, RS - Centro de referência especializado para população em situação de rua, o CENTRO POP 1, é criticado por moradores de rua. Local recebeu apenas 5 pessoas nesta sexta-feira. Foto: Guilherme Santos/Sul21
Centro de referência especializado para população em situação de rua recebeu apenas 5 pessoas nesta sexta-feira | Foto: Guilherme Santos/Sul21

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