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31 de maio de 2016
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19:37

Deputados criam comissão para mediar diálogo entre governo e estudantes

Por
Luís Gomes
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31/05/2016 - PORTO ALEGRE, RS - Audiência Pública sobre obras nas escolas da rede estadual de ensino, proposta pelo deputado Adão Villaverde (PT). Foto: Joana Berwanger/Sul21
Ocupações foram debatidas em audiência pública sobre obras nas escolas da rede estadual de ensino | Foto: Joana Berwanger/Sul21

Luís Eduardo Gomes

Em audiência pública realizada na manhã desta terça-feira (31) para discutir a precarização dos estabelecimentos escolares, deputados da Comissão de Educação, Cultura, Desporto, Ciência e Tecnologia da Assembleia Legislativa decidiram criar uma subcomissão especial para mediar negociações entre o governo do Estado e representantes das escolas estaduais ocupadas.

Inicialmente, a audiência, convocada em fevereiro, deveria tratar da questão das obras nas escolas, mas diante do cenário em que mais de 150 instituições de ensino estaduais estão ocupados por estudantes, acabou abordando as reivindicações dos jovens.

Em múltiplas intervenções, jovens relatam o cenário de precariedade das escolas públicas. Uma das principais reclamações dizia respeito à falta refeitório e de merenda, que, em alguns casos, seria só uma bolacha.

Também foram listados diversos problemas físicos e materiais. Um professor, que também é pai de alunos em escolas públicas, relatou, por exemplo, que na escola onde dá aulas, em Viamão, os alunos precisaram empilhar livros em frente a uma janela com vidros quebrados para bloquear a entrada de vento frio.

Foto: Juarez Junior/Agência ALRS
Foto: Juarez Junior/Agência ALRS

Após cada fala (e às vezes durante os pronunciamentos), os estudantes entoavam cantos como “Educação sucateada, nossa resposta é escola ocupado”; “Ocupar e resistir”; “Não tem arrego, privatiza a minha escola e eu tiro o seu sossego”; e “Mãe, pai, tô na ocupação, só pra dizer que eu cuido bem da educação”.

A presidenta do Cpers Sindicato, Helenir Schurer, afirmou ainda que a Comissão Especial deve obter do governo a garantia da integridade física dos estudantes, assegurando que não usará mais a truculência nas ocupações de escolas, como já ocorreu em Porto Alegre e cidades do interior.

O estudante Pedro Correia, vice-presidente da União Brasileira de Estudantes Secundaristas (Ubes), veio da Bahia para participar do encontro e defendeu que o governo deve estar disposto a dialogar com os estudantes dentro das escolas. “Um governo preocupado com o povo se propõe a dialogar dentro das escolas”, disse, salientando que esta interlocução não deve se limitar ao momento das ocupações. Ao fim de sua fala, ele ainda ironizou: “Muito mais Paulo Freire, menos Frota”, em alusão ao fato de o Ministro da Educação, Mendonça Filho (DEM), ter se reunido recentemente com o ator Alexandre Frota para ouvir propostas para a educação no país.

Vieira da Cunha durante a audiência | Foto: Juarez Junior/Agência ALRS
Vieira da Cunha durante a audiência | Foto: Juarez Junior/Agência ALRS

Em sua fala, o secretário de Educação, Vieira da Cunha (PDT), que deve deixar o cargo ainda esta semana para concorrer à Prefeitura, reconheceu a “precariedade” da infraestrutura da maioria das escolas e lembrou que há escolas centenárias na rede e que “ao longo do tempo não houve investimento necessário”. Ele também reconheceu que, devido aos problemas financeiros do Estado, em 2015, só foram investidos R$ 91 milhões em obras escolares, mas ponderou que esse valor deve mais do que dobrar neste ano, uma vez que o orçamento de 2016 designou R$ 234 milhões para as reformas.

O secretário salientou que um grande problema enfrentando pela Seduc é a falta de servidores para a realização de projetos de reformas nas escolas. Vieira disse que, devido a isso, o governo está tentando resgatar o Plano de Necessidade de Obras (PNO) desenvolvido na gestão passada para tocar 79 grandes reformas em escolas, sendo que o objetivo é licitar 13 ainda neste ano.

No entanto, ele afirmou que, sem que sejam criadas novas fontes de financiamento, a situação de precariedade da educação não será resolvida. Em razão disso, ele lembrou que já apresentou uma proposta ao Congresso Nacional de regulamentação de um imposto sobre grandes fortunas para financiar a educação. “Se nós nos unirmos e carimbarmos esse dinheiro para a educação, tenho certeza que conseguiremos o apoio da sociedade”, disse, pedindo apoio aos estudantes e sendo aplaudido.

Comissão irá mediar negociação

Ao fim do encontro, por proposta da deputada Stela Farias (PT), os parlamentares decidiram criar uma subcomissão para mediar a interlocução das pautas do movimento estudantil com o governo do Estado e que deve contar também com representantes da Assembleia, do Cpers, dos pais e do Ministério Público.

31/05/2016 - PORTO ALEGRE, RS - Audiência Pública sobre obras nas escolas da rede estadual de ensino, proposta pelo deputado Adão Villaverde (PT). Foto: Joana Berwanger/Sul21
Deputado Adão Villaverde (PT) foi o proponente da audiência | Foto: Joana Berwanger/Sul21

Ficou definido também que a subcomissão, que deve ser liderada pelo deputado Tiago Simon (PMDB), presidente da Comissão de Educação, irá ter como pauta as reivindicações físicas e materiais relacionadas às escolas, a questão da falta de professores, a retirada dos PL 190, da chamada Escola Sem Partido, e 44, que abre as portas para cessão da administração de colégios públicos para organizações sociais (OSS) sem fim lucrativo, a garantia do respeito à integridade física dos participantes de ocupação e as pautas dos professores em greve incorporadas pelo movimento
estudantil, entre outras.

“Pela singularidade do momento político, aquela pauta específica dos estudantes juntou-se à pauta dos professores e tanto o movimento de professores como de alunos, a partir de agora, trabalham uma pauta única”, avaliou o deputado Adão Villaverde (PT), proponente da audiência. “Do ponto de vista do conteúdo, amarrou-se uma pauta de mobilização entorno das demandas dos alunos. A comissão tem um conteúdo, ela não vai recuar disso. Se o governo vai absorver ou não, aí é um debate que vai depender do governo”, complementou Villa.

Uma primeira reunião da subcomissão deve ocorrer em breve. Os deputados solicitaram que os estudantes preparem uma listagem de todos os problemas registrados em cada escola antes de marcar uma data para o encontro. Também foi solicitado que os alunos apresentassem relatos de casos de violência, incluindo atos praticados por policiais militares.

Vieira da Cunha reassumiu o compromisso público de que o Estado não irá tratar as ocupações como caso de polícia. “Nós não queremos reprimir, queremos conversar e dialogar. Conversando nós vamos nos entender”, disse. Por outro lado, salientou que os estudantes também devem respeitar o direito dos alunos que desejam ter aula. “A comunidade escolar já está se impacientando em muitas escolas porque os alunos também estão querendo aula. Assim como existe o direito dos ocupantes de se manifestar e protestar de um lado, também tem o direito dos alunos que querem ter aula de outro”, disse.

31/05/2016 - PORTO ALEGRE, RS - Audiência Pública sobre obras nas escolas da rede estadual de ensino, proposta pelo deputado Adão Villaverde (PT). Foto: Joana Berwanger/Sul21
Representante dos estudantes, Eduardo Moraes defendeu que seja formada uma ampla comissão para debater com o governo | Foto: Joana Berwanger/Sul21

Ele considerou positiva a decisão da AL de criar uma comissão para promover o diálogo entre as partes. “O que nós já buscávamos desde o início do processo de ocupações era uma interlocução, um contato mais direto com os alunos para conhecer a pauta de reivindicações, poder colocar o que a nossa gestão vem fazendo, principalmente na questão da infraestrutura, e criar esse canal com os estudantes de construção de uma saída negociada para essa questão das ocupações”, disse, salientando que sua pasta vinha tendo “dificuldades de encontrar uma interlocução” e que estava disposto a manter o diálogo em qualquer colégio do Estado.

O secretário ainda valorizou o movimento de ocupações como uma forma de amadurecer o debate sobre a educação estudantil. “É um processo que também vai colaborar para que haja avanços na formação tanto da consciência política como para a consciência cidadã desses jovens e da comunidade escolar que está envolvida como um todo nesse processo”, disse.

Eduardo Moraes, estudante universitário e representante da Ubes na audiência, considerou positiva a criação da comissão, mas propôs que seja feita uma reunião para escolher uma comissão com estudantes de todo o Estado para “tomar a frente” das conversas. “Vamos chamar uma reunião estadual de ocupações, tirar uma comissão muito ampla, que represente todo o estudante gaúcho e ela vai mostrar qual o melhor caminho para a educação”, disse.


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