Areazero
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19 de agosto de 2016
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11:08

Vice de última hora, Juliana Brizola leva o nome da família e a luta pela educação à chapa de Melo

Por
Luís Gomes
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11/08/2016 - PORTO ALEGRE, RS - Entrevista com a candidata a vice-prefeita, Juliana Brizola. Foto: Maia Rubim/Sul21
Candidata a vice-prefeita na chapa de Sebastião Melo, Juliana Brizola conversa com o Sul21 em seu gabinete  Foto: Maia Rubim/Sul21

O Sul21 publica, desde quarta-feira (17), os perfis dos candidatos a vice-prefeito e vice-prefeita de Porto Alegre. Confira aqui a matéria com Pedro Ruas e aqui o perfil de Silvana Conti.

Luís Eduardo Gomes

Sessenta anos depois de Leonel Brizola ingressar no Paço Municipal, chega a vez de uma das netas do trabalhista disputar uma vaga no Executivo de Porto Alegre. Escolha de última hora do PDT, a deputada estadual Juliana Brizola concorre à vice na chapa encabeçada pelo atual vice-prefeito, Sebastião Melo (PMDB). Na semana passada, ela recebeu o Sul21 em seu gabinete para uma conversa sobre o papel da política em sua família, sua trajetória pessoal e política.

Eleita vereadora e duas vezes deputada estadual, Juliana Brizola diz que a política está presente desde o início da sua vida. “Eu costumo dizer que, na minha casa, se falava de política no café do manhã, no almoço e no jantar. Até as brigas eram por política”, diz, lembrando que além do avô e do tio-avô, o ex-presidente João Goulart, grande parte de sua família é ligada à política. Seu irmão gêmeo, Leonel Brizola Neto, é vereador pelo PSOL do Rio de Janeiro.

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Filha de José Vicente, o herdeiro mais velho de Brizola, Juliana nasceu em Porto Alegre, em 1975. Aos três anos, por conta da perseguição da ditadura militar à família, foi viver no exílio, no Uruguai, onde foi alfabetizada. Ela diz ter carinho pelo país vizinho pelo tempo que lá passou, mas afirma que o período no exílio foi muito duro para sua família. “Eu credito tanto o falecimento prematuro do meu pai, aos 60 anos, quanto o da minha tia, aos 58, ao exílio”, diz. “A gente olha com um pouco de tristeza para esse período, nunca ninguém na minha família gostou muito de falar sobre isso porque é um assunto dolorido demais”, complementa.

Aos sete anos, em 1982, quando o avô se elegeu governador do Rio de Janeiro, se mudou para a capital fluminense. Mais uma vez, a política era central em sua vida. “As minhas brincadeiras de criança tinham a ver com carreatas, com bandeirinhas. Adorava fazer campanha. Me lembro de distribuir santinhos”.

Aos 18 anos, quando completou a então idade mínima para votar, por livre e espontânea decisão do avô, filiou-se ao PDT. “Eu lembro que o meu avô me chamou no apartamento dele, em Copacabana, e disse: ‘Olha, Juliana, o mais importante de completar 18 anos não é tirar a carteira’, – eu gostava muito de dirigir e ele sabia – ‘é que agora tu vai poder votar e te filiar no partido’. Ele já pegou uma ficha e já me filiei ali mesmo”, conta.

Em 2000, após completar a faculdade de Direito no Rio de Janeiro, voltou a Porto Alegre para cursar uma pós-graduação em Ciências Criminais na PUCRS. “Vim para estudar, na verdade. Acabei me envolvendo politicamente, constituindo família e ficando”, disse.

Uma Brizola, em Porto Alegre, logo foi recebida pelo PDT municipal e passou a trabalhar no partido, primeiro na assessoria jurídica, depois oferecendo seu nome para concorrer a cargos públicos. Em 2008, foi a vereadora do PDT eleita com mais votos. “Acho que Porto Alegre fez uma homenagem ao meu avô”, diz. Em 2010, foi a deputada mais votada do partido. “Eu vejo que a população do RS tem um saudosismo muito grande, um carinho muito grande por ele. Em tempos tão duros para os políticos, sei que tem gente que tem dificuldade inclusive de andar na rua, isso comigo não acontece e eu sei que é por causa dele”.

11/08/2016 - PORTO ALEGRE, RS - Entrevista com a candidata a vice-prefeita, Juliana Brizola. Foto: Maia Rubim/Sul21
Quadro de campanha de Leonel Brizola decora o gabinete Juliana Brizola na Assembleia Legislativa | Foto: Maia Rubim/Sul21

Vice de última hora

Juliana não foi o primeiro o nome do PDT apresentado para formar a chapa com Sebastião Melo. Na verdade, o PDT não pretendia reeditar a aliança e a própria deputada defendia candidatura própria – seu nome chegou a ser cogitado para concorrer à Prefeitura. Mas, na esteira de pesquisas de intenção de voto encomendadas pelo partido que o colocavam em boa posição e com baixa rejeição, Vieira da Cunha acabou anunciando sua candidatura a prefeito em 30 de maio. Sem conseguir firmar alianças, o ex-deputado e secretário de Estado decidiu abandonar a disputa no final de julho, abrindo as portas para uma reedição da chapa PDT-PMDB, desta vez com o segundo partido encabeçando a coligação.

“Nesse momento, o presidente nacional do partido [Carlos Lupi] me ligou perguntando se eu tinha interesse em ser vice. Eu disse que eu tinha interesse naquilo que o partido quisesse. Aí apareceram outros nomes”, conta Juliana.

O nome que surgiu foi o do vereador e ex-secretário de Obras da Capital Mauro Zacher, com quem a deputada se envolveu em disputas e troca de acusações no período da CPI da Juventude na Câmara de Vereadores. Aprovado em prévia e depois na convenção do partido, ele chegou a ser anunciado como companheiro de chapa de Melo. Mas, por decisão da cúpula nacional do PDT, seu nome foi substituído pelo de Juliana, para surpresa de muitos, e inclusive da própria deputada. “No outro dia, eu estava rumo ao interior, o presidente me ligou perguntando se eu ainda queria, se eu aceitava. Eu disse, de novo, que se era uma missão partidária, por óbvio que eu aceitava”, afirma.

11/08/2016 - PORTO ALEGRE, RS - Entrevista com a candidata a vice-prefeita, Juliana Brizola. Foto: Maia Rubim/Sul21
Juliana Brizola diz que a bandeira da educação também é sua principal causa política | Foto: Maia Rubim/Sul21

Apesar do desconforto gerado dentro do PDT, com Zacher tendo divulgado nota pública dizendo que via com “indignação e estranheza o uso de manobras políticas, alheias aos interesses do município”, Juliana minimiza a questão e descarta a possibilidade de racha no partido. “Quem está em partido sabe que essas disputas sempre acontecem. A minha missão agora é unificar o partido. Eu estou trabalhando para isso, por certo terão muitos que não se sentirão na unificação, mas eu te garanto que a maioria se sentirá. O que não pode existir, como diria um velho amigo meu, é a mal querência”, afirma.

Juliana reconhece que tem “dificuldades” em entender algumas posições nacionais do PMDB e também do governo Sartori, da qual faz parte da base aliada, “sobretudo na questão do funcionalismo público”. No entanto, salienta que esteve presente na formação da atual coligação que administra Porto Alegre desde o governo José Fogaça, de quem foi secretária da Juventude.

“Por óbvio que eu devo ter vários pensamentos diferentes do Sebastião Melo. Eu enxergo isso como algo positivo. Os funcionários públicos podem saber que terão uma vice-prefeita defensora intransigente dos direitos do funcionalismo público e do serviço público, porque o funcionário público não é nada além de quem oferta o serviço público”.

A bandeira da educação

Apesar da influência do avô ser uma constante em sua vida e do sobrenome ser indissociável da figura de Leonel, Juliana pondera que há diferenças entre eles. “Eu sempre digo, além de seu ser mulher, o que me torna diferente dele, eu sou de outra geração”. Por outro lado, reconhece que compartilha e é influenciada pelas causas defendidas pelo velho Brizola. “Analisando e ouvindo muita coisa que ele falava, é super atual o discurso dele. Os problemas continuam os mesmos. Desde que eu me elegi pela primeira vez, elegi a causa da educação, porque foi a causa da vida dele. Ele acreditava muito em uma educação pública de qualidade e eu também acredito, não é só porque era uma bandeira dele”, afirma.

A deputada avalia que Porto Alegre, assim como todas outras capitais do Brasil, tem muito a melhorar nessa área e que é preciso avançar mais na direção da escola de tempo integral. “Aqui em Porto Alegre, tem o contraturno, que é bem diferente da escola em tempo integral que foi pensada pelo professor Darcy Ribeiro, aquela escola que é referência: o aluno entra de manhã e fica o dia inteiro, almoça, tem atendimento odontológico, faz os deveres de casa, tem as oficinas, etc. Mas não é com voluntários. Eu não acredito em voluntários na educação. Acho que a educação tem que ser bem paga. Na escola particular, ninguém é voluntário, são professores com 40h”, afirma.

11/08/2016 - PORTO ALEGRE, RS - Entrevista com a candidata a vice-prefeita, Juliana Brizola. Foto: Maia Rubim/Sul21
Juliana destaca o papel da maternidade em sua vida | Foto: Maia Rubim/Sul21

Ainda sobre educação, Juliana diz que “não vê com bons olhos” os projetos da “Escola Sem Partido”, apresentados na Assembleia Legislativa pelo deputado Marcel Van Hattem (PP) e na Câmara Municipal pelo vereador Valter Nagelstein (PMDB). “Eu não vejo com bons olhos porque acho que a escola é um lugar onde tudo tem que ser debatido. A escola é o lugar onde tu adquire conhecimento, é a troca entre os colegas, com professores”, diz.

Maternidade

Mãe de dois filhos – o primeiro deles nascido quando era vereadora -, Juliana entrou para a história do parlamento gaúcho ao ser, em 2014, a primeira deputada a tirar licença-maternidade do exercício do cargo, um direito que as mulheres parlamentares sequer tinham no início da legislação passada. “A deputada Ana Affonso, do PT, que engravidou antes de mim, detectou o problema e apresentou um projeto [de licença-maternidade]. Ela não pode usufruir do projeto. Teve que trazer a filhinha dela com 12 dias e levar para o plenário. Eu fui a primeira que usufruí disso”, relata.

Dentro de um ambiente ainda muito masculino e machista, ela diz que é importante que as parlamentares incorporem o caráter materno ao exercício do mandato. “Eu acho que a gente vive um tempo de mudança, a política é um lugar que tem que ter criança, tem que ter mulher, tem que ter todo tipo de representação”, afirma. Os filhos também influenciaram a parlamentar Juliana. “Hoje, eu sou uma pessoa muito mais tolerante, que não toma nenhuma decisão no calor da briga ou da emoção. Eu sei que tem uma noite no meio. Também me fortaleceu mais ainda a convicção da luta pelas crianças, que elas merecem um olhar mais atento daqueles que trabalham com o público. Não é porque elas são o amanhã, é porque elas estão aí, são o presente. Um país que não cuida das suas crianças é um país que está em decadência”.


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