Débora Fogliatto
Vinte e nove deputados de dez partidos identificados com pautas conservadoras, muitos deles integrantes da bancada evangélica, protocolaram na última quarta-feira (18) um projeto que tem como objetivo revogar o decreto que dá o direito de uso do nome social a pessoas transexuais em órgãos públicos do governo federal. Os parlamentares que assinam o projeto de decreto (PDC) 395/2016 são dos partidos PSDB, DEM, PSB, PSC, PV, PR, PRB, PROS, PTN e PHS. O direito havia sido conquistado em abril deste ano, determinado pela presidenta Dilma Rousseff antes de seu afastamento.
Com o decreto atualmente em vigor, transexuais e travestis podem usar seu nome social em todos os órgãos públicos, autarquias e empresas estatais federais, medida que vale para funcionários e também usuários. Os deputados argumentam que “a matéria atinente a nomes, sua alteração ou abreviatura encontra lugar adequado em lei ordinária federal” e, portanto, deveria ser tratado em nível de lei e não de decreto. Para eles, a presidenta teria interferido em assunto que deve ser tratado pelo Legislativo.
O nome social, no entanto, não corresponde à mudança no registro civil. É o nome pelo qual as pessoas travestis e transexuais, que não se identificam com o gênero que lhes foi atribuído ao nascer, preferem ser chamadas. Em geral, os nomes cujo uso havia sido autorizado correspondem ao gênero com o qual a pessoa se identifica. O decreto permite que este seja o nome usado em crachás, atas e ao preencher formulários, por exemplo.
Exatamente pelo fato de o decreto não alterar o registro civil, a advogada Luisa Stern, mulher transexual e militante dos Direitos Humanos, aponta que a justificativa jurídica dos deputados é equivocada. “Eles usam um argumento jurídico errado, dizendo que existe a Lei dos Registros Públicos e um decreto não poderia mudar uma lei. Mas esse decreto não interfere no registro. É uma forma de tratamento dentro da administração pública, e nesse aspecto é perfeitamente possível, nas atribuições da chefa do executivo, estabelecer normas para como as pessoas seriam tratadas na administração pública”, explica.
Os parlamentares têm o poder de derrubar um decreto presidencial, explica Luisa, mas apenas se tiverem fundamentação e argumentos. “Nesse caso, estão usando um argumento falso”, afirma. Além disso, a motivação dos deputados também é questionável, aponta ela. “Certamente a motivação é o preconceito. O governo ter feito esse decreto é uma medida que visa garantir princípios constitucionais, da dignidade da pessoa humana, do princípio da não-discriminação. Os deputados que querem revogar a medida não estão respeitando nada disso”, aponta Luisa.
Entre os signatários está o presidente da Frente Parlamentar Evangélica, João Campos (PRB-GO), assim como diversos deputados que a compõem, como Marco Feliciano (PSC-SP) e Pastor Eurico (PHS-PE). A proposta está atualmente com o presidente interino da Câmara, Waldir Maranhão (PP-MA), que deve decidir em quais comissões a proposta precisa ser discutida antes de ser apreciada em plenário.
Nas redes sociais, já há mobilizações contrárias à possibilidade de revogação do decreto, como a página “Nome Social é um Direito“, criada nesta sexta-feira (20) e que já conta com quase 3 mil curtidas.
Deputados que assinam a proposta de decreto:
João Campos – PRB/GO
Evandro Gussi – PV/SP
Paulo Freire – PR/SP
Diego Garcia – PHS/PR
Gilberto Nascimento – PSC/SP
Flavinho – PSB/SP
Geovania de Sá – PSDB/SC
Pastor Eurico – PHS/PE
Ronaldo Nogueira
Pr. Marco Feliciano – PSC/SP
Givaldo Carimbão – PHS/AL
Professor Victório Galli – PSC/MT
Eros Biondini – PROS/MG
Carlos Andrade – PHS/RR
Missionário José Olimpio – DEM/SP
Ezequiel Teixeira – PTN/RJ
Elizeu Dionizio – PSDB/MS
Anderson Ferreira – PR/PE
Marcelo Aguiar – DEM/SP
Alan Rick – PRB/AC
Ronaldo Fonseca – PROS/DF
Marcos Rogério – DEM/RO
Sóstenes Cavalcante – DEM/RJ
Tia Eron – PRB/BA
Jony Marcos – PRB/SE
Rosangela Gomes – PRB/RJ
Carlos Gomes – PRB/RS
Silas Câmara – PRB/AM
Takayama – PSC/PR