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30 de abril de 2015
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22:40

Deputado retoma projeto que veta desapropriação de terras para indígenas

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Sul 21
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A proposta é do deputado Elton Weber, que na úlitma reunião da CCJ recebeu pedido para retirada da proposta pelos indígenas|Marcelo Bertani/AL
A proposta é do deputado Elton Weber, que na última reunião da CCJ, terça-feira, recebeu pedido para a retirada da proposta pelos indígenas|Marcelo Bertani/AL

Jaqueline Silveira

Uma proposta vetando a desapropriação de propriedades de pequenos agricultores e pecuaristas familiares a fim de destiná-las a indígenas e a quilombolas no Rio Grande do Sul deve provocar um debate acalorado na Assembleia Legislativa. Isso porque há um conflito entre agricultores e índios pela posse de terras, principalmente no norte do Estado, não resolvido até agora. O mesmo  projeto sobre o tema foi apresentado em 2014 pelo deputado Heitor Schuch (PSB) e recebeu parecer favorável na Comissão de Constituição e Justiça (CCJ), mas não chegou a ir a plenário e acabou arquivado. Como Schuch foi eleito para a Câmara Federal, coube ao deputado estadual Elton Weber (PSB) reapresentá-lo.

A proposta está tramitando na CCJ e deverá receber parecer nos próximos dias. Na última reunião da comissão, realizada na terça-feira (28), representantes das comunidades indígenas e quilombolas estiveram presentes para acompanhar o assunto. Na oportunidade, eles pediram a Weber a retirada do projeto, mas o deputado informou que a proposta continuará tramitando no Legislativo. “É um tema profundo, tem divergências fortes, eu estou representando o anseio de uma categoria”, argumentou o deputado, que foi presidente da Federação dos Trabalhadores na Agricultura no Rio Grande do Sul (Fetag).

O socialista sustentou, ainda, que apresentou o projeto com o fim de contribuir para a resolução dos conflitos, uma vez que o poder público não tem tomado providências para solucionar a questão das demarcações. “Queremos ajudar a resolver os conflitos, a Nação não está dando conta de resolver. Onde há conflitos não pode deixar se digladiarem”, justificou Weber, referindo-se às disputas de terras no interior do Estado. Conforme ele, ocorreram várias reuniões com o Estado e a União “com boas intenções, mas de concreto muito pouco”.

Em 2014, conflito entre indios e agricultores acabou em morte no Norte e Polícia Federal deve reforçar segurança |Foto: Carlos Latuff
Em 2014, conflito entre índios e agricultores acabou em morte na Região Norte e Polícia Federal teve reforçar a segurança em Faxinalzinho |Foto: Carlos Latuff

A disputa pela posse de áreas incluídas em processo de desapropriação para fins de demarcação de reservas indígenas tem sido motivo de confrontos entre agricultores e indígenas. No ano passado, o conflito resultou na morte de dois agricultores no município de Faxinalzinho, na região norte.

Ao mesmo tempo em que afirma reconhecer os direitos das comunidades quilombolas e indígenas, Weber argumenta que é preciso se preocupar com a situação dos pequenos agricultores que estão nas áreas produzindo. “As demarcações têm tido como resultado a retirada da terra de quem produz para assentar um grupo que fica à espera de benesses do governo federal”, diz um trecho de sua justificativa ao projeto.

Pela proposta, as propriedades de pequenos agricultores de até quatro módulos – o que corresponderia a entre 20 hectares e 100 hectares, já que o tamanho varia de acordo com cada região do Estado – e as terras de pecuaristas familiares não superiores a 300 hectares não poderão ser desapropriadas, desde que cumpram a função social.

Apesar de a Constituição Federal estabelecer a competência da União para a demarcação de terras indígenas, Weber afirma que seu projeto não é inconstitucional, uma vez que “a questão é compartilhada” com o Estado e que em 2014 a proposta já recebeu parecer favorável da Comissão de Constituição e Justiça.

“Projeto joga um pequeno contra o outro”

O cacique João Carlos Padilha discorda do deputado. Liderança indígena no que diz respeito ao tema das demarcações e a par do projeto de Weber, ele afirma que a responsabilidade é do governo federal. “A competência é da União pela Constituição de 1988”, lembra. O cacique defende o cumprimento da legislação assegurando os direitos tanto de indígenas quanto de agricultores. “A gente quer uma lei que garanta o direito de todos e que ninguém saia perdendo. Nem o fazendeiro grande, nem o pequeno agricultor sairá perdendo”, argumenta, referindo-se ao pagamento de indenizações no caso de desapropriação das terras, desde que o governo federal agilize esses trâmites.

Na opinião de Padilha, a iniciativa proposta por Weber freia as demarcações que os indígenas estão tentando agilizar junto ao governo federal. Nos próximos dias, lideranças indígenas pretendem marcar um encontro no Ministério da Justiça para tratar do assunto.  Já aqui na Capital, os representantes dos quilombolas e dos índios devem acompanhar de perto a tramitação da proposta na Comissão de Constituição e Justiça. “A gente queria que ele (Weber) retirasse, mas se não retirar vamos pedir para os deputados votarem contra. O projeto do Weber dá a atender que joga um pequeno contra o outro, porque são todos os que mais precisam de terra”, afirmou ele, acrescentando que as áreas para quilombolas e indígenas no Estado não são grandes e que não atingem o agronegócio.

O que diz o projeto:

– Fica garantido, no âmbito do Estado do Rio Grande do Sul, que as terras dos agricultores e empreendedores familiares detentores de propriedades de até quatro módulos fiscais e dos pecuaristas familiares detentores de propriedades de até 300 hectares, não serão objeto de demarcação para fins de formação de territórios indígenas e quilombolas.

– Para o atendimento do artigo, as demarcações, quando realizadas em áreas de uso e ocupação da agricultura ou pecuária familiar, deverão acontecer de forma descontínua de modo a preservar os limites e o direito de propriedade dos agricultores, empreendedores e pecuaristas

O que diz a Constituição Federal sobre demarcação de terras:

Art. 231. São reconhecidos aos índios sua organização social, costumes, línguas, crenças e tradições, e os direitos originários sobre as terras que tradicionalmente ocupam, competindo à União demarcá-las, proteger e fazer respeitar todos os seus bens.

 – São terras tradicionalmente ocupadas pelos índios as por eles habitadas em caráter permanente, as utilizadas para suas atividades produtivas, as imprescindíveis à preservação dos recursos ambientais necessários a seu bem-estar e as necessárias a sua reprodução física e cultural, segundo seus usos, costumes e tradições.


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