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13 de setembro de 2015
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22:28

Desastre humanitário pode se agravar ainda mais com deterioração interna da Síria

Por
Sul 21
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Segundo a ONU, já há cerca de 4,088 milhões de refugiados sírios em outros países, em sua maioria vivendo em situação de extrema pobreza. (Fotos: Alto Comissariado das Nações Unidas para Refugiados (ANCUR).
Segundo a ONU, já há cerca de 4,088 milhões de refugiados sírios em outros países, em sua maioria vivendo em situação de extrema pobreza. (Fotos: Alto Comissariado das Nações Unidas para Refugiados (ANCUR).

Marco Weissheimer

A Europa está recebendo a conta por décadas de políticas desastradas no Oriente Médio e na África, patrocinadas pelos Estados Unidos e por países da União Europeia. Milhares de refugiados enfrentam as águas do Mediterrâneo, colocando em risco suas próprias vidas, fugindo da guerra e da fome em seus países. Eles seguem chegando às centenas todos os dias, vindos de diferentes lugares. Somente neste sábado (12), a cidade de Munique, no sul da Alemanha, recebeu 200 novos refugiados, deixando as autoridades municipais em pânico. “Nós chegamos ao limite extremo da nossa capacidade de acolhimento”, disse um porta-voz da polícia local ao jornal Le Monde. Essa nova leva de refugiados veio da região dos Balcãs, passando pela Hungria e pela Áustria. Ao todo, cerca de 13 mil refugiados já teriam chegado a Munique.

A Alemanha se tornou o destino buscado por milhares de pessoas após a decisão do governo alemão de ampliar a acolhida de refugiados, em especial aqueles vindos da Síria. O vice-chanceler e ministro da Economia alemão, Sigmar Gabriel, anunciou semana passada que o país já recebeu, neste ano, 450 mil refugiados, dos 800 mil previstos em 2015. Segundo Gabriel, só nos primeiros oito dias de setembro, a Alemanha recebeu 37 mil pedidos de asilo, enquanto no mês anterior foram recebidos 105 mil. O ministro alemão pediu aos empresários, sindicatos e representantes políticos que lancem um plano de formação para refugiados em resposta a uma dos principais problemas da economia alemã: a falta de mão-de-obra qualificada. O déficit de mão-de-obra, de até 6 milhões de pessoas, advertiu Gabriel é uma ameaça para o bem-estar da economia e de toda a sociedade alemã.

Segundo a Organização das Nações Unidas (ONU), o mundo está vivendo a maior crise migratória de refugiados desde a Segunda Guerra Mundial.
Segundo a Organização das Nações Unidas (ONU), o mundo está vivendo a maior crise migratória de refugiados desde a Segunda Guerra Mundial.

Drama dos refugiados não é só em solo europeu

O drama dos refugiados não se limita, porém, ao território europeu. Segundo a Organização das Nações Unidas (ONU), o mundo está vivendo a maior crise migratória de refugiados desde a Segunda Guerra Mundial. Somente em 2014, diz a ONU, 59,5 milhões de pessoas foram forçadas a abandonar suas casas e seus países devido à guerra e a perseguições políticas e étnicas. Em 2015 esse número deve ser ainda maior.

Na atual onda de migração forçada para a Europa, os países que lideram o ranking do êxodo são Afeganistão, Síria, Somália, Sudão e Iraque. Mas os países europeus não são o único destino dessas famílias. Segundo estimativa da Anistia Internacional, 95% dos refugiados sírios foram para a Turquia, Líbano, Jordânia, Iraque e Egito. A Turquia já teria recebido 2 milhões de sírios e o Líbano mais de um milhão. Somente este ano, mais de 300 mil pessoas arriscaram suas vidas para cruzar o mar Mediterrâneo. Mais de 2.600 não sobreviveram à perigosa travessia, incluindo um menino de 3 anos de idade, Aylan, cuja foto comoveu o mundo.

Essa tragédia humanitária ganhou maior visibilidade quando transbordou para solo europeu, ganhando uma exposição midiática imensamente maior. Só dois países, Alemanha e Hungria, já receberam mais pedidos de asilo nos últimos meses do que em todo o ano passado. Segundo levantamento divulgado pela BBC, no total, 438 mil refugiados já tinham pedido asilo em países europeus até o final de julho deste ano. Em todo o ano passado foram 571 mil. Após a chegada de dezenas de milhares de novos refugiados nas últimas semanas, esse número já foi superado largamente. Segundo o Alto Comissariado das Nações Unidas para Refugiados (ACNUR), a Alemanha continua sendo o destino preferido dos refugiados que chegam à Europa. A Hungria ocupa o segundo lugar, como um ponto de passagem para entrar na Europa Ocidental por via terrestre.

Solidariedade e xenofobia

A chegada de milhares de refugiados vem despertando tanto a solidariedade quanto a xenofobia. Na Hungria, algumas cenas tiveram repercussão internacional nos últimos dias. Um vídeo divulgado na última sexta-feira (11), mostra cerca de 150 pessoas sendo alimentadas como animais em um curral, no campo de Roszke, perto da fronteira com a Sérvia. No vídeo, filmado às escondidas por voluntários austríacos, policiais húngaros usando capacetes e máscaras, jogam pão para os refugiados cercados por grades. “Pareciam animais sendo alimentados num curral, uma Guantanamo na Europa”, disse à Agência France Press o austríaco Alexander Spritzendorfer, cuja mulher, Michaela, gravou as imagens. O casal foi ao campo de Roszke para levar comida, roupa e medicamentos aos milhares de refugiados que têm atravessado a fronteira.

Esse mesmo campo virou notícia internacional esta semana, com a jornalista Petra Lászlo, que trabalhava para a televisão N1 ligada ao movimento húngaro de extrema-direita Jobbik, agredindo refugiados com pontapés e rasteiras. A fronteira entre a Hungria e a Sérvia tem sido um foco de tensões e ameaças nas últimas semanas. O primeiro ministro da Hungria, Viktor Orbán, do partido de direita Fidesz-União Cívia Húngara anunciou que o governo passou a controlar a fronteira passo a passo. “Vamos enviar a polícia e depois, se conseguirmos a aprovação do Parlamento, enviaremos o Exército”, afirmou. Na última sexta-feira, Orbán anunciou que a partir deste dia 15 de setembro, a polícia vai começar a prender todas as pessoas que entrarem de forma ilegal no país. As penas podem chegar até cinco anos de prisão.

Situação na Síria se agrava

O drama dos refugiados pode se agravar ainda mais nas próximas semanas. A deterioração da situação interna na Síria e em países vizinhos está forçando milhares de pessoas a arriscar tudo em viagens perigosas para a Europa, adverte o Alto Comissariado da ONU para Refugiados. “À medida que a crise se aprofunda em seu quinto ano sem solução política à vista, o desespero aumenta, e a esperança torna-se artigo raro. Dentro da Síria, os últimos meses têm sido brutais. A luta se intensificou em quase todas as províncias”, disse em Genebra a porta-voz do ACNUR, Melissa Fleming. Já há cerca de 4,08 milhões de refugiados sírios em outros países, vivendo em situação de extrema pobreza.

Segundo relato do ACNUR, existem 4,088 milhão de refugiados sírios registrados em países vizinhos da Síria, incluindo 1,938 milhão na Turquia, 1,113 milhão no Líbano, 630 mil na Jordânia, 250 mil no Iraque, 132 mil no Egito – além de outros 25 mil em países do Norte da África. Apenas 12% dos refugiados de toda a região vivem em campos de refugiados formalmente estabelecidos. O relato do órgão da ONU ajuda a entender porque milhares de famílias arriscam a própria vida para tentar fugir. Na verdade, suas vidas já estão em alto risco na situação em que se encontram:

“Em meio à escalada de violência, pessoas perderam seus meios de subsistência, bem como suas casas”, acrescentou a porta-voz. Está aumentando o desemprego em todos os setores da economia síria que ainda resistem, como também a inflação associada a uma queda da moeda local – a libra síria perdeu 90% de seu valor ao longo dos últimos quatro anos. Na maior parte da Síria, a eletricidade está disponível durante poucas horas do dia, quando existe. Muitas regiões lutam contra a escassez de água. Mais da metade da população vive em extrema pobreza”.

Mais da metade da população da Síria vive em situação de extrema pobreza”, segundo a ONU.
Mais da metade da população da Síria vive em situação de extrema pobreza”, segundo a ONU.

O chefe da Agência da ONU para Refugiados, António Guterres, reafirmou na semana passada que a União Europeia enfrenta um “momento decisivo” e precisa adotar uma estratégia comum para enfrentar a atual crise de refugiados e migrantes. Segundo Guterres, as chegadas ao Mediterrâneo e em outros países da União Europeia representam o maior fluxo de refugiados para a Europa durante décadas. “A Europa não pode continuar respondendo a esta crise com uma abordagem fragmentada. Nenhum país pode fazer isso sozinho, e nenhum país pode se recusar a participar desta resposta”, afirmou em nota oficial divulgada pelo ACNUR.


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