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26 de junho de 2015
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12:00

Contra feminicídio, Porto Alegre participa do movimento “Ni una menos”

Por
Sul 21
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Contra feminicídio, Porto Alegre participa do movimento “Ni una menos”
Contra feminicídio, Porto Alegre participa do movimento “Ni una menos”
Foto: Ni Una Menos/ Facebook
Em Buenos Aires, centenas de milhares de pessoas protestaram em frente ao Congresso, que também se iluminou de roxo, contra as mortes de mulheres por violência de gênero | Foto: Ni Una Menos/ Facebook

Débora Fogliatto

O Brasil é o 16º país da América Latina a classificar o feminicídio — em lei sancionada em março —  como crime hediondo*, embora seja o 7º país do mundo entre os com maior índice desse crime**. Segundo dados do Instituto de Pesquisa em Economia Aplicada (Ipea), uma mulher morre a cada uma hora e meia por causas violentas no país. No período de 2001 a 2011, estima-se que ocorreram mais de 50 mil feminicídios, o que equivale a, aproximadamente, 5.000 mortes por ano. Diferente da maioria dos homicídios, o feminicídio é especificamente cometido por razões de gênero, ou seja, acontece em duas hipóteses: decorrente da violência doméstica e familiar; ou do menosprezo ou discriminação à condição de mulher.

Apesar de o Brasil ter índices maiores desse crime do que Argentina, Chile e Uruguai, esses três países se levantaram contra esta violência no último dia 3 junho, a partir da mobilização “Ni una menos” (“Nenhuma a menos). A iniciativa veio de um grupo de jornalistas argentinas, que começaram a publicizar o tema em meios feministas e pelas redes sociais. Segundo a organização argentina de direitos das mulheres Casa del Encuentro, o país registrou 277 feminicídios em 2014, ou seja, há um caso a cada 31 horas. A principal bandeira do movimento é a regulamentação de uma lei que existe desde 2009 no país, determinando a proteção integral para mulheres vítimas de violência.

Um dos casos recentes que chamou mais atenção na Argentina foi a morte de Patrícia Pappa, assassinada por seu ex-namorado na cidade de Córdoba em novembro do ano passado. Ele a surpreendeu quando ela voltava do trabalho para casa, apunhalando-a três vezes. Em seguida, colocou fogo nela, ainda viva, e a deixou deitada, queimando e gritando, enquanto saiu caminhando tranquilamente do edifício. O assassino, Marcelo Sambrenil, disse que matou Patrícia porque ela “o enganou”. A irmã de Patrícia, Paola Pappa, foi uma das pessoas que se somou à mobilização Ni una menos.

Foto: Ni Una Menos/ Facebook
“A cada 30 horas matam uma mulher apenas por ser mulher”, diz cartaz em Buenos Aires. No Brasil, é a cada uma hora e meia | Foto: Ni Una Menos/ Facebook

Mas o estopim para o movimento foi a morte da adolescente Chiara Páez, de 14 anos, na cidade de Rufino, província de Santa Fé, na Argentina. Ela estava grávida de quatro meses e foi morta por seu namorado, Manuel Mansilla. O crime foi descoberto apenas três dias após seu desaparecimento, quando ela foi encontrada enterrada no quintal da casa do jovem. Logo, celebridades do país começaram a aderir à causa, inclusive a presidente Cristina Kirchner, o jogador de futebol Lionel Messi, a ativista Estela de Carlotto, o músico Fito Paez e o cartunista Liniers. Em Buenos Aires, a marcha do dia 3 de junho se iniciou às 17h, entrou noite adentro e reuniu 300 mil pessoas, segundo a imprensa local.

Brasil***

No Brasil, as estatísticas são ainda piores, enquanto a violência dos crimes é a mesma. A maior parte (quase 70%) dos feminicídios são perpetuados dentro de casa, por maridos ou familiares. Há cerca de um mês, na cidade de Castelo do Piauí, quatro garotas foram estupradas, agredidas e arremessadas de um penhasco. Uma delas morreu em consequência dos ferimentos e outras duas passaram por cirurgias. Elas teriam saído para tirar fotos em um ponto turístico distante da zona urbana, quando foram abordadas por cinco homens, que cortaram os pulsos das meninas, furaram mamilos e olhos e as arremessaram de cima de um morro. A pequena cidade ficou revoltada com o crime e protestou na frente da delegacia local.

Mas no resto do país, apesar da gravidade do crime, o assunto não repercutiu tanto. O caso foi usado principalmente pelos defensores da redução da maioridade penal, pois quatro dos cinco agressores eram menores de idade. No Facebook, a página “Ni una menos Brasil” tem pouco mais de 4 mil curtidas, e movimentações para denunciar a violência contra a mulher não foram registradas em muitas cidades desde o crime.

Porto Alegre

Em Porto Alegre, mulheres se organizam de forma independente para realizar uma marcha neste sábado (27), com o mote do “Ni Una Menos”. O ato se inicia na abertura Conferência Estadual de Políticas para as Mulheres, que busca determinar as prioridades a serem levadas para a Conferência Nacional, que ocorre em outubro. A concentração começa na Assembleia Legislativa, onde estará ocorrendo o evento, às 10h, e às 13h parte em marcha para o Parque da Redenção.

Uma das organizadoras, a estudante de Saúde Coletiva da UFRGS Lara Werner, indigna-se com o fato de a violência contra as garotas do Piauí estar sendo usado para defender a redução da maioridade. “A pauta do que aconteceu no Piauí tem sido cooptada pelo grupo de pessoas que são favoráveis à redução da maioridade penal. Isso é uma coisa absurda, um oportunismo sem tamanho. Isso não é apoiado, é rechaçado por nós”, afirmou.

Para ela, o que motivou a criar o evento no Facebook e buscar organizar uma marcha é o “sentimento de urgência” relacionado à violência contra as mulheres no Brasil. “Na Argentina as pessoas foram para a rua, se indignaram com um feminicídio a cada 35 horas, enquanto aqui é a cada uma hora e meia. Estamos vivendo uma situação bem dramática no Estado e no país”, lamentou.

No evento do Facebook, há 1.800 pessoas confirmadas, mas Lara considera que “se aparecer metade” já está feliz. “Mil pessoas  indo para a rua no sábado já é bastante aqui. Queremos que outros grupos regionais se articulem, não é fácil organizar uma marcha. Na Argentina, foi muito importante o movimento feito pelos jornalistas, que promoveram essa chamada”, refletiu ela, dizendo que o ato é também uma provocação para que outras localidades façam o mesmo.

*Dado da ONU
**Dado do Mapa da Violência de 2012: Homicídios de Mulheres no Brasil
****Com informações do G1

 

 


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